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terça-feira, 8 de outubro de 2013

CESSÃO DE DIREITO DE LAVRA DE OURO E TANTALO

CESSÃO DE DIREITO DE LAVRA DE OURO E TANTALO
Sou o atual proprietário dos direitos de pesquisa e lavra que pertenciam à COOPERATIVA DE MINERAÇÃO DOS GARIMPEIROS DO LOURENÇO  no distrito do Lourenço , em Calçoene e estou oferecendo os mesmos para cessão dos direitos .
Trata-se dos dois processos registrados no DNPM numeros 803.612/1978 e 803.611/1978 DNPM/AP - 16o Distrito , que adjudiquei em razão de uma dívida que a Cooperativa de mineração dos garimpeiros do lourenço possuia comigo.Os processos podem ser vistos traves do site do DNPM .
A área é bem extensa , com 7.634,1200 ha , com requerimento para minério de ouro oxidado/sulfetado e minério rolado de tantalo ( tantalita ) .
A exemplo do que foi feito com a área de garimpo de Serra Pelada / PA , com a empresa Colossus Mineração , nada impede que uma nova mineradora continue  a lavra e a amplie de sorte a obter excelentes resiultados .
De forma garimpeira , a área , que não está sendo explorada nem em 1% ja possui uma retirada mensal de 40 kg de ouro .
O preço para a cessão dos dois alvarás de pesquisa e lavra deve ser negociado diretamente com o anunciante  .
Caso interesse , entrem em  contato com
RICARDO SANTOS
advassoc@hotmail.com
96.9114.0414





http://www3.ufpa.br/projetomineracao/docs/territ/Arq%2044-%20analise%20dissertacao_Eva.pdf
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
NÚCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZÔNICOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO INTERDISCIPLINAR EM
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO TRÓPICO ÚMIDO
CURSO INTERNACIONAL DE MESTRADO EM PLANEJAMENTO DO
DESENVOLVIMENTO
EVA DE FÁTIMA GRÊLO DA SILVA
ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS
DEGRADADAS PELA MINERAÇÃO EM LOURENÇO (AP)
BELÉM (PA)
2005
b
EVA DE FÁTIMA GRÊLO DA SILVA
ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS
DEGRADADAS PELA MINERAÇÃO EM LOURENÇO (AP).
Dissertação de mestrado
apresentada ao Núcleo de Altos
Estudos Amazônicos – NAEA, como
requisito para a obtenção do grau de
Mestre em Planejamento do
Desenvolvimento, pela Universidade
Federal do Pará, sob a Orientação do
Prof. Dr. Armin Mathis.
BELÉM (PA)
2005
c
EVA DE FÁTIMA GRÊLO DA SILVA
ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS
DEGRADADAS PELA MINERAÇÃO EM LOURENÇO (AP)
Este trabalho foi submetido à banca examinadora em sua versão final para a
obtenção do grau de Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de
altos Estudos Amazônicos – NAEA.
Banca:
Examinador interno: Prof. Dr. Maurílio de Abreu Monteiro
Examinador externo: Prof. Dr. Mário Augusto Gonçalves Jardim
Orientador: Prof. Dr. Armin Mathis
Julgado em: ____/ ____/ _____
Conceito: _________________
BELÉM (PA)
2005
d
Aos meus pais
Maria de Lourdes Grêlo da Silva e
Antero da Silva (In Memorian)
e
AGRADECIMENTOS
O final de um trabalho de pesquisa é sempre uma realização, pela superação de
inúmeros obstáculos, desde a dificuldade em conseguir os dados para a pesquisa, a
inacessibilidade de algumas pessoas e locais, e os problemas com os equipamentos eletrônicos
que volta e meia desistem de colaborar com o andamento do trabalho. Quando chegamos ao
fim é quase um alívio.
Agradeço primeiramente a Deus pelo eterno alento, por permitir que eu alcançasse
muitas de minhas metas e me possibilitar aprender e construir no decorrer desta conquista.
Agradeço à minha mãe, pela paciência, compreensão e carinho nos momentos mais
difíceis. Aos meus irmãos, por contribuírem para escolhas inadiáveis. Ao meu noivo,
Humberto Bastos Jr., que me fez mudar o jeito de observar as dificuldades e esteve presente
em todos os momentos como o meu refúgio.
Agradeço a eterna amizade de Cristiane, que esteve comigo durante todo o curso,
oferecendo seu ombro amigo e grandes idéias para a realização do trabalho. Ao carinho dos
amigos Cesar, Marcelo, Elisângela, Arlinda, Carina, André, Antônio, Marcos Augusto e
especialmente à Joana pela paciência e pensamentos positivos.
Agradeço aos professores do curso, que propiciaram uma nova visão de ciência e o
aumento do conhecimento. Ao meu orientador Prof. Dr. Armin Mathis, pela importância
crucial no auxílio à elaboração do trabalho. Aos colegas da turma de mestrado Roberto,
Geany, Roselene, Sandra e especialmente Ricardo pelo grande companheirismo.
Agradeço às instituições e órgãos que possibilitaram a continuidade do trabalho, o
CNPq, a Secretaria de Meio Ambiente do Amapá, o Departamento Nacional de Produção
Mineral, o Ministério Público Federal, o governo do Estado do Amapá e a prefeitura
Municipal de Calçoene.
f
Agradeço ao representante da Mineração Novo Astro Gessé Soares, por conceder
entrevista. Aos consultores da Ampla Engenharia Nelson Morais Filho e Marcos Morasche. À
Cooperativa de Garimpeiros de Lourenço, aos garimpeiros da área e à população local, pela
contribuição com o andamento da pesquisa.
A todas as pessoas que contribuíram para este trabalho, agradeço o apoio.
Obrigada!
g
“Não quero ser fotógrafo da natureza, da Terra e das suas
riquezas. Desejo ser investigador, forjador de novas idéias
sem conquistar a natureza, lutar para compreendê-la para que
ela me ajude na cultura, na economia. Se eu a compreender
ela me ajudará. Não desejo ser simples observador, turista
imparcial que registra as suas impressões num livro de notas.
Quero viver profundamente os processos da natureza, quero
que do estudo reflexivo da natureza nasça, não apenas a
idéia, mas também a ação. Não devemos apenas passear
pelos grandes espaços de nossa pátria, devemos participar da
sua reorganização e criar uma nova vida”.
Pasqual, 1995.
h
RESUMO
O estudo teve por objetivo verificar a coerência dos Planos de Recuperação de Áreas
Degradadas (PRADs) pela Mineração Novo Astro – MNA no Distrito de Lourenço,
Município de Calçoene (AP), a partir do conhecimento do contexto em que se estabeleceram e
foram decididas as medidas de recuperação, e quais os atores que influenciaram neste
processo de decisão. Foram realizadas entrevistas com membros da população e com
representantes da MNA, da Ampla Engenharia (empresa responsável pela recuperação do
ambiente degradado), da Cooperativa de Garimpeiros de Lourenço – COOGAL, da Secretaria
Especial de Meio Ambiente do Amapá – SEMA, do Departamento Nacional da Produção
Mineral – DNPM, do Ministério Público Federal, do governo do Estado, e da prefeitura
Municipal de Calçoene. Estes atores influenciaram de forma decisiva para os resultados agora
observados no local. A pesquisa envolveu o estudo sobre as medidas de recuperação mais
eficazes em voga, a história dos acontecimentos em Lourenço e o contexto socioeconômico,
para que fossem compreendidas as possibilidades de êxito das medidas escolhidas para o
local. A partir destes dados foi feita a análise da eficácia destes PRADs e tecidas alternativas e
direcionamentos futuros para o local, baseados nas características sociais e ambientais de
Lourenço. O primeiro PRAD, finalizado em 1995, terminou por apresentar resultados pouco
consistentes, de tal forma que o local no qual este foi executado voltou a ser explorado pelos
garimpeiros e continuou a estar em condições degradadas. A MNA, por não ter legalizado sua
situação, foi responsabilizada pela nova recuperação do local em 2002. O segundo PRAD,
parcialmente implementado em 2003, possuiu baixa eficácia, com a morte de mais de 70%
das espécies vegetais utilizadas em algumas áreas. A falta de conhecimentos mais profundos,
por parte das empresas de mineração e de recuperação ambiental, sobre as características do
meio ambiente e do contexto socioeconômico local parecem ter contribuído para os resultados
negativos da implementação dos PRADs. Uma alternativa seria buscar a participação da
população local nos projetos e políticas criados para a região, como forma de criar soluções
que contemplem as características locais e os desejos da população.
PALAVRAS-CHAVE: recuperação, áreas degradadas, mineração.
i
ABSTRACT
This work aims at verifying the existence of Degraded Area Recuperation Plans (DARP’s)
made by Mineração Novo Astro – MNA (Novo Astro mining company), in the district of
Lourenço, Municipality of Calçoene, State of Amapá, Brazil, based on the knowledge of
recuperation measures created and decided within a framework, and to identify who were the
actors that influenced this decision making process. Interviews were conducted with members
of the local population, and representatives of the following organizations: MNA, Ampla
Engenharia (engineering company hired to recuperate the degraded environment), the
Lourenço Mining Cooperative (COOGAL), the Amapá State Special Agency for the
Environment (SEMA), the National Department of Mineral Production (DNPM), the Federal
Public Attorney’s Office, State Government, and Calçoene City Hall. These actors had a
decisive influence on the local results seen today. The research included studies on existent
recuperation measures, historical facts occurred in Lourenço, and the social and economic
context in order to understand the successful measures chosen for that place. From such data,
an analysis of the DARP efficiency was conducted, and alternatives and future guidelines
were suggested, based on the social and environmental features of Lourenço. The first DARP
was concluded in 1995 with pour results, as the place where it was carried out was again
explored by miners and remained in a degraded condition. In 2002, MNA was held in charge
of the new recuperation, due to its previous failure in complying with legal requirements. The
second DARP, which was partially implemented in 2003, has not been very effective, since
more than 70% of the species used in some areas have perished. The negative result of both
DARP’s may result from the lack of a deeper knowledge on the part of the mining companies
and environmental recuperation companies, about the local environmental and socioeconomic
framework. An alternative would be to try to gather local people participation on
the projects and policies created for the area, in order to come up with adequate solutions for
the local population characteristics and desires.
