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quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Ensino de técnicas de análises de minerais com ênfase na interpretação de dados: teoria e prática na formação do geólogo


 Para mais informações: http://www.ige.unicamp.br/terraedidatica/v4/pdf-v4/pdf-v4-art2.pdf



Carlos Jorge da Cunha 1 cjdcunha@quimica.ufpr.br
Orliney Maciel Guimarães 1
Márcio Peres de Araújo 1
Eleonora Maria Gouvêa Vasconcellos 2
Joaniel Munhoz Martins 2
José Manoel dos Reis Neto 2
Fernanda Machado Martins 1


TERRÆ DIDATICA 4(1):14-27, 2008
14
C. J. Cunha et al.
AbstracT Teaching of mineral analysis techniques with emphasis on data
interpretation: theory and practice for training a geologist. An educational activity devised
as part of the Experimental Inorganic Chemistry course aims at the compliance with the
National Curriculum Directives for Geology and Engineering Geology undergraduate
courses. The activity has allowed to engage theory and practice by means of data interpretation
of analytical instrumental characterization of the elemental, structural and mineralogical
composition of minerals and rocks. Twelve selected samples of minerals were analysed by
X-ray fluorescence, powder X-ray diffraction, scanning electron EDS probe microscopy and
optical microscopy (petrography). The non-interpreted results were made available in a
homepage and students were requested to interpret the data to identify the samples. Teachers
have evaluated the activity to be suitable for a Descriptive Mineralogy course; it also helps
meeting the needs of formation of a geologist, which currently requires entangling knowledge
and action as to interpret reality, to understand processes, to identify problems and to generate
solutions.
Keywords Analysis of minerals and rocks, educational material, geologist’s
formation, competence, theory and practice.
Resumo Atividade didática inicialmente desenvolvida na disciplina Química
Inorgânica Experimental, ministrada aos alunos do Curso de Geologia da UFPR
objetivou atender às Diretrizes Curriculares Nacionais para formação do geólogo e do
engenheiro geólogo. A atividade buscou articular teoria e prática por meio da interpretação
de dados de análise instrumental de caracterização elementar, estrutural e mineralógica de
minerais e rochas. Para desenvolvimento, 12 amostras de minerais foram selecionadas e
analisadas por fluorescência de raios X, difração de raios X de pó, microscopia eletrônica de
varredura com sonda EDS e microscopia óptica (Petrografia). Documento com os resultados
não-interpretados foi disponibilizado aos alunos em uma homepage e foi solicitado que os
alunos identificassem as amostras por meio da interpretação dos dados. A avaliação dos professores
ao final do trabalho foi de que a proposta apresentada é adequada para a disciplina de
Mineralogia Descritiva e ajuda a atender às demandas exigidas para formação do geólogo, que
hoje passam pelo pensar, pelo ler a realidade, compreender os processos, identificar problemas
e gerar soluções, exigindo a articulação entre o fazer e o conhecer.
Palavras chave Análise de minerais e rochas, material didático, formação do
geólogo, competências, articulação entre teoria e prática.
ARTIGO
*Este documento deve ser referido
como segue:
Cunha J.C., Guimarães O. M.,
Araújo M. P., Vasconcellos E.M.G.,
Martins J. M., Reis-Neto J. M.,
Martins F. M., 2008. Ensino
de técnicas de análises de
minerais com ênfase na
interpretação de dados: teoria e
prática na formação do geólogo
Terræ Didatica, 4(1):14-27
<http://www.ige.unicamp.br/
terraedidatica/>
Ensino de técnicas de análises de minerais
com ênfase na interpretação de dados:
teoria e prática na formação do geólogo
Carlos Jorge da Cunha 1 cjdcunha@quimica.ufpr.br
Orliney Maciel Guimarães 1
Márcio Peres de Araújo 1
Eleonora Maria Gouvêa Vasconcellos 2
Joaniel Munhoz Martins 2
José Manoel dos Reis Neto 2
Fernanda Machado Martins 1
1 Depto. Química da Universidade
Federal do Paraná.
2 Depto. Geologia da Universidade
Federal do Paraná
TERRÆ DIDATICA 4(1):14-27, 2008
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C. J. Cunha et al.
Introdução
As modificações ocorridas no mundo do trabalho,
referentes a muitas questões atualmente
colocadas no panorama mundial, como a globalização,
a produção flexível e as novas demandas do
mercado de trabalho, exigem adequação do perfil
profissional, o que deve impactar diretamente a
formação profissional.
Estas exigências do mundo do trabalho fizeram
com que o MEC estabelecesse mudanças nos cursos
de graduação de todo o país, por meio de diretrizes
curriculares que deveriam ser discutidas por uma
comissão de especialistas para cada área específica.
No caso dos cursos de Geologia a comissão de especialistas
foi incumbida de elaborar a proposta inicial
para discussão, sem no entanto ter sido atingido
um consenso. O MEC não aprovou plenamente a
proposta. Em paralelo, os coordenadores de cursos
de graduação de Geologia e Engenharia Geológica
de todo o país realizaram dois seminários nacionais,
que culminaram na criação do Fórum Nacional de
Cursos de Geologia, entidade voltada para fomentar
e conduzir essas e outras discussões e que adquiriu
status permanente. Diversos encontros foram realizados
para propiciar debates sobre a formação do
geólogo (Carneiro et al. 2002, 2003, 2004; Assis et al.
2005), tendo sido apresentada e publicada uma versão
de Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)
(Nummer et al. 2005) elaborada pelo Fórum.
Nessas discussões verificou-se a preocupação
em formar profissionais de nível superior competentes,
com conhecimento e iniciativa, e que possam
ser absorvidos pelo mercado de trabalho.