Key words: recuperation, degraded areas, mining
i
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................... 1
METODOLOGIA....................................................................................................................... 4
ÁREA DE ESTUDO.............................................................................................................. 5
COLETA E ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................... 7
CAPÍTULO 1 – AS ATIVIDADES DE EXTRAÇÃO MINERAL, SEUS IMPACTOS AO
MEIO AMBIENTE E A RECUPERAÇÃO DAS ÁREAS DEGRADADAS.........................11
1.1 A EXTRAÇÃO MINERAL ...........................................................................................11
1.2 A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE.................................................................19
1.3 IMPACTOS NEGATIVOS DA EXTRAÇÃO DE OURO............................................26
1.4 LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NA MINERAÇÃO ......................................................30
1.5 RECUPERAÇÃO AMBIENTAL ..................................................................................39
1.6 ESTRATÉGIAS DE RECUPERAÇÃO.........................................................................46
1.6.1 Procedimentos Geotécnicos.....................................................................................47
1.6.2 Procedimentos para Recuperação dos Recursos Hídricos.......................................49
1.6.3 Procedimentos Edáficos ..........................................................................................52
1.6.4 Procedimentos de Revegetação ...............................................................................57
1.7 A RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS PELA MINERAÇÃO NO BRASIL
..............................................................................................................................................67
CAPÍTULO 2 – O DISTRITO DE LOURENÇO....................................................................70
2.1 BREVE CARACTERIZAÇÃO CLIMÁTICA, EDÁFICA E DO REGIME HÍDRICO
DA REGIÃO ........................................................................................................................70
2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO GARIMPO DE LOURENÇO E A
PRODUÇÃO DE OURO .....................................................................................................71
ii
2.2 AS TRANFERÊNCIAS DOS DIREITOS MINERAIS.................................................77
2.3 A COOPERATIVA DE GARIMPEIROS DE LOURENÇO - COOGAL ....................80
2.3.1 A estrutura e atuação da COOGAL.........................................................................80
2.3.2 Os métodos de extração utilizados pela COOGAL.................................................83
2.3.3 A produção de ouro .................................................................................................87
2.4 A PREOCUPAÇÃO COM O MEIO AMBIENTE EM LOURENÇO ..........................89
CAPÍTULO 3 - A RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS EM LOURENÇO........93
3.1 ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE
ÁREAS DEGRADADAS EM LOURENÇO.......................................................................93
3.1.1 O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas de 1995 .........................................95
3.1.2 O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas de 2003 .......................................107
3.2 AVALIAÇÃO DO CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO NA IMPLEMENTAÇÃO DOS
PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS EM LOURENÇO.........125
3.3 TENDÊNCIAS FUTURAS PARA O LOCAL............................................................130
CONCLUSÃO........................................................................................................................137
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................141
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA........................................................................................153
ANEXOS................................................................................................................................157
iii
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 - Mapa do Estado do Amapá, com destaque do Município de Calçoene e do Distrito
de Lourenço. ............................................................................................................................... 6
Figura 02 – Mineração a céu-aberto, com o uso de “bico-jato” para o desmonte hidráulico do
material. ....................................................................................................................................14
Figura 03 – Mina subterrânea em Lourenço (AP)....................................................................15
Figura 04 – Moinho de martelo usado em Lourenço (AP).......................................................16
Figura 05 – Seqüência de placas após o moinho, para amalgamação. .....................................17
Figura 06 – Amálgama sendo queimado com maçarico. .........................................................18
Figura 07 – Retorta existente no garimpo de Lourenço (AP)...................................................18
Figura 08 – Mapa do Município de Calçoene. .........................................................................72
Figura 09 – Planta de beneficiamento da Mineração Novo Astro, logo após a entrega da área
de concessão. ............................................................................................................................74
Figura 10 – Morro de Salamangone (Lourenço-AP), com destaque da entrada da mina ao lado
esquerdo....................................................................................................................................75
Figura 11 – Sede administrativa da Cooperativa dos Garimpeiros do Lourenço (COOGAL).76
Figura 12 - Organograma da COOGAL. ..................................................................................81
Figura 13 – Placa sendo queimada diretamente com maçarico................................................85
Figura 14 – Raspagem de placa após a queima com maçarico. ...............................................86
Figura 15 – Foto aérea do garimpo de Lourenço em 2003.......................................................91
Figura 16 – Croqui das áreas de recuperação do primeiro PRAD da Ampla Engenharia........96
Figura 17 – Croqui das áreas de recuperação do segundo PRAD da Ampla Engenharia. .....112
Figura 18 – mudas de açaí e de cupuaçu (ao centro) a serem utilizadas pela Ampla.............118
Figura 19 – Área do Labourie a ser recuperada......................................................................119
iv
Figura 20 – Preparação de estacas para a plantação de mudas de açaí na área do Labourie..120
Figura 21 – atividades de reflorestamento na área do Labourie.............................................120
Figura 22 – Área do Labourie em setembro de 2004, após a recuperação.............................121
Figura 23 – Área do matadouro em setembro de 2004...........................................................122
Figura 24 – Muda de cupuaçu presente no local. ...................................................................123
Figura 25 – Muda de açaí presente na área do matadouro. ....................................................123
v
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Procedimentos geotécnicos .................................................................................49
Quadro 02 – Procedimentos para a recuperação dos recursos hídricos....................................51
Quadro 03 – Procedimentos edáficos .......................................................................................57
Quadro 04 – Procedimentos de revegetação ............................................................................66
1
INTRODUÇÃO
A recuperação de áreas degradadas é um tema que começa a ser debatido no Brasil
com maior freqüência na década de 1980, a partir da Política Nacional do Meio Ambiente
(Lei N° 6.938 de 1981). Com a Política do Meio Ambiente cresce a preocupação com as
questões da degradação, poluição e qualidade ambiental. A recuperação de áreas degradadas
foi estabelecida primordialmente por esta política, assim como a proteção de áreas ameaçadas
de degradação.
As atividades de extração mineral podem ocasionar uma significativa degradação do
meio ambiente que, segundo Milioli (1999), é inerente a todas as etapas do processo de
exploração. A maior ou menor degradação dependerá das técnicas e procedimentos utilizados
e do tipo de extração (BARBIERI et al., 1997). O setor mineral adquiriu maior importância
para a economia no Brasil a partir da década de 1970 no governo Geisel, com o investimento
em pólos de crescimento na Amazônia, que tinham a extração mineral como a principal
atividade exercida. O Estado do Amapá possui elevado potencial mineral, com a presença de
jazidas de caulim, cromo, ouro, bauxita refratária, argila, seixo e areia, ocorrências de
tantalita-columbita, cobre, rochas graníticas (com grandes possibilidades de aproveitamento
na produção de brita, materiais para calçamento e rochas ornamentais) e possivelmente gemas
e calcário (SEICOM, 2001).
O Distrito de Lourenço (Município de Calçoene - AP) se destaca pela exploração de
ouro há mais de um século na área (PINTO et al., 1999). As empresas de Mineração Novo
Astro S/A – MNA e Mineração Yukio Yoshidome – MYYSA já exerceram atividades de
exploração de ouro no Distrito, no entanto somente a MNA buscou desenvolver algum tipo de
recuperação das áreas por ela degradadas.
2
A MNA iniciou seus trabalhos em 1983, adquiriu as portarias de lavra 291 e 292 em
1986, e encerrou suas atividades em 1995. A empresa explorou ouro a céu aberto e em mina
subterrânea. A MNA, no período em que esteve em Lourenço, construiu infraestrutura para
auxiliar suas atividades, como hospital, alojamentos, clube e estação de tratamento de água,
no entanto, como ressaltam Mathis & Silva (2003), a relação entre a mineradora e os
garimpeiros que trabalhavam no local sempre foi muito conflituosa. A mineradora efetuou
dois Planos de Recuperação de Áreas Degradadas - PRADs, o primeiro em 1995 e o segundo
em 2003. A MNA, ao encerrar suas atividades em 1995, procurou realizar as medidas
presentes no PRAD para posteriormente entregar a área. A empresa se retirou e os
garimpeiros começaram a executar seus trabalhos na área de concessão desta.
A despeito da execução das medidas do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas
da MNA concluído em 1995, houve uma denúncia em 2002 sobre degradação em Lourenço
na área da empresa. A partir desta denúncia foi assinado um Termo de Ajustamento de
Conduta que previa a recuperação das áreas novamente pela MNA. O segundo PRAD foi
iniciado em 2003, e sua primeira parte concluída no início do segundo semestre de 2004.
O estudo aqui proposto teve por objetivos verificar a coerência dos Planos de
Recuperação de Áreas Degradadas executados em Lourenço - Município de Calçoene (Estado
do Amapá), quais as técnicas e métodos que foram utilizados na recuperação das áreas e quais
os utilizados com eficácia no Brasil, bem como relacionar as medidas de recuperação
executadas às características ambientais de Lourenço.
Foi feita uma pesquisa destinada a conhecer o contexto em que se estabeleceram e
foram decididas as medidas de recuperação, quais os atores que influenciaram neste processo
de decisão, e o porquê dos resultados agora observados na localidade. Foram analisados os
fatores que influenciaram estes PRADs e tecidas possíveis alternativas para a sua realização,
baseadas nas características locais de Lourenço.
3
No primeiro capítulo deste estudo foram abordadas conceituações sobre as atividades
de extração mineral e o processo de recuperação de áreas degradadas, as estratégias
consideradas de maior eficácia para as atividades de recuperação, e a legislação pertinente. O
segundo capítulo consta de uma descrição de Lourenço, de seu contexto histórico, das
transferências de direitos minerais, da estrutura e atuação da cooperativa dos garimpeiros, dos
procedimentos de exploração realizados no local e da preocupação com o meio ambiente na
localidade. No terceiro capítulo são analisados os Planos de Recuperação já implementados
em seu contexto ambiental e sócio-político, os atores que influenciaram no processo de
decisão e implementação destas políticas, as características locais que propiciaram os
acontecimentos, e por fim tecidas alternativas para a melhora dos PRADs e das políticas
públicas direcionadas a Lourenço.
4
METODOLOGIA
A abordagem metodológica de um estudo é de grande importância, pois, conforme Yin
(2001), é esta que fará a diferença entre os estudos de caso. Dentro da análise de recuperação
de áreas degradadas pela Mineração Novo Astro, este estudo se baseou em trabalhos que
enfocam o restabelecimento das funções do meio ambiente como meta para a recuperação.
Para pensar a recuperação da capacidade funcional do meio ambiente requer-se que
este seja considerado como parte integrante de um sistema maior. Esta abordagem envolve a
idéia dos sistemas como “complexos de elementos ou componentes direta ou indiretamente
relacionados numa rede causal, de sorte que cada componente se relaciona pelo menos com
alguns outros, de modo mais ou menos estável, dentro de determinado período de tempo” (W.
Bucley citado por Demo 1981). Desta forma, a compreensão das atividades de extração
mineral envolve o estudo do caráter modificador que a mesma tem para com os demais
sistemas envolvidos. As modificações ocasionadas pela atividade envolvem os sistemas
social, institucional, econômico, cultural e ambiental. Cada um destes sistemas reagirá de
maneira distinta às modificações, e a compreensão de qualquer um deles requererá que se
pense no contexto global e na inter-relação que existe entre estas as partes.
O estudo realizado sobre a implementação dos Planos de Recuperação de Áreas
Degradadas em Lourenço (AP) se utilizou dos métodos observacional e comparativo como
forma de obter as respostas às questões levantadas durante a pesquisa. Estes métodos
contribuíram na elucidação sobre as características locais e as escolhas realizadas pelos atores
dentro da temática dos PRADs em Lourenço.
5
ÁREA DE ESTUDO
O estudo direcionou-se à pesquisa na área do Distrito de Lourenço, o qual está
localizado no Município de Calçoene, Estado do Amapá. O Amapá está situado no extremo
norte do Brasil, faz fronteira com o Estado do Pará, a Guiana Francesa e o Suriname, e possui
área de aproximadamente 140.276 km² (ARMELIN, 2001). O Município de Calçoene situa-se
ao norte deste Estado e possui área total aproximada de 6.800 km² (AMARAL, 1980).
Lourenço fica a cerca de 80 km à oeste de Calçoene, dentro das coordenadas de 51°38’00” de
longitude oeste e 02°18’11” de latitude norte (Figura 01). O censo de 2002 relatou para o
Distrito a população de 868 pessoas, das quais 640 são alfabetizados, e 540 (do total) vivem
na área urbana. Em Lourenço o tamanho da população é relativamente inconstante e varia
conforme as altas e baixas da produção de ouro. Em dezembro de 2003 havia mais de 2.000
pessoas na área, e em novembro de 2004 estava em torno de 1.000 pessoas1.
1 Dados relatados por moradores e garimpeiros entrevistados durante as viagens de campo.
6
Figura 01 - Mapa do Estado do Amapá, com destaque do Município de Calçoene e do Distrito de Lourenço.
7
O acesso à localidade a partir da capital, Macapá, pode ser feito via aérea (gasta-se
cerca de uma hora e trinta minutos em monomotor) ou via rodoviária. O acesso pela estrada é
feito pelas BR-156 e BR-260, em um percurso de cerca de 500 km. A estrada é asfaltada
somente até o Município de Tartarugalzinho, o restante é de piçarra e com difíceis condições
de acesso. No verão o percurso é feito em cerca de 6 horas. No período de inverno as
condições ficam muito ruins e o percurso se estende por mais de 10 horas, a passagem às
vezes só é possível em carro com tração. A partir de Lourenço o acesso final à área de
garimpo é feito por estrada cascalhada em um percurso de 2 km.
COLETA E ANÁLISE DOS DADOS
A coleta dos dados se utilizou de diversos procedimentos e técnicas, entre elas a
pesquisa documental, que segundo Yin (2001), é relevante e de importância singular a
praticamente todos os estudos de caso. A análise de fontes documentais elaboradas no período
de estudo permite o conhecimento mais objetivo da realidade, bem como a compreensão dos
processos de mudança na sociedade (GIL, 1999).
Foram consultados registros estatísticos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística) da localidade, como fonte de dados para a análise da oscilação da população
durante os períodos de alta e baixa da produção aurífera. Foram consultados registros
institucionais escritos, no que se refere ao estatuto da Cooperativa de Garimpeiros do
Lourenço (COOGAL) e os estatutos e regulamentos de atuação dos órgãos diretamente
envolvidos na problemática ambiental (Departamento Nacional de Produção Mineral –
DNPM, Secretaria de Meio Ambiente – SEMA, Governo do Estado do Amapá – GEA,
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, Prefeitura
8
Municipal de Calçoene), de modo a conhecer os objetivos e comprometimentos de cada um e
posteriormente seus posicionamentos durante o período estudado.
Foram consultados os Planos de Recuperação de Áreas Degradadas (PRADs) da
Mineração Novo Astro – MNA em Lourenço, de 1995 e 2003, com o objetivo de conhecer os
métodos utilizados para a recuperação e realizar a análise de sua aplicabilidade e eficácia no
local. Foram analisados, inclusive, Estudos e Avaliações de Impacto Ambiental (EIARIMA/
AIA), Planos e Relatórios de Controle Ambiental (PCA/RCA) e PRADs de outras
empresas, com a finalidade de comparação dos métodos utilizados com maior eficácia
atualmente e quais os escolhidos e implementados em Lourenço. A Legislação Ambiental e
Mineral também foi consultada para verificar quais as exigências atuais da lei, em relação à
recuperação de áreas degradadas por atividades como a extração mineral, e se estas foram
seguidas pela empresa MNA.
A pesquisa documental se utilizou ainda de fontes de comunicação de massa, como
jornais, revistas, materiais bibliográficos de origem regional, nacional e internacional, e
publicações impressas e divulgadas on-line, que representassem a área de enfoque do estudo e
que pudessem fornecer suporte à pesquisa.
Para conhecer as técnicas de recuperação que foram utilizadas na área foram
realizadas entrevistas com consultores da empresa Ampla Engenharia (responsável pela
recuperação do local)2, onde foram questionados os métodos que foram utilizados e a base
teórica em que estavam alicerçados. A entrevista é uma excelente fonte de evidências para o
estudo de caso, visto que entrevistados ‘bem-informados’ podem dar importantes
interpretações para uma determinada situação (YIN, 2001). Sitton et al (1983) apresentam
recomendações para o trabalho de campo da história oral e citam os caminhos, procedimentos
e atitudes que o entrevistador deve ter e/ou percorrer, lembrando inclusive a fundamentação
2 As informações obtidas com as entrevistas foram somente anotadas, pois a maioria dos entrevistados não
permitiu o uso do gravador.
9
das entrevistas com o auxílio do gravador, sem esquecer posicionamentos necessários para
evitar o constrangimento ou a não-participação dos entrevistados.
Foram realizadas entrevistas com habitantes de Lourenço, com diretores da
Cooperativa de Garimpeiros do Lourenço - COOGAL e com garimpeiros (membros ou não da
cooperativa)3. As entrevistas auxiliaram no conhecimento da história do local (contada pelos
entrevistados), dos desejos e expectativas dos mesmos para o presente e futuro da região, e da
opinião e percepção destes sobre a execução dos PRADs. Foram seguidas as recomendações
de Oliveira (1996) como forma de melhorar a habilidade para ouvir e compreender dentro da
pesquisa4.
Foram entrevistados os representantes do departamento de licenciamento da
SEMA/AP, que é o órgão responsável pela aprovação e fiscalização dos PRADs5. Os
questionamentos feitos foram sobre as condições da SEMA para a aprovação de um PRAD; o
que a empresa que o formulará e implementará precisa saber; e se estas condições foram
sempre as mesmas durante o período de atuação do órgão. A entrevista também buscou o
conhecimento da situação da fiscalização e aprovação dos PRADs da MNA, e como se
procederam as atividades de fiscalização. O chefe do Departamento Nacional de Produção
Mineral – DNPM também foi entrevistado6 com o fim de obter informações sobre os
acontecimentos envolvendo Lourenço e a temática, e sobre o relacionamento deste órgão com
a mineradora, com os garimpeiros, com a SEMA e com o poder público.7
A obtenção dos dados para o estudo foi feita a partir da realização de seis viagens de
campo a Lourenço. As viagens permitiram realizar as entrevistas e conhecer a realidade local
e o desenvolvimento das medidas de recuperação utilizadas. A técnica da observação foi
3 Idem.
4 O autor conceitua três momentos da pesquisa antropológica, o “olhar”, o “ouvir” e o “escrever”, como
importantes etapas na apreensão dos fenômenos, e que têm sentido particular nos atos de construção do saber.
5 As informações obtidas com as entrevistas foram somente anotadas, pois a maioria dos entrevistados não
permitiu o uso do gravador.
6 Idem.
7 A relação dos entrevistados encontra-se em anexo.
10
utilizada como suporte à obtenção de dados e conhecimento da realidade local e da
recuperação ambiental efetuada. Conforme Gil (1999), a observação tem como principal
vantagem em relação a outras técnicas que os fatos podem ser percebidos diretamente, sem
qualquer intermediação. A técnica utilizada no estudo foi a observação simples, onde o
pesquisador permanece alheio ao grupo ou situação e observa de maneira espontânea os fatos
que ocorrem. Esta coleta de dados seguiu de um processo de análise e interpretação, que
conforme Gil (1999), é o que permitirá a sistematização e o controle requeridos dos
procedimentos científicos.
Com a posse destes dados, foi feita a análise do contexto em que os Planos de
Recuperação de Áreas Degradadas foram implementados em Lourenço, qual a importância
dada às características sociais e ambientais em sua elaboração e implementação, quais os
pontos considerados positivos e negativos nestes planos e o porquê das dificuldades e erros.
11
CAPÍTULO 1 – AS ATIVIDADES DE EXTRAÇÃO MINERAL, SEUS IMPACTOS
AO MEIO AMBIENTE E A RECUPERAÇÃO DAS ÁREAS DEGRADADAS
1.1 A EXTRAÇÃO MINERAL
O Brasil ocupa uma posição dominante como detentor de grandes reservas mundiais,
tanto para minerais metálicos como não-metálicos, estando entre os seis mais importantes
países de vocação mineira do mundo (MILIOLI, 1999; BARRETO, 2001). Segundo Barreto
(2001), o setor mineiro brasileiro foi construído a partir de políticas e leis de fomento que
buscavam estimular este setor dentro da economia nacional, como forma de estratégia de
desenvolvimento. O contexto político, econômico e social teve papel de alavancagem e
sustentação neste processo. O setor mineral terminou por ser o indutor da implantação de
indústrias seqüenciais, e propiciador da criação de empregos e renda (VALE, 2001).
No setor mineiro no Brasil distinguem-se duas atividades de extração mineral
importantes e responsáveis por esta alavancagem no crescimento econômico: a mineração e a
garimpagem. Ambas são responsáveis pelo grande dinamismo do setor e influenciam na
formulação de políticas e estratégias de desenvolvimento. A distinção entre as atividades vai
desde a organização do trabalho, número de trabalhadores e método de lavra8, ao tamanho e
qualidade dos depósitos explorados. Em relação ao tamanho do empreendimento, alguns
autores como Lestra e Nardi (1984) as classificam em garimpagem e pequena, média e grande
mineração, mas consideram como fator importante a mecanização da lavra.
O termo mineração vem comumente associado a uma “indústria extrativa de
minérios”, e a garimpagem às técnicas rudimentares de extração de minérios (FIGUEIREDO,
8 De acordo com o Art. n° 36 do Código de Mineração, lavra compreende o “conjunto de operações coordenadas
objetivando o aproveitamento industrial de uma jazida, desde a extração de substâncias minerais úteis que
contiver, até o beneficiamento das mesmas”.