As Diretrizes Curriculares Nacionais (Nummer
et al. 2005) para cursos de Geologia e Engenharia
Geológica descrevem o seguinte perfil dos
formandos:
“...com condição de trabalhar em qualquer área de
atuação das Ciências Geológicas, que tenha interesse e
capacidade para o trabalho de campo; visão abrangente
das Geociências e de suas interações com ciências correlatas;
pleno domínio da linguagem técnica geológica
aliada à capacidade de adequação desta linguagem à
comunicação com outros profissionais e com a sociedade;
conhecimento de ciências exatas que permita abordagens
quantitativas das informações geológicas; familiaridade
com métodos e técnicas de informática, especialmente
no tocante ao geoprocessamento”.
A formação generalista descrita nas DCNs
deverá ser construída a partir de “um treinamento
prático intensivo” e conteúdos complementares
que permitam ao egresso: “...ter atitude ética, autônoma,
crítica, criativa, empreendedora e atuação
propositiva, na busca de soluções de questões de
interesse da sociedade”, neste caso são sugeridos
conteúdos de Ciências Humanas, tais como: Economia,
Filosofia da Ciência, Gestão, Administração
e Comunicação.
As competências e habilidades do Geólogo
previstas nas DC Ns, dentre outras, referem-se
a planejar, executar, gerenciar, avaliar e fiscalizar
projetos, serviços e ou pesquisas científicas básicas
ou aplicadas que visem ao conhecimento e à utilização
racional dos recursos naturais e do ambiente, o
aproveitamento tecnológico dos recursos minerais
e energéticos sob o enfoque de mínimo impacto
ambiental, novas alternativas de explotação, conservação
e gerenciamento de recursos hídricos; aplicar
métodos e técnicas direcionadas a gestão ambiental
e atuar em áreas de interface, como a Tecnologia
Mineral, Ciências do Ambiente e Ciências do Solo.
Para atender estas habilidades e competências são
propostas disciplinas de conteúdo básico (Matemática,
Estatística, Física, Computação, Química,
Biologia e Geociências), conteúdo para formação
geológica específica, conteúdos temáticos, atividades
de campo, conteúdo complementar (optativo)
e estágio supervisionado (optativo).
Segundo Kuenzer (2003), com o rápido avanço
da Ciência e sua incorporação ao setor produtivo
(reestruturação produtiva), o mundo mudou e
mudou o conceito de competência, sobre o que é
ser competente no mundo do trabalho. Se antes a
competência visava tão somente à produtividade
advinda da repetição acertada de procedimentos, o
paradigma taylorista/fordista (Antunes 2001), hoje
passa pelo pensar, pelo ler a realidade, compreender
os processos, identificar problemas e gerar soluções,
exigindo a articulação entre o fazer e o conhecer. É
esta compreensão que vai permitir que o profissional
seja competente e seja flexível em uma realidade
na qual o próprio conhecimento torna-se ultrapassado
com velocidade muito rápida.
O conceito de competência atual pode e deve
servir como ponte entre as Universidades e o mercado
de trabalho na medida em que este necessita
de profissionais competentes que saibam lidar com
situações novas, tomando decisões adequadas por
intermédio da utilização do conhecimento científico
e das experiências passadas.
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C. J. Cunha et al.
Apesar do discurso de que toda e qualquer
educação sempre será educação para o trabalho, é
preciso distinguir a que visa aos interesses do trabalhador,
daquela que visa aos interesses do capital.
Do ponto de vista do capital, para aumentar a
competitividade na busca pelo emprego, o profissional
deve ampliar suas possibilidades de desempenho,
complementando sua formação acadêmica específica,
por exemplo por meio de cursos de língua
estrangeira, gerência, recursos humanos e relações
interpessoais, para se tornar um profissional multidisciplinar
e capaz de corresponder às necessidades
da empresa não só na área de Geologia. Neste caso
o enfoque é a qualificação individual.
Segundo nosso ponto de vista, a inserção dos
novos profissionais decorre de uma expansão do
mercado de trabalho em função do dinamismo
econômico do país. A empregabilidade não constitui
responsabilidade direta da universidade e nem,
necessariamente, a competência profissional individual
a garantia de emprego. Tal compreensão não
significa recusar o desafio de superar as dificuldades
para criar profissionais com uma formação sólida e
ampla, que favoreça o trabalhador.
As características consideradas hoje fundamentais
em quaisquer setores de atividade, sejam
eles acadêmico ou industrial, como: visão crítica,
capacidade de tomar decisões e, principalmente,
que aprendam a aprender inseridos na realidade
histórico-social, política e econômica do país, evidenciam
a necessidade de uma educação de qualidade,
não só na graduação, mas desde o ensino
fundamental e médio.
Mais do que nunca, o ensino superior deverá
superar a concepção conteudista que o tem caracterizado,
em face de sua versão predominantemente
propedêutica, para promover mediações significativas
entre os jovens e o conhecimento científico,
articulando saberes tácitos, experiências e atitudes;
do contrário, deixará de ser útil tanto para o capital
quanto para o trabalhador.
Consideramos que a atividade profissional se
concretiza como práxis humana (Marx 1999), a categoria
práxis é central para Marx, visto que a partir
dela tem sentido a atividade do homem, sua história
e o seu conhecimento. Esta forma de conceber o
trabalho significa reconhecê-lo como atividade ao
mesmo tempo teórica e prática, intelectual e instrumental,
reflexiva e ativa. No trabalho, articulam-se
a teoria e a prática como momentos inseparáveis
do processo de construção do conhecimento e da
transformação da realidade (Kuenzer 2001).
Segundo a lógica da cisão entre a teoria e a
prática, a concepção de currículo na Universidade
tem por base o pressuposto de que há um tempo
de aprender a pensar e um tempo de aprender a
fazer. Segundo Kuenzer (2001), muitas vezes “o
estágio curricular e extra-curricular tem sido a
única janela, por onde saem os ares da teoria para
encontrar os bafejos da prática, na tentativa, quase
sempre frustrada, de buscar a reunificação da dialética
rompida”.
Assim o ensino na Universidade se faz por fragmentos
da teoria, supostamente autônomos entre
si distribuídos em conteúdos de caráter geral e os
profissionalizantes propriamente ditos. Após passar
por todos eles, virá finalmente à hora da prática,
momento em que haverá “reunificação” do saber
dividido: a atuação profissional.