12
1984). As características para a distinção podem também enfocar o número de trabalhadores e
sua organização (a garimpagem é associada à idéia de menor organização que na grande
empresa extrativa), e a quantidade de minério lavrado (em valores de toneladas)9
(ALBUQUERQUE, 1991). Esta distinção, no entanto, perde parte do sentido se for
considerado que em algumas áreas os garimpeiros apresentam-se organizados em
cooperativas e utilizam máquinas, equipamentos e técnicas sofisticadas para a lavra e
beneficiamento, além de contarem com a presença de pessoal especializado contratado para
auxiliar nos trabalhos, como geólogos e engenheiros de minas10 (MELLO, 1991).
O conceito aqui utilizado será o de mineração e mineradoras para as médias e grandes
empresas de extração mineral, e garimpo e garimpagem para as atividades de pequeno porte
onde os métodos de lavra podem ser rudimentares ou não.
As atividades de extração mineral são responsáveis pelo significativo crescimento na
economia, mas também podem gerar grandes modificações ao meio ambiente. Os danos
ambientais decorrentes destas atividades podem ser definidos a partir da ocorrência de efeitos
locais e efeitos globais. Os efeitos locais são aqueles que afetam mais especificamente o meio
ambiente local, como a poluição e contaminação por graxas e substâncias tóxicas lançadas ao
meio, além dos ruídos, poeiras e minérios em suspensão. Os efeitos globais estão relacionados
a acontecimentos como o aumento da temperatura e a perda da biodiversidade, com a
característica de afetar vários ambientes ao mesmo tempo (BARBIERI et al., 1997).
Villas-Bôas (2001) realizou um estudo sobre a influência dos materiais no meio
ambiente, dividindo o processo de produção na extração mineral em quatro etapas (extração,
processamento, fabricação e manufatura) e relacionando a perda de material para o meio
9 Albuquerque (1991) faz uma distinção entre micro, pequenas, médias e grandes empresas de mineração
baseada na produção em toneladas do minério na boca da mina. Microempresa – até 1.000 t/ano, Pequena
empresa – de 1.000 a 25.000 t/ano, Média empresa – de 25.000 a 250.000 t/ano, Grande empresa – acima de
250.000 t/ano.
10 Em certas áreas de garimpo a produção chega a superar algumas empresas mineradoras. A falta de
informações corretas sobre as exatas quantidades produzidas em garimpos (especialmente de ouro) dificulta
melhores constatações. (MELLO, 1991).
13
ambiente em cada uma delas. Para o autor “as recuperações associadas aos minérios, desde a
mina até o produto final, variam de economia para economia, de país para país, sendo, as
mesmas, funções das tecnologias empregadas, das leis vigentes ou acatamentos voluntários de
regulamentações ambientais e sociais, da capacidade financeira das empresas, da habilidade
no trato industrial e ambiental etc.” (VILLAS-BÔAS, R., 2001, p. 45).
Milioli (1999) considera que durante o processo de exploração na mineração todas as
etapas apresentam potenciais conseqüências para o meio ambiente. As etapas deste processo,
segundo o autor, são: exploração, desenvolvimento, extração, beneficiamento, processamento
metalúrgico e recuperação.
A exploração envolve aspectos de considerações econômicas gerais, sendo que a
principal questão é a demanda por minerais, essa etapa começa com o reconhecimento dos
locais ou áreas com probabilidade de descoberta de depósitos minerais. O desenvolvimento
consiste em quatro atividades, o estudo da viabilidade dos depósitos, o desenho das minas e
suas estruturas de controle ambiental, a avaliação de impacto ambiental, e a construção, que
geralmente provoca efeitos negativos ao meio ambiente relacionados aos distúrbios da
superfície e aos rejeitos. A extração é a retirada propriamente dita dos materiais, os impactos
negativos diferem conforme o tipo de lavra (céu-aberto, subterrânea, mista...). O
beneficiamento é o processo no qual o minério é preparado para um subseqüente estágio no
processamento, removendo constituintes não desejáveis. No processamento se incluem todos
os tratamentos de minérios recebidos após sua extração e beneficiamento. A recuperação
representa a tentativa de transformar a paisagem, a topografia, a vegetação e os solos
anteriormente destruídos (MILIOLI, 1999).
A maior ou menor alteração do ambiente, ou o maior ou menor impacto negativo na
extração do minério, está relacionada aos diferentes tipos de lavra (SANTOS, 1999). Vidal
(1966) e Milioli (1999) descrevem os métodos de lavra a céu aberto (Figura 02) e lavra
14
subterrânea (Figura 03) para a exploração de minas, bem como o maquinário utilizado para
ambos os processos. A lavra subterrânea é realizada geralmente em locais onde a rocha é
suficientemente forte para a perfuração de cavidades. A lavra a céu-aberto está relacionada a
presença de muitos corpos minerais de baixo grau disseminados no local, tendo como
característica a produção de grande quantidade de rejeitos (MILIOLI, 1999).
Figura 02 – Mineração a céu-aberto, com o uso de “bico-jato” para o desmonte hidráulico do material.
Foto do autor. 09.2004.
15
Figura 03 – Mina subterrânea em Lourenço (AP).
As técnicas de extração e beneficiamento na garimpagem e na mineração industrial de
ouro na Amazônia são descritas por Mathis et al. (1997). Na garimpagem a escolha e a
extração dos depósitos primários11 (em uma lavra a céu-aberto) procedem primeiramente com
a limpeza do local ou decapeamento, e posteriormente com a escolha do método que será
utilizado para a extração (conforme as condições da rocha), que pode ser com picareta, trator,
martelo hidráulico, bico-jato (Figura 02) ou explosivos. Em uma lavra subterrânea é feita
primeiramente a abertura de um poço, que é rebaixado até a camada de cascalho aurífero ou a
rocha mineralizada, posteriormente os garimpeiros podem seguir horizontalmente a direção
do veio aurífero com a construção de galerias; os materiais utilizados são ferramentas como
pá, picareta, martelos hidráulicos e explosivos (MATHIS et al, 1997). Na exploração de leitos
de rios na garimpagem são usados procedimentos de dragagem através de balsas que ficam na
superfície. Segundo Lestra & Nardi (1984), as técnicas de extração de pequenas a grandes
11 Ouro primário é aquele oriundo da rocha matriz, e que pode ser explorado por meio de métodos de lavra
subterrânea. O ouro secundário é resultante do ouro primário e modificado pelo intemperismo, presente nas
camadas acima da rocha matriz. Os depósitos secundários podem ser formados próximo à rocha originária
(eluvião) ou serem transportados pela água a lugares mais distantes (aluvião). (MATHIS et al., 1997).
Foto: Armin Mathis.04.2004.
16
empresas de mineração incluem a dragagem (para leitos de rios), a utilização de bombas de
cascalho, drag-lines e outros equipamentos12.
Segundo Mathis et al. (1997), os métodos de beneficiamento utilizados na
garimpagem de ouro são escolhidos de acordo com o tamanho e a qualidade da jazida, por
meio de duas técnicas: a gravimetria (para obter o pré-concentrado) e a amalgamação e
queima (para obter o concentrado final). A concentração gravimétrica é feita com o auxilio de
equipamentos feitos pelos próprios garimpeiros, onde o material pode ser passado
inicialmente por um moinho (para a redução do tamanho) (Figura 04) e em seguida, misturado
à água, ser passado por uma seqüência de placas onde o mercúrio13 pode ser adicionado para a
retenção do ouro (Figura 05).
Figura 04 – Moinho de martelo usado em Lourenço (AP).
12 Maiores detalhes sobre as técnicas ver Lestra & Nardi (1984).
13 Em muitos garimpos como o de Lourenço (Município de Calçoene - AP) é utilizado o mercúrio para a
amalgamação do ouro.
Foto: Bernard Peregovich.04.2004.
17
Figura 05 – Seqüência de placas após o moinho, para amalgamação.
A amalgamação ocorre pela ligação das partículas de ouro ao mercúrio. O amálgama é
obtido por meio da raspagem das placas, sendo posteriormente espremido em lenços ou
pedaços de pano para retirar o excesso do mercúrio. O material é então queimado para que
haja a evaporação deste e reste o ouro14. A queima do material pode ser feita diretamente com
maçarico (Figura 06) ou com o auxílio de retortas (Figura 07). As retortas são equipamentos
utilizados para recuperar o mercúrio e evitar sua liberação no meio ambiente, chegando a
recuperar 97% do mercúrio do amálgama15 16.
14 Este ouro é chamado de “doré” no garimpo (ou “ouro-esponja”), porque ainda possui uma certa quantidade de
mercúrio. O restante do mercúrio será queimado nas casas de compra de ouro, com equipamentos onde a chama
atinge temperaturas mais elevadas que a do maçarico usado nos garimpos.
15 Procedimentos realizados no garimpo de Lourenço (AP).
16 Maiores detalhes ver Mathis et al. (1997).
Foto: Armin Mathis.04.2004.
18
Figura 06 – Amálgama sendo queimado com maçarico.
Figura 07 – Retorta existente no garimpo de Lourenço (AP).
Foto: Armin Mathis. 04.2004.
Foto: Bernard Peregovich. 04.2004.
19
As técnicas de beneficiamento utilizadas por empresas de mineração diferem um
pouco daquelas utilizadas na garimpagem. Mathis et al. (1997) enumeram quatro métodos de
separação do metal usados pelas empresas: a separação gravimétrica, a separação por
amalgação, a separação por flotação e a separação por lixiviação.
A separação gravimétrica é semelhante à da garimpagem, somente com maior
sofisticação no método e o aumento da capacidade de processamento. A separação por
amalgamação também é semelhante à da garimpagem, com melhores técnicas para a
recuperação de material com baixo teor de ouro. A flotação é feita por meio da agitação da
polpa do material misturado com o ouro em uma máquina, onde o metal se liga às moléculas
de ar e forma uma espuma na superfície da máquina e o rejeito fica no fundo. A separação por
lixiviação consiste em dissolver o material a ser recuperado em uma solução aquosa,
normalmente de cianeto e cloro (MATHIS et al., 1997).
1.2 A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE
As técnicas de extração e beneficiamento de minério utilizadas na garimpagem e na
mineração geram potenciais efeitos ao meio ambiente. A retirada de material durante a
extração proporciona significativas mudanças na topografia e estrutura local, e durante as
etapas do beneficiamento o ambiente pode ser contaminado com substâncias tóxicas. A
extração mineral, desta forma, degrada o meio ambiente em um maior ou menor grau de
acordo com as técnicas e procedimentos utilizados. A degradação pode ser compreendida
como uma modificação no todo ou em componentes de um sistema, com efeitos que
envolvem uma redução ou perda de uma capacidade, de mecanismos ou de componentes que
anteriormente estavam presentes.