O curso de Geologia da UFPR não passou
por uma reforma curricular para atender às novas
demandas do mercado de trabalho e se adequar às
DCNs. Desta maneira os professores da disciplina
Química Inorgânica e Experimental do curso de
Geologia, cientes de que o saber fazer é importante
em qualquer profissão, mas o saber pensar é fundamental
para tomada de decisão, buscaram, por meio
da discussão com os professores das disciplinas de
Mineralogia Geral, Mineralogia Descritiva e Geoquímica,
uma forma de introduzir uma atividade,
nesta disciplina de química, que venha articular
o conhecimento teórico e a prática na formação
inicial dos estudantes de Geologia. A química faz
parte do núcleo básico do atual currículo do curso
de Geologia e a realização desta atividade permitirá
aos estudantes refletirem sobre a importância dos
conteúdos das disciplinas básicas na graduação e
construir habilidades específicas no seu campo de
atuação. Este exercício e a criação de uma disciplina
de química aplicada à mineralogia, se considerado
positivo para desenvolver habilidades e competências
para a formação em Geologia, será encaminhado
como proposta ao colegiado do curso de
Geologia para incorporação oficial ao currículo.
Análise de minerais e rochas: saber fazer ou
saber pensar?
Há mais de trinta anos atrás as análises químicas
de minerais e rochas eram feitas por via úmida
com abertura de amostra em ácidos, titulações,
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gravimetria e outros procedimentos qualitativos de
laboratório (Afonso et al. 2004), tais como: fusão
em pérola de bórax, testes de chama, aquecimento
em carvão, etc. Estas atividades eram exclusivamente
desenvolvidas por químicos e os resultados,
apesar de obtidos a partir de um trabalho árduo e
demorado, eram simples listagens de teores ou
resultados qualitativos.
Com o desenvolvimento e a popularização das
técnicas analíticas instrumentais (Skoog 1998), tais
como difração de raios X (DR X), análise elementar
por fluorescência de raios X (FRX) e microscopia
eletrônica de varredura (MEV ), o trabalho para
obtenção de dados foi grandemente reduzido mas
a complexidade teórica da interpretação cresceu
muito. Estas técnicas são instrumentos poderosos
para se identificar minerais e rochas (Gomes 1984)
e definir suas origens. No passado os geólogos e
mineralogistas dispunham apenas da microscopia
óptica e resultados de análises químicas, mas atualmente
contam também com DRX, MEV e microssonda
eletrônica que podem fornecer análises
químicas de pontos selecionados da amostra.
O ensino de técnicas analíticas modernas foi
então sendo introduzido a princípio na disciplina
de Química Inorgânica Experimental no curso
de Geologia da UFPR, ministrada concomitantemente
com a disciplina de Mineralogia Descritiva,
semestre após semestre, por meio de um trabalho
realizado em equipe e a partir dos resultados obtidos
nesta experiência didática, parte dele tem
sido desenvolvido na disciplina de Mineralogia
Descritiva.
Em nosso ponto de vista, o ensino de técnicas
analíticas para análise de minerais e rochas para
Geologia vai além do domínio da técnica, do saber
manipular as amostras e o próprio equipamento,
pois na sua atuação profissional o geólogo poderá
não dispor desta ferramenta o que o fará a recorrer a
serviço de terceiros e geralmente, estes equipamentos
são operados por técnicos treinados para este
fim. Já o saber interpretar os dados para, a partir
deles, tomar decisões é uma experiência que pode
e deve ser disponibilizada aos geólogos durante a
sua formação inicial. Articular este saber teórico
quando se estuda as propriedades dos elementos
químicos e como eles se apresentam nos minerais
e rochas fornecem significado ao aprendizado e
evitamos a cisão entre teoria e prática, por meio
da qual há um tempo de aprender a pensar e um
tempo de aprender a fazer.
Apesar das técnicas analíticas instrumentais
terem se tornado muito importantes em Geologia,
a literatura ainda é carente de livros especializados
no assunto. O livro de Klein & Hurlbut (Klein &
Hurlbut 1999) tem apenas um capítulo sobre as
técnicas analíticas, o qual é apenas informativo e ausente
de exemplos. A abordagem de Gomes (Gomes
1984), a melhor disponível em língua portuguesa,
está desatualizada. Apesar de existirem excelentes
textos sobre análises instrumentais (Skoog 1998,
Harris 2002) nenhum deles está contextualizado
para a Geologia. O texto de Gill (Gill 1989), sobre
os fundamentos de Química para Geologia, um dos
poucos livros que trata do assunto, não tem enfoque
analítico. Há alguns livros direcionados para
Geologia, especializados em uma técnica, como
por exemplo, o livro intitulado Electron Microprobe
Analysis and Scanning Electron Microscopy in Geology
(Reed 2005).
Para suprir a deficiência de textos atualizados,
em língua portuguesa, sobre as técnicas analíticas
aplicadas à Geologia, o uso de resultados publicados
em artigos tem se revelado útil, mas estes trazem o
viés da interpretação dos dados.
Os professores de química e de mineralogia
sentiram a necessidade de desafiar os alunos de
suas disciplinas com dados ainda não interpretados.
Uma alternativa seria fornecer amostras reais aos
alunos e solicitar a eles que coletassem os dados
analíticos. Infelizmente esta abordagem em nosso
caso é inviável, tendo em vista que a infraestrutura
analítica da Universidade tem priorizado as atividades
de pesquisa e sofre inconstâncias, tais como
equipamentos com defeito ou em manutenção
preventiva.
Muitos estudantes pensam que saber usar um
equipamento e dele retirarem gráficos e tabelas é
um grande aprendizado para a formação profissional
(saber fazer). No entanto, ao se depararem
com os gráficos e tabelas e tentarem interpretar os
resultados, chegam à conclusão de que interpretar é
bem mais difícil do que usar o equipamento (saber
pensar). Partindo deste ponto de vista os autores
acreditam que a ênfase do ensino das técnicas analíticas
deve ser na interpretação e não no uso dos
equipamentos que vem se tornando cada vez mais
fácil com o continuado avanço da automação e dos
softwares de operação. O presente trabalho é uma
proposta de atendimento à necessidade educacional
exposta acima contornando as limitações de infraestrutura
presente na universidade.