20
Conforme Noffs (2000) a degradação ambiental se refere às modificações impostas
pela sociedade aos sistemas ecológicos naturais. Estas alterações comprometeriam
(degradariam) as características físicas, químicas e biológicas do local, e conseqüentemente a
qualidade de vida dos seres humanos. Uma área degradada é um ambiente modificado por
uma obra de engenharia ou submetido a processos erosivos intensos que alteram suas
características originais. Esta alteração, ao exceder os limites naturais de recuperação do
ambiente, necessita da intervenção do homem para sua recuperação (NOFFS, 2000).
Os sistemas não degradados estão representados por instâncias pouco ou nada
modificadas pelo homem ou demais agentes de transformação. O homem, ao interferir na
dinâmica natural dos sistemas ecológicos, pode ocasionar uma redução das capacidades do
mesmo em manter a continuidade de processos, sejam eles de interrelação, metabólicos ou
ecológicos, e conseqüente ocasionar um nível de degradação. Os demais agentes
modificadores desta dinâmica podem ser representados por fatores que digam respeito às
forças da natureza, como furacões, enchentes, incêndios ocasionados pela seca, etc. (ODUM,
1988). A degradação do meio ambiente, no entanto, está comumente relacionada às atividades
humanas.
Odum (1988) compara o funcionamento dos ecossistemas, ou sistemas ecológicos, ao
de sistemas cibernéticos, no que se refere à presença de redes de informações que
compreendem fluxos de comunicação que interligam todas as partes e governam ou regulam o
sistema como um todo. A diferença entre ambos é que as funções de controle na natureza são
internas ou difusas, e nos mecanismos cibernéticos são externas e especificadas. Os
componentes dos sistemas ecológicos estão interligados e reagem entre si, mas suas reações
diante de perturbações são difíceis de mensurar com exatidão, visto seu caráter difuso e a
dificuldade de saber onde irão ocorrer.
21
Os sistemas ecológicos são mencionados por Ricklefs (2003) como um conjunto de
compartimentos entre os quais os elementos circulam. Os compartimentos podem estar
relacionados tanto a espécies e suas relações como a elementos químicos que se modificam e
se transformam, percorrendo desde pequenos a grandes compartimentos. Cada elemento ou
organismo age dentro deste sistema e alterações bruscas nos componentes também alteram o
sistema total. A falta de previsibilidade sobre as reações diante de uma perturbação está
relacionada à complexidade das conexões entre os elementos, onde a interferência em um
pode gerar modificações em outros componentes.
A interligação dos componentes em um sistema implica que, para se compreender um
processo como a degradação ambiental, seja necessário conhecer o sistema total no qual estão
inseridos. Capra (1998) lembra que o pensamento reducionista às vezes é necessário para se
conhecer um compartimento, porém é perigoso se encarado como se fosse a interpretação
completa. De acordo com o autor, “reducionismo e holismo, análise e síntese, são enfoques
complementares e que, se usados em equilíbrio adequado, permitem chegar a um
conhecimento mais profundo da vida”. (CAPRA, F., 1998, p. 261).
Nascimento et al. (2001) estudam a degradação ambiental a partir de uma abordagem
sistêmica, na busca do entendimento da totalidade integrada por meio da conexão das relações
e do contexto. Esta abordagem contribui ao entendimento da dinâmica da degradação
ambiental, e parte do conhecimento desta dinâmica para tentar resolver o problema por dois
caminhos: uma solução sintomática, com ações de curto prazo para diminuir os efeitos da
degradação; ou uma solução que observe o longo prazo, visto que as ações problemáticas
continuarão a acontecer e contribuir para o aumento da degradação.
Soluções sintomáticas para diminuir a degradação tendem a negligenciar a
interconexão dos elementos no sistema e a buscar resultados tão somente “paliativos”, pois ao
se preocupar com a aparência perde-se grande parte da essência das relações ambientais. As
22
soluções que enfocam o longo prazo tendem a se preocupar mais com a totalidade dos
elementos envolvidos e suas relações e, portanto, tendem a se mostrar mais eficazes que as
primeiras.
A degradação ambiental, de acordo com Lima-e-Silva et al. (1999), ocorre em toda a
parte, com maior ou menor intensidade, dependendo das técnicas utilizadas na exploração dos
recursos naturais e da preocupação local com a conservação desses recursos. As técnicas de
exploração que buscam diminuir efeitos negativos ao meio ambiente e à população local
ocasionam naturalmente um nível de degradação mais baixo, e a preocupação local com o
ambiente está diretamente associada à tomada de medidas por instâncias responsáveis que
visem a diminuição cada vez maior deste nível de degradação.
A degradação do meio ambiente está relacionada à terminologia “impacto ambiental”.
Ao se falar de impacto é possível associar a uma ação/reação que força alguém ou alguma
coisa à mudança. Esta ação/reação que causa mudança pode provocar efeitos positivos ou
negativos, ou seja, impactos positivos ou negativos. A definição de impacto contida no
dicionário o conceitua como uma “impressão muito forte, muito profunda, causada por
motivos diversos, e que impele à mudança” (FERREIRA, 1999). A degradação ambiental está
desta forma necessariamente associada a impactos de caráter negativo.
Os impactos causados por atividades potencialmente modificadoras, como a extração
mineral, são considerados positivos quando acarretam benefícios/melhorias nas condições de
vida da população ou região, e são considerados negativos quando de alguma forma
danificam/prejudicam as condições sociais, ambientais ou econômicas que estejam envolvidas
no decorrer do processo (SANTOS, 1999).
O conceito de impacto ambiental definido no Art. 1° da Resolução CONAMA Nº
001/86 compreende “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do
meio ambiente, causado por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades
23
humanas que direta ou indiretamente afetam: a saúde, a segurança e o bem estar da
população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do
meio ambiente; e a qualidade dos recursos ambientais”.
Para Santos (1999), impacto ambiental está relacionado aos processos de alterações
sociais e ecológicas, e implica em “juízo de valor sobre a importância de um efeito ambiental
causado pela alteração resultante de um processo físico-natural, pela introdução de um objeto
novo ou provocado por atividades humanas ou processos sociais” (SANTOS, E. C., 1999, p.
30). O autor cita Canter para exemplificar as várias classificações de impactos: positivos e
negativos; reversíveis e irreversíveis; reparáveis e irreparáveis; a curto e a longo prazo etc.
Porém, o mesmo lembra que é necessário cuidado com as identificações, pois estas
dependerão do ângulo de visão adotado na classificação.
Os impactos ambientais de atividades como a extração mineral, conforme Barbieri et
al. (1997), irão depender de inúmeros fatores como a localização geográfica e o
condicionamento geológico da mina, qual mineral está sendo explotado, se o empreendimento
possui grandes dimensões, qual o volume de minério lavrado e beneficiado, qual o tipo de
lavra e a tecnologia utilizada. É necessário lembrar “que o desenvolvimento contínuo das
atividades mineradoras implica na acumulação sucessiva de impactos ambientais sobre o meio
ambiente, que tem uma capacidade limitada de absorvê-los” (BARBIERI et al. 1997, p. 325).
As atividades de extração mineral também geram impactos por meio da contaminação com
substâncias químicas. Veiga (1997), em um trabalho sobre a contaminação por mercúrio em
áreas de mineração de ouro, explica como se dá esta contaminação, quais as formas mais
perigosas do elemento e como proceder à frente da situação.
Lima-e-Silva (2003) considera que os impactos de uma atividade industrial não podem
ser olhados de fora de um contexto, pois os fenômenos ambientais não são estanques
compartimentados. Assim como os benefícios e as externalidades positivas são socializados,
24
os impactos negativos também deveriam ser observados de maneira holística, em um contexto
maior. Este autor contribui para a classificação e o estudo de impactos ambientais decorrentes
de atividades industriais, em uma conceituação de modelos de avaliação de impactos
ambientais e dos riscos ambientais envolvidos na atividade, e citando direcionamentos para a
redução da degradação provocada por tais atividades.
Barreto (2001), ao falar a respeito de degradação e impactos ambientais na exploração
mineral, ressalta pontos em que a atividade passa a ser alvo de críticas de cunho ecológico.
Um dos pontos é o fato dos recursos minerais serem considerados recursos não-renováveis,
recursos que se formaram a partir processos geológicos com o aquecimento e o resfriamento
da crosta terrestre no decorrer de milhões de anos17. A autora, no entanto, considera esta
tipologia controversa, ao lembrar que discussões sobre o assunto demonstram que o recurso
mineral só possui valor quando se transforma em bem mineral e quando há demanda, portanto
um recurso mineral não se esgotaria, simplesmente assumiria outras formas e propriedades. A
autora lembra também a recente transformação de recursos renováveis como a água, o ar e a
terra cada vez mais em recursos não-renováveis.
O entendimento sobre degradação, impactos ambientais e recuperação de áreas
degradadas pode mudar de acordo com o local estudado. A pouca importância dada à temática
em uma região pode obscurecer o nível de degradação a que a mesma está submetida, e não
conferir importância às práticas de recuperação ambiental. Os valores que são atribuídos à
questão ambiental pelos atores irão modificar a visão sobre degradação e recuperação do
local.
Os atores sociais, como o governo do Estado e a prefeitura Municipal, ao
negligenciarem o potencial degradador de uma atividade em função de benefícios
17 A terminologia “recursos não-renováveis” considera que se o mineral teve sua formação por processos
específicos e no decorrer de milhões de anos, para se formar novamente precisaria das mesmas condições e
período de tempo, portanto não se renovaria. Os recursos renováveis (p. ex. os peixes de um rio ou os frutos de
uma árvore) poderiam se substituir no decorrer do tempo, por meio da reprodução das espécies envolvidas
(exceto no caso de depredação e extermínio total de uma espécie).
25
particulares, aumentam a tolerância às alterações e aos futuros comprometimentos da saúde e
bem-estar do homem e natureza. Boisier (1989) ressalta que as instituições desempenham o
papel de controle de atividades modificadoras do meio e precisam exercer a função de “juiz”.
As empresas e a população local também possuem papel importante na modificação das
decisões finais, a primeira quanto à decisão de internalizar ou não os custos ambientais, e a
segunda em se comprometer ou não com questões deste tipo (BOISIER, 1989). A falta de
participação e preocupação dos atores sociais com os problemas públicos torna restrita a
capacidade de controle sobre ações que se poderiam considerar de elevado poder modificador
(CACCIA BAVA, 1995), principalmente relacionadas às condições ambientais.