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A atividade didática aqui apresentada foi desenvolvida
na disciplina de Química Inorgânica
Experimental, ministrada pelo Departamento
de Química, aos alunos do curso de Geologia da
UFPR com a finalidade principal de possibilitar
aos alunos articularem a fundamentação teórica
relacionadas às técnicas instrumentais utilizadas
para caracterizar a composição química, estrutural
e mineralógica de minerais e rochas com a prática
de interpretar dados provenientes de amostras
reais. Para o desenvolvimento desta atividade foi
produzido um material didático composto de um
conjunto de dados coletados a partir do segundo
semestre de 2004 e que também são utilizados na
disciplina Mineralogia Descritiva, ministrada pelo
Departamento de Geologia. As técnicas usadas
até o momento e que geraram os dados foram:
microscopia ótica em microscópio petrográfico
com luz polarizada, microscopia eletrônica de
varredura (MEV) com microssonda EDS (Energy
Dispersive Spectroscopy), difração de raios X de
pó (DRX) e análise elementar por fluorescência
de raios X (FRX).
Metodologia da abordagem educacional
A metodologia utilizada para a realização da
atividade didática proposta consistiu em disponibilizar
aos alunos dados analíticos reais coletados
em amostras de minerais e rochas da forma como
foram obtidos diretamente dos equipamentos,
bem como a metodologia de análise utilizada e as
condições experimentais utilizadas para sua obtenção,
e demandar interpretações e respostas aos
questionamentos propostos pelos professores. Os
dados estão disponibilizados em um documento,
que pode ser obtido de um site institucional da
internet (http://www.geologia.ufpr.br/graduacao/
gradtextos.php). A metodologia de análise é explicitada
no texto que acompanha o documento. O
contexto geológico das amostras não é fornecido
em detalhes para que a interpretação dos resultados
não possa ser descoberta em uma pesquisa
bibliográfica. No entanto, a realização de pesquisa
bibliográfica, relevante à solução de problemas, é
solicitada.
Desta forma, o aluno, além dos dados obtidos
da análise realizada, terá que recorrer à literatura
para embasar suas interpretações e identificar
a amostra de mineral ou rocha que está sendo
proposta.
O documento poderá ser alterado sempre que
adaptações sejam feitas incluindo novas amostras
ou resultados de novas técnicas sobre amostras já
existentes.
No texto a seguir, chamado “documento fornecido
aos alunos”, apresentamos a parte introdutória,
com a finalidade de ilustrar. Fornecemos
um exemplo de dados obtidos para a amostra de
Piroxênio.
A atividade descrita foi aplicada no segundo
semestre de 2006 e fez parte da avaliação da disciplina
“Química Inorgânica e Experimental”,
ministrada pelo Departamento de Química ao
curso de Geologia da UFPR.
Cada documento de análise de um mineral
foi atribuído a uma equipe de dois alunos. A
cada equipe coube analisar os dados, entregar um
trabalho escrito com interpretações e respostas
às questões postuladas no documento e realizar
uma apresentação oral para a turma no final do
semestre.
Documento fornecido aos alunos
Introdução
O documento a seguir possui dados analíticos
coletados em diversas amostras de minerais. A seção
de metodologia explicita os detalhes da coleta
dos dados. Os resultados para cada amostra são
em seguida apresentados, em uma seção específica,
tais como foram obtidos dos equipamentos, e
não estão interpretados. O professor irá atribuir
uma ou mais amostras para sua equipe. No fim de
cada seção há questões para você responder usando
os dados disponíveis e/ou pesquisa bibliográfica
e internet. Dentre os dados coletados pode haver
informações redundantes ou desnecessárias para a
resposta às questões propostas, você deve decidir
quais dados devem usar. O objetivo do trabalho é
simular a real atividade de caracterização analítica
de minerais e rochas com ênfase na interpretação
dos resultados e não na obtenção dos mesmos.
Metodologia de Coleta de Dados Analíticos
A tabela 1 lista doze amostras de minerais selecionadas
e suas respectivas procedências. Na figura
1 podem ser vistas as amostras em bloco que estão
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Tabela 1 - Amostras de minerais e rochas, sua respectiva procedência e tipo de aplicativo de calibração usada na
análise elementar de FRX realizada
seção rocha/mineral estado físico procedência aplicativo de
calibração FRX
1 Barita bloco Minas Gerais semi-q
2 Calcita bloco Paraná quantitativo
3 Feldspato bloco Paraná quantitativo
4 Galena bloco Adrianópolis – Paraná semi-q
5 Ilmenita bloco Minas Gerais semi-q
6 Calcopirita bloco Carajás – Pará semi-q
7 Piroxênio bloco Minas Gerais semi-q
8 Quartzo bloco Rio Grande do Sul quantitativo
9 Turmalina bloco Minas Gerais semi-q
10 Zeólita bloco Londrina – Paraná semi-q
11 Talco* pó Itaiacoca – Paraná semi-q
12 Argila* pó Rio Branco do Sul - Paraná semi-q
Figura 1 - Amostras usadas no presente trabalho. De cada amostra foi cortada uma parte para confecção de lâmina

petrográfica e pulverização. Estas amostras ficam disponíveis no laboratório para os alunos analisarem durante a
realização do trabalho. Em cima, da esquerda para a direita : turmalina, feldspato, zeólita, barita. Em baixo, da
esquerda para a direita : calcita, quartzo, ilmenita, galena, calcopirita, piroxênio. A folha de papel tem tamanho
A4
disponíveis no laboratório para inspeção.