Conforme Ayres (apud SANTOS et al., 2001) as atividades econômicas também são
agentes capazes de gerar impactos, tanto sobre o meio ambiente quanto sobre si mesmas. Para
o autor, um agente econômico, ao empreender atividades de produção e consumo visando
somente a maximização de sua utilidade, gera impactos negativos (externalidades negativas)
sobre outros, e muitas vezes não paga pelos danos eventualmente produzidos.
A idéia de “pagar” pelos danos implica a realização de procedimentos que diminuam a
degradação e melhorem a viabilidade do sistema prejudicado. Ricklefs (2003) menciona
algumas razões atuais para a recuperação e a preservação de características de diversidade de
espécies em locais ‘intactos’ e devastados. “A razão para conservar dependeria de muitos
valores relacionados ao nosso interesse e envolvimento pessoais” (Ricklefs, 2003, p. 446). O
autor menciona um posicionamento moral associado à idéia de que se o homem afeta toda a
natureza deve ser também sua responsabilidade protegê-la. Outra razão, na ausência de uma
proteção moral, é o valor da natureza do ponto de vista de seus benefícios econômicos e
recreacionais para o homem; sendo esta importância econômica naturalmente ligada ao fato
de um recurso alimentar possibilitar a caça e produtos florestais, bem como drogas e químicos
orgânicos.
26
O comprometimento dos diferentes atores sociais com a recuperação de áreas
degradadas contribui para o controle sobre as decisões do poder público na elaboração e
implementação de políticas. As políticas públicas funcionam como medidas que enfocam as
necessidades de todos os envolvidos. Segundo Amaral (1995), as políticas ambientais vêm de
um desafio: a tentativa de estabelecer “regras” de exploração, pois caso estas inexistissem
poderia ocorrer uma exploração desordenada com supressão de oportunidades de vida digna
de segmentos da população. Uma política se formaria quando um tema passasse a ser
percebido como relevante por diversos segmentos da sociedade.
A definição de uma política para o meio ambiente deve ser feita com a influência de
diferentes atores sociais, pois o maior envolvimento gera maiores chances da uma política ser
democrática, e quanto mais democrático for este processo de definição maior as
possibilidades de que ela cumpra os seus objetivos (AMARAL, 1995). As dificuldades que
envolvem a definição, implantação e avaliação das políticas públicas para o meio ambiente
são a falta de planejamento a longo prazo das ações públicas e os diferentes interesses quanto
ao uso dos recursos naturais (AMARAL, 1995).
1.3 IMPACTOS NEGATIVOS DA EXTRAÇÃO DE OURO
As atividades de extração mineral são potenciais modificadores do local onde se
implantam. Os impactos ambientais negativos da extração mineral estão relacionados à
degradação dos solos, à retirada da vegetação, e à contaminação de cursos d’água, solos,
animais e homem. A contaminação provocada pela extração de ouro compreende o uso de
substâncias tóxicas no beneficiamento do minério, como o mercúrio e o cianeto. O uso de
mercúrio indiscriminadamente em garimpos e sem cuidados especiais pode ocasionar níveis
27
de contaminação elevados e de difícil remediação. O cianeto é uma substância perigosa e
pode se tornar extremamente tóxico caso não sejam adotadas medidas específicas no decorrer
de sua utilização.
De acordo com Mathis et al. (1997), o uso do mercúrio na recuperação do ouro é mais
comum entre garimpeiros, mas algumas mineradoras também o utilizam no processo de
beneficiamento. A quantidade de mercúrio lançada ao ambiente na forma de rejeito varia
conforme as técnicas utilizadas, podendo chegar a três partes de mercúrio para cada parte de
ouro produzido (VEIGA & HINTON, 2002). As conseqüências desta difusão de mercúrio nos
rios e solos são muitas e diversas pesquisas têm começado a ser empreendidas na ordem de
entender o ciclo geoquímico do metal e a possibilidade de sua introdução na cadeia
alimentar18.
O mercúrio em sua forma natural (mercúrio metálico) não é prejudicial, a queima do
amálgama a céu-aberto dá início ao processo de contaminação, onde o garimpeiro pode inalar
diretamente os vapores, que irão se acumular no pulmão e facilitar a disseminação pelo
organismo. O vapor de mercúrio oriundo da queima também pode ser oxidado e formar o
mercúrio ionidado (Hg2+), que será condensado nas nuvens e voltará para o solo na forma de
chuva, a partir daqui poderá ser transformado em mercúrio orgânico (CH3Hg+) e então
absorvido pelos seres vivos e convertido em metilmercúrio, que é sua forma tóxica, a
contaminação se dará pelo consumo dos peixes e outros animais contaminados. O mercúrio
metálico que é liberado ao meio ambiente durante o processo de lavra também pode se
transformar em mercúrio orgânico, o que depende das características hidrográficas do rio ou
corpo d’água em que o mercúrio foi liberado (VEIGA, M., 1997 e MATHIS et al., 1997).
18 Variados autores têm estudado sobre a utilização do mercúrio e seus efeitos para o meio ambiente e o homem,
como exemplo Lacerda (1992), Lacerda & Salomons (1992), Câmara et al. (1996), Veiga (1997), Brabo et al.
(1999), Veiga et al. (1999), Harada et al. (2001), Nascimento & Chasin (2001), Morris et al. (2002), Pierre et al.
(2002) e Veiga & Hinton (2002).
28
A contaminação aguda por mercúrio ocorre quando o amálgama é queimado a céu
aberto. O mercúrio inalado é oxidado nos pulmões formando complexos solúveis no sangue e
que podem penetrar no cérebro. Os sintomas associados à crônica exposição ao vapor do
mercúrio são a exagerada resposta emocional, gengivite e tremores musculares. O mercúrio
também pode ocasionar problemas à gravidez, e gerar abortos e o nascimento de crianças com
malformações (VEIGA & HINTON, 2002).
A contaminação crônica por mercúrio ocorre quando este é convertido em
metilmercúrio e posteriormente introduzido na cadeia alimentar. Os sintomas desta
contaminação são diminuições da visão, dormência nas extremidades do corpo,
enfraquecimento da audição, da fala e do modo de andar, e em casos agudos a atrofia
muscular, distúrbios mentais e de apreensão (VEIGA & HINTON, 2002).
O cianeto é mais eficaz na recuperação do ouro, principalmente o de granulometria
muito baixa, mas o cuidado com a substância precisa ser redobrado. O cianeto quando
utilizado no processo de cianetação possui pouca estabilidade e precisa ser mantido em
quantidades específicas de hidrogênio e oxigênio19, caso contrário pode se transformar em gás
cianídrico, que é um gás letal (VEIGA & HINTON, 2002). Segundo a U. S. Environmental
Protection Agency o cianeto é corrosivo, e quando inalado (na forma de gás cianídrico) inibe
a respiração celular e causa alterações no sangue, no sistema nervoso central e na tireóide,
causa também tonturas, dores de cabeça, náuseas, vômitos, dificuldade de respiração,
irregularidade nos batimentos cardíacos, perda de consciência, coma e morte. A ingestão, por
ser corrosivo, causa queimaduras na boca e esôfago, e dor abdominal. A inalação de doses
altas causam rápida perda de consciência e morte súbita por parada respiratória, doses
menores podem prolongar a doença por uma ou mais horas.
19 O cianeto precisa ser mantido a um pH (potencial de hidrogênio) de valor aproximadamente 12 e em
concentrações abaixo de 25 % de oxigênio (VEIGA & HINTON, 2002).
29
Sánchez & Enríquez (1996) ressaltam os impactos da extração de ouro ao estudar a
mineração no Chile. Conforme os autores, o início dos trabalhos implica na abertura de
caminhos de acesso, na instalação de uma infra-estrutura e na eliminação de pequenas zonas
de vegetação; posteriormente podem ser utilizados equipamentos mais pesados, um sistema
de alimentação de água e explosivos, que ocasionam tanto a emissão de pó como a geração e
o depósito de material estéril.
Os impactos ambientais da extração mineral também estão associados aos cortes feitos
na superfície do terreno, que afetam o local de forma visual e geológica, e a retirada do solo
afeta a vegetação local e produz a migração e realocação das espécies animais (SÁNCHEZ &
ENRÍQUEZ, 1996). As áreas em que é elevada a densidade dos animais, populações inteiras
de algumas espécies podem ser exterminadas em colisões com veicúlos ou pela entrada dos
primeiros em áreas da mina. Algumas espécies podem ser extintas quando as populações são
pequenas ou se encontram geograficamente isoladas (SUMI, 2003).
A água das chuvas, ao passar pelas minas também pode se contaminar ao incorporar o
conteúdo metálico e tornar-se ácida. Estas águas podem fluir para cursos d’água superficiais
ou subterrâneos, contaminando rios e lençóis freáticos (SÁNCHEZ & ENRÍQUEZ, 1996). As
águas das chuvas transportam material a outros locais, quando este material é depositado no
leito dos rios ocorre seu assoreamento20.
A retirada da vegetação associada aos índices de chuva podem provocar ou aumentar a
erosão, ou seja, o deslocamento de solo nas encostas. De acordo com Sumi (2003), os efeitos
da erosão podem ser problemáticos para a mina, pois a água que corre pelas rochas pode
causar a desestabilização do local e desmoronamentos, pondo em risco a segurança de
trabalhadores.
20 O assoreamento dos rios também pode ser ocasionado pela própria exploração mineral do leito destes.
30
Barreto (2001) cita instrumentos legais, econômicos e técnicos capazes de minimizar
os impactos ocasionados pelas atividades de extração mineral. Os legais se referem ao
licenciamento ambiental, ao estudo e relatório de impacto ambiental, ao plano de controle
ambiental, e ao plano de recuperação de áreas degradadas. Os instrumentos econômicos estão
relacionados a incentivos e caução ambiental. Os instrumentos técnicos envolvem o
desenvolvimento de novas tecnologias e parâmetros ambientais.
A tecnologia hoje existente permite a grande redução dos impactos negativos de
empreendimentos mineradores ao meio ambiente. Porém, esta tecnologia envolve custos
adicionais aos projetos, sejam estaduais ou privados, de companhias nacionais ou
multinacionais, ou empreendimentos de garimpo, que nem sempre se mostram acessíveis a
internalizar estes custos. Em variados casos esta redução de benefícios e a preocupação com
os problemas ambientais só são encarados quando a pressão da opinião pública ou dos órgãos
ambientais não deixa outra alternativa às companhias de mineração.
1.4 LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NA MINERAÇÃO
A mineração no Brasil tem como norma vigente o Código de Mineração promulgado
pelo Decreto-Lei n° 227 de 1967. O código foi atualizado em 1996 pela Lei n° 9.314. Ele
classifica as minas e os regimes de aproveitamento das substâncias minerais, conceitua e
estabelece os parâmetros necessários à pesquisa mineral, conceitua lavra e explicita as
condições necessárias à sua outorga. O DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral)
é o órgão responsável pela autorização de pesquisa mineral e concessão de lavra.