Microscopia Óptica (Petrografia) e Microscopia
Eletrônica de Varredura
Foi confeccionada uma lâmina petrográfica
de cada amostra, cortada em serra diamantada e
colada com araldite sobre uma lâmina de vidro
de 2 x 2 cm. A lâmina foi polida até a espessura
aproximada de 0,03 mm e foi usada para a identificação
dos minerais em um microscópio de luz
polarizada, modelo Olympus SZ-CTV, e imagens
micrográficas foram capturadas com o microscópio
Olympus BX60, com o software Image-Pro Plus,
disponíveis no Laboratório de Mineralogia e Petrologia
(LAMIN) do Departamento de Geologia
da UFPR. A mesma lâmina foi usada para registrar
as imagens BSE (elétrons retro espalhados), os espectros
EDS pontuais e os mapas bidimensionais
de composição elementar, no microscópio eletrônico
de varredura, modelo JEOL JSM-6360, Low
Vaccum, com probe EDS thermonoran, do Centro de
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Microscopia Eletrônica CME do Setor de Ciências
Biológicas da UFPR.
Fluorescência de Raios X (FRX) e Difração de Raios
X (DRX)
Uma parte de cada amostra de rocha foi cortada,
britada e pulverizada. As amostras de Argila e Talco
foram apenas secas (80 oC, 24 h) e pulverizadas.
Para as amostras de Calcita, Feldspato e Quartzo,
parte do pó foi usado para confeccionar uma
pastilha em pérola de tetraborato de lítio. Para as
amostras de Galena, Ilmenita, Calcopirita, Barita,
Turmalina, Piroxênio, Zeólita, Talco e Argila parte
do pó foi prensado em forma de pastilha. Cada
pastilha (pérola ou pó prensado) foi usada para se
registrar os espectros de FRX, dos quais se extraiu
a composição química por manipulação dos dados
com a linha de calibração mais apropriada. A linha
de calibração, semi-quantitativa (semi-q), ou quantitativa,
usada para cada amostra, pode ser vista na
tabela 1. O equipamento usado foi o Espectrômetro
de Raios X Phillips PW 2400 do LAMIR.
Parte do pó, de cada amostra, foi usada para a
determinação da perda ao fogo. Antes da determinação
da perda ao fogo a amostra em pó é seca a
100oC por 8 horas. No experimento de perda ao
fogo, cerca de 1 grama de amostra seca é pesada,
com exatidão (M1 = massa do cadinho mais amostra),
dentro de um cadinho de porcelana (Mc =
massa do cadinho vazio) e é aquecida a 1000oC por
três horas. Após resfriado à temperatura ambiente o
cadinho com a amostra calcinada é pesado (M2 =
massa do cadinho mais amostra calcinada). A perda
ao fogo, percentual, é calculada a partir da relação
100 x [(M1-M2)/(Mc-M1)].
Parte do pó, de cada amostra seca, foi usada para
se obter um difratograma, em modo θ/2θ, entre
10 e 80o no Difratômetro de Raios X Shimadzu
LabX XRD 6000, do Departamento de Química da
UFPR, com radiação Cu-Kα (λ = 1,5418 Å).
Resultados
Os resultados das análises químicas elementares
por FRX, os difratogramas de raios X, as imagens
de MEV-EDS, os espectros de EDS e as imagens de
microscopia ótica, são apresentados na seção relativa
a cada amostra. Os difratogramas estão disponíveis
em planilhas eletrônicas de cálculo no computador
do laboratório de ensino os quais podem ser manipulados
ou copiados em formato eletrônico.
Um exemplo:
Resultados para a amostra Piroxênio
FRX
A tabela A-1 traz os resultados da análise química
elementar feita por fluorescência de raios X.
MEV com EDS
A inspeção da amostra de Piroxênio, com imagens
BSE, revelou a possível presença de mais de
uma fase devido às diferentes texturas observadas.
Uma imagem BSE representativa pode ser vista
na figura A-1.
Na região em foco na figura A-2 foram selecionados
quatro pontos, indicados sobre a imagem,
para a coleta dos espectros de EDS mostrados na
figura A-3 e tabela A-2.
Tendo em vista que os quatro espectros revelaram
composições químicas muito semelhantes não
foi feito mapeamento químico.
DRX
A figura A-4 tem o difratograma de raios X de
pó da amostra de Piroxênio.
Microscopia óptica
A partir da lâmina delgada foram obtidas fotomicrografias
da amostra analisada, com polarizadores
paralelos e cruzados, conforme figuras A-5a
e A-5b, respectivamente.
Piroxênio
Al2O3 0,73
CaO 23,80
Cr 0,19
Fe2O3 5,72
MgO 11,41
MnO 0,19
Na <<
Ni <<
P <<
S <<
SiO2 55,81
Sr <<
Zn <<
P.F 2,15
Tabela A1- Amostra piroxênio por FRX
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Figura A-3 - Espectros EDS coletados nos pontos 1, 2, 3
e 4 respectivamente, mostrados na Figura A-2
Figura A-1 - Imagem BSE obtida na amostra de
Piroxênio
Figura A-2 - Imagem BSE da amostra de Piroxênio,
voltagem de aceler ação de 17,0 kV e
magnificação de 100 x. Sobre a imagem estão
marcados os pontos 1, 2, 3 e 4 que foram alvos
da análise com EDS
Figura A-4 - Difratograma de raios X de amostra
de Piroxênio
Figura A-5 - Fotomicrografias de Piroxênio: (a) luz
natural e (b) luz polarizada
(a)
(b)
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C. J. Cunha et al.
Net Counts
C-K O-K Na-K Mg-K Al-K Si-K S-K Cl-K K-K Ca-K Fe-K Mo-L Ba-L
Base_pt1 2400 17235 617 18011 1246 48288 212 12404 1382 597
Base_pt2 2553 18148 731 17207 1106 48130 733 12234 1155 897
Base_pt3 2932 12891 753 14363 761 48394 269 18555 1187
Base_pt4 5097 11887 944 10901 843 39594 1306 398 17579 1363 1852
Weight Concentration %
C-K O-K Na-K Mg-K Al-K Si-K S-K Cl-K K-K Ca-K Fe-K Mo-L Ba-L
Base_pt1 10.11 47.83 0.44 9.01 0.56 19.54 0.14 8.99 2.87 0.52
Base_pt2 10.34 48.22 0.51 8.51 0.49 19.12 0.36 8.64 2.35 1.47
Base_pt3 12.28 43.06 0.55 7.39 0.34 19.89 0.16 13.80 2.54
Base_pt4 18.11 39.88 0.68 5.62 0.38 15.92 0.65 0.25 12.59 2.83 3.10
Weight % Error
C-K O-K Na-K Mg-K Al-K Si-K S-K Cl-K K-K Ca-K Fe-K Mo-L Ba-L
Base_pt1 +/-0.23 +/-0.46 +/-0.08 +/-0.10 +/-0.05 +/-0.12 +/-0.04 +/-0.14 +/-0.14 +/-0.08
Base_pt2 +/-0.39 +/-0.47 +/-0.08 +/-0.10 +/-0.05 +/-0.13 +/-0.03 +/-0.13 +/-0.23 +/-0.25
Base_pt3 +/-0.35 +/-0.46 +/-0.08 +/-0.09 +/-0.05 +/-0.12 +/-0.03 +/-0.17 +/-0.26
Base_pt4 +/-0.39 +/-0.49 +/-0.07 +/-0.09 +/-0.04 +/-0.11 +/-0.06 +/-0.04 +/-0.17 +/-0.26 +/-0.16
Atom Concentration %
C-K O-K Na-K Mg-K Al-K Si-K S-K Cl-K K-K Ca-K Fe-K Mo-L Ba-L
Base_pt1 16.12 57.25 0.36 7.10 0.40 13.33 0.07 4.29 0.98 0.10
Base_pt2 16.48 57.68 0.42 6.70 0.35 13.03 0.22 4.13 0.80 0.20
Base_pt3 19.83 52.19 0.46 5.89 0.25 13.73 0.09 6.68 0.88
Base_pt4 28.68 47.43 0.57 4.40 0.26 10.78 0.38 0.12 5.98 0.96 0.43
Atom % Error
C-K O-K Na-K Mg-K Al-K Si-K S-K Cl-K K-K Ca-K Fe-K Mo-L Ba-L
Base_pt1 +/-0.36 +/-0.55 +/-0.07 +/-0.08 +/-0.03 +/-0.08 +/-0.02 +/-0.07 +/-0.05 +/-0.02
Base_pt2 +/-0.62 +/-0.56 +/-0.07 +/-0.08 +/-0.03 +/-0.09 +/-0.02 +/-0.06 +/-0.08 +/-0.04
Base_pt3 +/-0.57 +/-0.56 +/-0.07 +/-0.07 +/-0.03 +/-0.08 +/-0.02 +/-0.08 +/-0.09
Base_pt4 +/-0.61 +/-0.59 +/-0.06 +/-0.07 +/-0.03 +/-0.08 +/-0.03 +/-0.02 +/-0.08 +/-0.09 +/-0.02
Tabela A-2 - Contagens totais, % em massa e % em mol de átomos estimadas para os pontos 1, 2, 3 e 4 (Fig. A-2) a
partir do espectro de EDS
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C. J. Cunha et al.
Questões
Questão A-1) É convenção, na Geologia, apresentar
a tabela dos teores de elementos, na forma de
óxidos, na ordem decrescente do estado de oxidação.
Organize a Tabela A-1 segundo esta convenção.
Questão A-2) Calcule a fórmula estrutural nos
quatro pontos analisados por EDS , na base de 6
oxigênios, conforme Anexo 1, de Deer et al. (2000),
projete os resultados no diagrama de Morimoto
(1988, apud Deer et al. 2000) e classifique o tipo
de Piroxênio.
Questão A-3) Proceda da mesma maneira com o
resultado obtido por FRX e compare o ponto projetado
no diagrama de Morimoto (1988) a partir desta
técnica, com os pontos obtidos no EDS .
Questão A-4) Faça o recálculo da análise da
amostra. O recálculo da fórmula deverá ser feito
após a identificação das fases minerais presentes e
deve envolver uma estimativa dos teores relativos
de cada fase, se houver mais de uma.
Questão A-5) Identifique a fase escura e a fase
cinza.
Questão A-6) Compare a % em massa obtida
por EDS com àquela obtida por FRX levando-se
em consideração que a análise do EDS é pontual e
a do FRX é uma média obtida de uma massa representativa
de toda a amostra.
Questão A-7) Interprete o difratograma de raios
X comparando as posições dos picos medidos com as
dos picos das fases minerais de referência que você
supõe estarem presentes. Os difratogramas das fases
dos minerais de referência podem ser visualizados
no site mincryst.
Avaliação da atividade didática proposta
A atividade didática desenvolvida pelos alunos
foi avaliada no final do semestre por meio de um
questionário contendo 13 questões relativas ao trabalho
realizado. Os formulários foram preenchidos
anonimamente ao final da última prova do semestre
e colocados em um envelope que foi lacrado em
sala de aula e só foi aberto após a emissão oficial
das notas finais da disciplina.
Os resultados obtidos nesta avaliação podem
ser vistos na tabela 2.
O questionário foi dividido em três grupos de
perguntas, o primeiro grupo corresponde a oito
perguntas (1 a 8) relativas à natureza e ao desenvolvimento
do trabalho realizado. O segundo grupo
corresponde a três perguntas (9 a 11) relativas ao
uso do computador e da internet e o terceiro grupo
corresponde a duas perguntas (12 e 13) relativas à
opinião dos alunos sobre as técnicas estudadas.
Foram atribuídos pesos diferentes a cada uma
das quatro respostas dadas às perguntas dos grupos
1 e 2. Para a resposta A, a mais positiva, foi dado
o peso 2, à resposta B foi dado peso 1, à resposta
C foi dado peso -1 e à resposta D, a mais negativa,
foi dado peso -2.