A preocupação com o meio ambiente na legislação brasileira surge mais tarde com a
sanção da Política Nacional do Meio Ambiente em 1981 (Lei n° 6.938/81). A Política do
31
Meio Ambiente permitiu que a dimensão ambiental entrasse definitivamente no universo de
toda a atividade econômica desenvolvida no país. O Art. 2o desta Lei considera como os
objetivos da política que “a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental
propícia à vida, visando assegurar, no país, condições ao desenvolvimento socioeconômico,
aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana”. A lei
estabelece a recuperação de áreas degradadas e a proteção de áreas ameaçadas de degradação,
além de conceituar meio ambiente, degradação da qualidade ambiental, poluição, poluidor e
recursos ambientais. Entre os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente está o
estabelecimento de padrões de qualidade ambiental; o zoneamento ambiental; a avaliação de
impactos ambientais; e o licenciamento e revisão de atividades efetiva ou potencialmente
poluidoras.
O Art. n° 8 da Política Nacional do Meio Ambiente atribuiu as competências do
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, entre as quais o estabelecimento de
normas e critérios para o licenciamento de atividades potencialmente poluidoras, e o
estabelecimento de normas e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do
meio ambiente para o uso racional dos recursos naturais.
A Lei n° 6.902 de 1981 foi sancionada no mesmo ano que a Política do Meio
Ambiente, e dispunha sobre a criação de Estações Ecológicas e de Áreas de Proteção
Ambiental. Ambas as Leis, no entanto, só foram regulamentadas em 1990 pelo decreto n°
99.274.
O CONAMA, como o órgão ao qual coube dispor as regras e normas para as
atividades poluidoras, teve em sua Resolução n° 01 de 1986 o estabelecimento de diretrizes
gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental. Esta Resolução
conceituou impacto ambiental, estabeleceu a necessidade do Relatório de Impacto Ambiental
(RIMA) para o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, e atribuiu as
32
conceituações e parâmetros que devem constar no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) – itens
necessários para o licenciamento do empreendimento.
O Art. n° 7 da Resolução CONAMA n° 01/86 determina que o Estudo de Impacto
Ambiental (EIA) deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar habilitada, e que não seja
dependente direta ou indiretamente do proponente do projeto. O Art. n° 5 determina as
diretrizes que o EIA deve obedecer:
- “Contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização de projeto,
confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto”;
- “Identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de
implantação e operação da atividade”;
- “Definir os limites da área geográfica a ser diretamente ou indiretamente afetada
pelos impactos, denominada área de influência do projeto”;
- “Considerar os planos e programas governamentais propostos e em implantação na
área de influência do projeto, e sua compatibilidade”. 21
A Resolução determina em seu Art. n° 6 as atividades técnicas que deverão ser
desenvolvidas para a execução do estudo de Impacto Ambiental. As atividades são:
- Diagnóstico ambiental da área de influência do projeto, com uma descrição completa
e uma análise dos recursos ambientais e suas interações, sendo considerados o meio
físico (subsolo, água, ar, e clima, incluso os recursos minerais, a topografia, os tipos e
aptidões do solo, os corpos d'água, o regime hidrológico, as correntes marinhas e as
correntes atmosféricas), o meio biológico e os ecossistemas naturais (a fauna e a flora,
incluso as espécies indicadoras da qualidade ambiental, de valor científico e
econômico, raras e ameaçadas de extinção) e o meio sócio-econômico (uso e ocupação
do solo, usos da água, contexto histórico e cultural da comunidade, e as relações de
21 Resolução CONAMA n° 001 de 23 de janeiro de 1986.
33
dependência entre a sociedade local, os recursos ambientais e a potencial utilização
futura desses recursos). 22
- Análise dos impactos ambientais do projeto pela identificação, previsão da
magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos relevantes, sendo
discriminados os impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), diretos e
indiretos, imediatos e a médio e longo prazos, temporários e permanentes. A análise
deve enfocar o grau de reversibilidade dos impactos, as propriedades cumulativas e
sinérgicas, e a distribuição dos ônus e benefícios sociais. 23
- Definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os
equipamentos de controle e sistemas de tratamento de despejos, sendo avaliada a
eficiência de cada uma delas. 24
- Elaboração do programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos
positivos e negativos, com a indicação dos fatores e parâmetros a serem considerados
para a execução. 25
A Resolução CONAMA n° 009 de 1987 trouxe complementação ao tratar com
maiores detalhes da audiência pública, que havia sido primeiramente referida na Resolução
CONAMA nº 001/86. A audiência pública tem por finalidade expor àqueles interessados o
conteúdo das atividades do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) em seu referido Relatório de
Impacto Ambiental (RIMA), de modo a dirimir dúvidas e recolher críticas e sugestões dos
presentes a respeito do estudo a ser realizado e do empreendimento degradador. O Órgão de
Meio Ambiente poderá promover a realização da audiência pública sempre que julgar
22 Idem.
23 Idem.
24 Idem.
25 Idem.
34
necessário ou quando for solicitado por entidade civil, pelo Ministério Público, ou por
cinqüenta ou mais cidadãos. 26
A Resolução CONAMA nº 010 de 03 de dezembro de 1987 determinou em seu Art.
n°1, como um dos pré-requisitos para o licenciamento, a implantação de uma Estação
Ecológica pela empresa de exploração, preferencialmente junto à área do empreendimento,
para fazer face à reparação dos danos ambientais causados pela destruição de florestas e
outros ecossistemas.
A legislação ambiental brasileira teve na Constituição de 1988 um importante marco
regulamentar, com a dedicação de um capítulo ao meio ambiente (Capítulo VI – Art. 225). O
artigo nº 225 estabeleceu as competências do Poder Público em relação ao meio ambiente,
como a preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético, a promoção da
educação ambiental, a proteção da fauna e flora etc. O § 2° do Art. 225 estabeleceu a
obrigatoriedade da recuperação de áreas degradadas, e o § 3° determinou que “as condutas e
atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigatoriedade de
reparar os danos causados”. A mineração, no entanto, permaneceu dentro do capítulo que trata
dos princípios das atividades econômicas, onde se estabelece que a pesquisa e lavra dos
recursos minerais só poderão ser efetuados mediante a autorização ou concessão da União.
O Decreto n° 97.507 de 13 de fevereiro de 1989 estabeleceu no Art. n° 1 o
licenciamento de atividades de exploração mineral individuais ou coletivas que realizem
extração mineral nos diferentes depósitos minerais se utilizando de equipamentos do tipo
dragas, moinhos, balsas, pares de bombas (chupadeiras), bicas ("cobra fumando") e quaisquer
outros equipamentos afins. O Art. n° 2 veda o uso de mercúrio em atividades de extração de
ouro que não estejam devidamente licenciadas, exceto em mananciais de abastecimento
26 Resolução CONAMA n° 009 de 03 de dezembro de 1987.
35
público e seus tributários e em outras áreas ecologicamente sensíveis, que não poderão ser
explorados. O Art. n° 2 em seu §2° proíbe o emprego do processo de cianetação nas
atividades descritas no artigo 1°, resguardado o licenciamento do órgão ambiental
competente.
A regulamentação da exigência do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas por
empresas de extração mineral, contida na Constituição de 88, foi feita pelo Decreto n° 97.632,
de 10 de abril de 1989, que estabelece que “os empreendimentos que se destinam à
exploração de recursos minerais deverão, quando da apresentação do Estudo de Impacto
Ambiental - EIA e do Relatório do Impacto Ambiental - RIMA, submeter à aprovação do
órgão ambiental competente, plano de recuperação de área degradada”. O Art. 3° deste
Decreto prescreve que a recuperação deve ter por objetivo o retorno do sítio degradado a uma
forma de utilização, de acordo com um plano preestabelecido para o uso do solo, e que vise a
obtenção de uma estabilidade do meio ambiente.
A elaboração do plano de recuperação para sítios degradados segue de acordo com o
Termo de Referência fornecido pelo órgão ambiental competente. Os Termos de Referência,
como enfatizado por Absy (1995), são baseados em medidas generalistas presentes na
Resolução CONAMA n° 001/86 e elaborados pelo órgão de meio ambiente ou pelo
empreendedor, sendo normalmente esquecidas as interações entre estes e os grupos sociais.
De acordo com a autora, as dificuldades no estabelecimento das diretrizes do Termo de
Referência estão associadas à falta de informações adequadas e suficientes sobre o local em
que está situado o empreendimento e seu potencial modificador, à falta de participação de
outros órgãos no processo de elaboração do Termo, à falta de pessoal qualificado para realizar
esta elaboração sem o apoio externo, e à insuficiência de recursos materiais e financeiros para
realizar visitas ao local para coletar informações complementares.
36
O licenciamento ambiental ganhou tratamento mais específico com a Resolução
CONAMA n° 237 de 19 de dezembro de 1997, que conceituou Licenciamento Ambiental,
Licença Ambiental, Estudos Ambientais e Impacto Ambiental Regional. O Licenciamento
Ambiental é o procedimento administrativo em que o órgão ambiental licencia a localização,
a instalação, a ampliação e a operação de empreendimentos e atividades que utilizam os
recursos ambientais e que são consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras. A Licença
Ambiental é o ato administrativo em que o órgão ambiental estabelece as condições,
restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo agente explorador
para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades que utilizem dos
recursos ambientais. Estudos Ambientais são todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos
ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação da atividade
exploradora como subsídio para a análise da licença requerida (relatório ambiental, plano e
projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de
manejo, plano de recuperação de área degradada e análise preliminar de risco). Impacto
Ambiental Regional é todo e qualquer impacto ambiental que afete diretamente (área de
influência direta do projeto), no todo ou em parte, o território de dois ou mais Estados.
A Resolução n° 237/97 também estabelece quais são os empreendimentos sujeitos ao
licenciamento, quais os órgãos reguladores e expedidores de licença, bem como os tipos de
licença conforme o empreendimento e sua fase: a Licença Prévia – L.P., a Licença de
Instalação – L.I, e a Licença de Operação L.O. A Licença Prévia é concedida na fase
preliminar do planejamento do empreendimento e aprova a localização e concepção do
mesmo para atestar a viabilidade ambiental, e estabelece os requisitos básicos e
condicionantes a serem atendidos nas próximas fases da implementação. A Licença de
Instalação autoriza a instalação do empreendimento de acordo com as especificações contidas
nos planos, programas e projetos já aprovados, e analisa as medidas de controle ambiental e
37
os demais condicionantes. A Licença de Operação autoriza a instalação do empreendimento,
de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos já aprovados.