Uma análise geral dos resultados obtidos mostra
que os alunos consideraram a atividade realizada
positiva em todos os aspectos. Como também, foi
considerada igualmente positiva a contribuição da
atividade para o entendimento da utilização das
técnicas em Geologia e as discussões durante as
apresentações que foram úteis, complementando
este entendimento, o que possibilitou à maioria
dos alunos a compreender a utilização das técnicas
estudadas em sua atividade profissional. A atividade
desenvolvida possibilitou aos alunos articular o
conhecimento teórico sobre as propriedades dos
elementos presentes em minerais e rochas com um
problema prático, identificar amostras de minerais
e rochas reais a partir de dados provenientes de
análises instrumentais, uma situação concreta que
demandará a sua futura prática profissional. Segundo
Marx e Engels “o homem só conhece aquilo que
é objeto de sua atividade, e conhece porque atua
praticamente”. A práxis, portanto, é compreendida
como atividade material, transformadora e orientada
para a consecução de finalidades.
O trabalho realizado pelos alunos permite
compreender dialeticamente, o conceito de práxis,
que relaciona a teoria e a ação. Sobre esta forma de
compreender, Vázquez (1977), mostra que “uma
teoria é prática na medida em que materializa, por
meio de uma série de mediações, o que antes só
existia idealmente como conhecimento da realidade
ou antecipação ideal de sua transformação”.
E, a partir desta diferenciação, compreender a
especificidade do trabalho educativo escolar para
que se possa verificar a possibilidade de desenvolver
profissionais competentes a partir da universidade.
Dentre as perguntas do grupo 1, as que tiveram
a avaliação mais negativa foram as questões 3 e 7.
A interpretação que damos sobre esta avaliação na
questão 3, é que os alunos acreditam que a dificuldade
na interpretação dos dados esteja relacionada
com o fato de não terem manipulado as amostras,
utilizado os equipamentos e coletado os dados, deTERRÆ
DIDATICA 4(1):14-27, 2008
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C. J. Cunha et al.
Tabela 2 - Resultados da avaliação do trabalho pelos alunos. Foram entregues e recolhidos 32 formulários. A nota ponderada foi dada atribuindo-se peso +2 para a resposta A, peso
+1 para a resposta B, peso -1 para a resposta C e peso -2 para a resposta D
Ítem Questão Resposta A Resposta B Resposta C Resposta D Total de
respostas
Nota ponderada
1 O que você achou do trabalho em linhas gerais? 4 muito bom 20 bom 6 ruim muito ruim 30 0,7
2 A realização do trabalho ajudou você a compreender a
utilidade das técnicas analíticas instrumentais?
7 ajudou muito 18 ajudou 5 ajudou pouco 1 não ajudou 31 0,8
3 O fato de você não ter coletado os dados, dificultou as
interpretações?
3 não dificultou 11 dificultou pouco 14 dificultou 2 dificultou muito 30 0,0
4 A apresentação dos dados no formato PDF foi
adequada?
9 muito adequada 22 adequada inadequada muito inadequada 31 1,3
5 O que você achou das apresentações, incluindo as
discussões?
9 muito úteis 17 úteis 4 pouco úteis 1 inúteis 31 0,9
6 O que você achou da orientação do Professor? 5 muito boa 18 boa 7 ruim 1 muito ruim 31 0,6
7 A fundamentação teórica das técnicas, abordada na
disciplina, foi adequada para a compreensão dos
resultados?
1 muito adequada 18 adequada 8 inadequada 3 muito inadequada 30 0,2
8 Você acha que estas técnicas serão potencialmente úteis
para a sua vida profissional?
10 muito úteis 14 úteis 6 pouco úteis 1 inúteis 31 0,8
média
(1 a 8)
0,7
9 Como você classifica o seu acesso à internet? 14 muito bom 10 bom 6 ruim 1 muito ruim 31 1,0
10 Como você classifica o seu acesso a computador? 17 muito bom 10 bom 1 ruim 3 muito ruim 31 1,2
11 Como você classifica a sua habilidade com softwares? 3 muito bom 19 bom 7 ruim 2 muito ruim 31 0,5
média
(9 a 11) 0,9
12 Qual das técnicas você achou mais interessante? 13 MEV com EDS 7 FRX 10 DRX de pó 1 microscopia óptica 31
13 Que tipo de dados você teve maior dificuldade em
interpretar?
12 MEV com EDS 10 FRX 8 DRX de pó 1 microscopia óptica 31
TERRÆ DIDATICA 4(1):14-27, 2008
25
C. J. Cunha et al.
monstrando que grande parte deles apresentam uma
visão empirista-indutivista do conhecimento científico
(Borges,1996), ou seja, acreditam que por meio da
prática (observação, coleta de dados e operando equipamentos)
conseguirão compreender melhor a teoria
(fundamentação das técnicas), desconhecendo que a
forma como é planejada e desenvolvida uma atividade
prática provém da reflexão que se tem da teoria.
Em relação à questão 7, relativa ao fato da fundamentação
teórica ter sido suficiente para embasar
as interpretações, embora apresente uma média positiva,
uma análise mais minuciosa das apresentações
e depoimentos dos alunos durante a exposição dos
seus trabalhos nos fez refletir sobre a inadequação da
atividade para a disciplina de Química Inorgânica e
Experimental, pois a abordagem teórica das técnicas
instrumentais não sendo aprofundada nesta disciplina
dificulta a interpretação dos dados para algumas amostras
de minerais e rochas mais complexas e sem um
mínimo de conteúdo teórico o movimento dialético
que estabelece a práxis não se concretiza. Desta maneira
os professores acreditam que a proposta didática aqui
apresentada deve fazer parte da parte experimental da
disciplina Mineralogia Descritiva para atender os objetivos
iniciais pensados para a atividade.
Quanto às respostas dadas às perguntas do grupo
2 a que teve avaliação mais positiva foi a questão
10 relativa ao acesso a computador. A avaliação mais
negativa ficou por conta da habilidade pessoal com
softwares, pergunta 11. Na avaliação dos professores
as planilhas de cálculos para manipular resultados é o
software menos dominado pelos alunos. Definir quais
softwares são os mais limitantes deve ser objeto de estudos
futuros na área de ensino, principalmente aqueles
demandados para atuação dos geólogos no campo
profissional. As médias ponderadas, calculadas para os
dois grupos de perguntas, revelam que as habilidades
com computador e acesso à internet (média 0,9) foram
menos limitantes que o desenvolvimento do trabalho
propriamente dito (média 0,7).
No terceiro grupo de perguntas nos surpreende o
fato de apenas um aluno ter achado como técnica mais
interessante a microscopia ótica tendo em vista que esta
técnica é informativa e muito atrativa visualmente. As
técnicas classificadas como mais interessantes foram
MEV e DRX e as que apresentaram mais dificuldade
de interpretar foram MEV e FRX. Apesar de não ter
sido separado, no formulário, a MEV (micrografias)
de EDS (análise elementar percentual em um dado
ponto da micrografia) os professores acreditam que a
dificuldade a que se referem os alunos em relação ao
MEV foi, na verdade, atribuída ao EDS que, em essência,
apresenta a mesma dificuldade de interpretação do
FRX (análise elementar percentual média do mineral).
Sendo assim, a maior dificuldade de interpretação terá
sido em relação aos resultados numéricos, caso do FRX
e EDS, e não dos resultados qualitativos, caso das micrografias
MEV, dos espectros DRX e das imagens de
microscopia ótica.
A qualidade dos trabalhos realizados pelos alunos
foi muito variada, houve alunos que interpretaram
com facilidade os resultados, superaram obstáculos
com grande habilidade em relação ao domínio da
fundamentação teórica, buscando na literatura subsídios
para auxiliá-los nas interpretações e durante as
apresentações de outras equipes propuseram soluções
com grande relevância para resolver os problemas de
interpretação. Por outro lado houve alunos que não se
interessaram pelo trabalho, lidando com indiferença
e desinteresse. Esta postura observada por alguns alunos
se deve a sua formação ao longo de toda sua vida
escolar pelo contato com uma metodologia de ensino
tradicional, onde o ensino-aprendizagem é centrado
no professor que expõe todo o conteúdo, explica os
conceitos na sua forma final, fornece respostas definitivas,
diz aos alunos se eles estão certos ou errados
e explica passo a passo a solução do problema a partir
de um único procedimento, quando deveria elaborar
questões investigativas para extrair os conceitos, extrair
dos alunos respostas para revelar o que eles conhecem
ou pensam sobre o conceito, fornecer aos alunos
oportunidade para procurar resoluções para o problema
proposto, propiciar uma discussão do problema e
incentivar os alunos a explicarem os conceitos com as
suas próprias idéias (Ferreira 2006).
Assim como houve uma grande diferença nas
atitudes e interesses pessoais dos alunos pelo trabalho,
também houve variações no grau de dificuldade na interpretação
de dados pelas equipes. Há minerais como
o quartzo em que a interpretação dos dados apresentada
é muito simples, enquanto que os dados para a amostra
de Piroxênio são bem difíceis, o que dificultou a avaliação
por parte dos professores. Esta disparidade no
grau de dificuldade entre os trabalhos não desqualifica
a atividade proposta, mas deverá ser considerada pelo
professor numa próxima aplicação.
A avaliação das dificuldades dos alunos em relação
à interpretação das técnicas aponta para o reforço teórico
na interpretação dos dados de análises elementares
percentuais (recálculos) e DRX e para uma maior
valorização da utilidade da microscopia ótica com luz
polarizada em Geologia.
TERRÆ DIDATICA 4(1):14-27, 2008
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C. J. Cunha et al.
Considerações Finais
As novas demandas impostas pela globalização
da economia e pela reestruturação produtiva exigem
que a educação proponha um novo princípio educativo
e uma nova proposta pedagógica que formem
um profissional apto a conviver neste novo mundo
do trabalho.
O profissional de Geologia de nível superior
precisa estar preparado para enfrentar o mundo do
trabalho cada vez mais competitivo e exigente, como
também, preparado para enfrentar os desafios de
uma nova sociedade que apresenta novas modalidades
de emprego e novas configurações de trabalho.
Os cinco anos de graduação devem servir para,
além da aquisição dos conhecimentos necessários à
formação desse profissional, desenvolver atitudes
maduras e buscar alicerçar uma postura profissional
diferenciada.
Consideramos que a atividade didática proposta
permite atender mesmo que parcialmente às
competências exigidas para formação do geólogo,
que hoje passam pelo pensar, pelo ler a realidade,
compreender os processos, identificar problemas e
gerar soluções o que requer competências cognitivas
complexas que implicam o desenvolvimento da
inteligência, muito além da memória, exigindo uma
articulação entre o fazer e o conhecer.
Agradecimentos
Os autores agradecem às seguintes pessoas pela
colaboração na realização do presente trabalho:
No Centro de Microscopia Eletrônica – UFPR:
Vera Regina Fontana Piontek, Sérgio Tokunaga,
Rosângela Borges Freitas e Prof. Dr. Ney Mattoso.
No Laboratório de Análise de Minerais e Rochas
- LAMIR UFPR: Rodrigo Secchi, Douglas Piovesan,
Luciane Lemos do Prado, Elisiane Roper Pescini,
Carlos Lara Ribeiro, Joaniel Munhoz Martins.
No Departamento de Química da UFPR: Prof.
Dr. Aldo Zarbin, Prof. Dr. Fernando Wypych, Paula
Zangaro e Mariane Schnitzler.
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Caixa Postal 6152 - CEP 13083-970 - Campinas, SP - Brasil
Telefones: +55 19 3521 4564 e 3521 4568 - Fax +55 19 3521 4552
e-mail: terraedidatica@ige.unicamp.br
www.ige.unicamp.br/terraedidatica
TerræDidatica ISSN 1679-2300
geosciences ● geography ● environment

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