Em 1998 houve a sanção da Lei Federal n° 9.605 de 1998 para o aumento do controle
dos processos lesivos ao ambiente, a Lei de Crimes Ambientais. A Lei considera os processos
lesivos ao ambiente como crime e dispõe sobre sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas. No Art. 23 há a obrigação da recomposição do ambiente
degradado pelo infrator. A lei também prevê as penalidades necessárias àqueles que não
cumprirem as normas contidas em seu escopo. A regulamentação da Lei de Crimes
Ambientais veio com o Decreto n° 3.179 de 21 de setembro de 1999.
O empreendimento explorador dos recursos naturais, desta forma, ao se instalar em
uma região, precisa obedecer às normas determinadas pela Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei n° 6.938/81), pela Constituição de 1988, pela Lei de Crimes Ambientais (Lei
n° 9605/98) e pelo Decreto n° 97.507/89, e exercer suas atividades de acordo com as medidas
estabelecidas pelas Resoluções CONAMA n° 001/86, n° 009/87, n° 010/87 e n° 237/97.
Com a obrigatoriedade dos Planos de Recuperação de Áreas Degradadas (PRADs) a
partir da Constituição de 1988, as Secretarias de Meio Ambiente passaram a ser os órgãos
responsáveis pela fiscalização das atividades de exploração e pelo auxílio às empresas no
cumprimento e estabelecimento de parâmetros a serem seguidos na elaboração e
implementação destes PRADs.
Um empreendimento, ao iniciar suas atividades de exploração de recursos minerais, dá
encaminhamento à elaboração de um Plano de Recuperação das Áreas para a obtenção de sua
Licença de Operação. A mineradora então contrata uma outra empresa ou organização para
realizar a elaboração do PRAD e a recuperação do local, que poderá ser feita ao término das
38
atividades exploratórias27. A contratada solicita o Termo de Referência (TR) junto ao órgão
ambiental competente para poder elaborar o documento. Ao fim da elaboração do plano este é
remetido ao órgão ambiental, ao Ministério Público e à empresa de exploração para que seja
analisado e aprovado. Caso este seja aprovado são iniciados os procedimentos descritos no
PRAD proposto, e o órgão ambiental procede a fiscalização da execução em períodos de
tempo determinados.
Os Planos de Recuperação de Áreas Degradadas, por vezes, seja por deficiência
técnica ou de insumos para a realização dos estudos, terminam por se mostrar excessivamente
superficiais quanto aos diagnósticos ambientais e aos métodos propostos para a recuperação.
De acordo com Griffith (apud ALMEIDA, R. 2002) as práticas de recuperação a serem
estabelecidas no PRAD precisam estar fundamentadas em quatro princípios: a) a visualização
da recuperação como meta, para que não sejam tomadas medidas ineficazes ao se pensar
somente o lado econômico; b) interdisciplinaridade; c) conhecimento dos princípios básicos e
técnicas de recuperação, e o estabelecimento de uma seqüência lógica de planejamento e; d)
avaliação e reavaliação das práticas de recuperação escolhidas no decorrer de sua execução,
conforme a reação que se observa no ambiente.
Para Almeida, R. (2002), um Plano de Recuperação de Áreas Degradadas precisa ser
um planejamento estratégico, com medidas que minimizem os impactos negativos causados
pela atividade e enfoquem o uso futuro da área. Além disso, conforme Almeida, D. (2000), o
desempenho e eficácia dos planos estão ligados à ênfase dada aos aspectos econômicos,
sociais, legais e ambientais. O aspecto econômico está ligado aos custos da recuperação e a
uma futura geração de receitas. O aspecto social é fundamental para agregar valores aos
sistemas de recuperação propostos. O aspecto legal compreende a adequação do modelo à
27 O mais recomendado nos estudos é que a recuperação se proceda paralelamente às atividades de extração
mineral, e de fato alguns empreendimentos já o têm feito. Grande parte dos empreendimentos, no entanto,
somente os executam (quando executam) ao término de suas atividades, com o fechamento da mina.
39
legislação (federal, estadual, municipal). O aspecto ambiental é o mais importante, pois o
objetivo principal não deixa de ser a recomposição do ecossistema degradado.
A escolha das medidas de recuperação das áreas degradadas para o PRAD precisa
enfocar práticas coerentes que possuam uma seqüência lógica e que busquem o contínuo
aperfeiçoamento, levando em conta os atores envolvidos e sua importância como instrumento
de políticas públicas. Sánchez (apud ALMEIDA, R. 2002) menciona elementos que um
projeto de recuperação em áreas degradadas por atividades de extração mineral deve envolver,
são eles:
“- definição dos objetivos de recuperação e do(s) uso(s) futuro(s) possíveis ou
desejáveis da área;
- uma reconstituição do histórico de degradação da área, incluindo, se possível,
informações sobre a degradação já havida antes da instalação da mina;
- diagnóstico ambiental das áreas degradadas e do seu entorno;
- estudo de alternativas de recuperação, de acordo com as alternativas de lavra;
- descrição das técnicas e procedimentos a serem empregados nos trabalhos de
recuperação;
- cronograma desses trabalhos;
- discussão sobres as lacunas de conhecimento ou de informação (sobre diagnóstico
ambiental, sobre a viabilidade das técnicas de recuperação, etc.) e;
- plano de monitoramento ambiental”. (ALMEIDA, R., 2002, p. 23).
Estes fatores, quando associados, contribuem para um maior controle sobre as técnicas e
procedimentos a serem escolhidos, bem como para decisões mais acertadas e projetos menos
simplistas e mais voltados às características locais do ambiente e aos interesses comuns
envolvidos no processo.
1.5 RECUPERAÇÃO AMBIENTAL
O grande desafio que envolve as regiões onde se deu a extração mineral, de acordo
com Bitar (1999), é recuperar e tornar produtivas as regiões novamente. O autor considera os
sistemas degradados como insustentáveis e afirma ser somente por meio da recuperação ou da
40
reabilitação que se elevariam à condição de potencialmente sustentáveis os ambientes
construídos, cultivados ou modificados.
A recuperação ambiental de áreas degradadas é a estratégia que possibilita um
aumento no padrão de vida local; padrão este associado ao aumento do potencial de recursos
passíveis de utilização. As regiões quando continuamente degradadas e não recuperadas
perdem grande parte de seu potencial para fornecer recursos naturais futuramente
(RICKLEFS, 2003). As atividades de recuperação funcionam como fatores chave na busca da
sustentabilidade local.
A sustentabilidade de um empreendimento, de uma atividade ou de um ecossistema28,
está diretamente relacionada à capacidade de se conservar e de se manter mais ou menos
constante ou estável por um longo período de tempo29. Esta busca parte da escolha de
estratégias de exploração que possam conciliar benefícios comuns ao longo prazo, tanto ao
ambiente quanto ao homem. O planejamento destas estratégias, conforme Sachs (1986),
precisa de três condições para se tornar operacional: o grande conhecimento das culturas e dos
ecossistemas, bem como daquilo que as diferentes culturas aprenderam sobre seus
ecossistemas; o envolvimento dos cidadãos nesta atividade; e o arcabouço institucional, que é
o estabelecimento de um esquema de mercado que ofereça termos de troca relativamente
justos e proporcione acesso a certos recursos críticos impossíveis de obter localmente.
O conhecimento das culturas e dos ecossistemas, mencionado por Sachs (1986)
compreende o entendimento do funcionamento e da importância de cada um destes. Sabendose
que um ecossistema garante sua viabilidade pela manutenção de sua funcionalidade, a sua
sobrevivência está relacionada à capacidade de dar continuidade aos mecanismos que
conferem o estabelecimento de espécies animais e vegetais no local, assim como a sucessão
28 Ecossistemas são também chamados sistemas ecológicos. O seu conceito, conforme Ricklefs (2003) e Odum
(1988), envolve os animais e plantas, junto com os fatores físicos no seu entorno.
29 Conceito de Sustentabilidade extraído do dicionário Aurélio. Ferreira, A. B. H. (1999).
41
das gerações destas espécies. A diversidade de espécies de um local é um dos fatores que
confere esta estabilização de funções a um ecossistema (RICKLEFS, 2003).
A geração de elevados passivos ambientais por atividades exploratórias (que visam o
desenvolvimento) pode comprometer seriamente esta manutenção de funcionalidade do meio.
A recuperação ambiental pode desempenhar o papel de garantir ao local degradado a
manutenção de sua capacidade funcional diante das alterações ocorridas. A recuperação é o
mecanismo que proporciona a melhora das condições relacionadas ao meio ambiente e à
saúde e bem-estar humano.
A população local, as instituições, o agente explorador e o poder público possuem o
poder de decisão diante de muitas escolhas de caráter ambiental, e suas influências são
decisivas para pensar a recuperação como garantia de um direcionamento para o futuro da
área. O estudo para a recuperação ambiental de um local parte da análise de cada situação
particular e do comprometimento dos atores, principalmente da população, com esta questão,
como forma de escolher medidas mais democráticas e que enfoquem os interesses de todas as
partes envolvidas e não somente os interesses particulares30. A compreensão aprofundada dos
interesses e papéis destes atores auxilia no planejamento de estratégias de recuperação que
conciliem estes diferentes interesses.
Os estudos da ecologia trazem elucidações sobre os mecanismos de funcionamento
dos sistemas ecológicos e as estratégias mais adequadas para a recuperação dos diferentes
locais. As medidas de recuperação escolhidas a serem implementadas em um programa
podem buscar a associação entre os interesses locais e as necessidades do ambiente a ser
recuperado, como forma de aumentar as chances de êxito na implementação de um projeto.
30 Cada local possui suas particularidades, tanto no que confere às características do meio ambiente quanto às
características sócio-econômicas, culturais, políticas e institucionais. Cada ator também desempenhará um papel
diferente conforme a participação que possua e a importância que receba no local. A situação terá diferentes
contornos de acordo com o desenrolar das decisões de cada ator.
42
A recuperação de um ambiente requer que sejam fornecidos meios para que este
mantenha sua continuidade, ou se proceda a sucessão ecológica. Quando este
desenvolvimento não é interrompido por forças externas, a sucessão é bastante direcional e,
portanto, previsível (ODUM, 1988). Segundo Odum (1988), a degradação e a alteração de
ambientes comprometem em parte esta sucessão natural31.
Os ecossistemas possuem mecanismos que lhes permitem “tolerar” certas alterações,
quando as modificações excedem em muito esta capacidade mostra-se necessária a
intervenção por meio da recuperação, para que se reduza o período de tempo que o local
necessitaria para voltar a se manter relativamente estável32. A estabilidade dos ecossistemas,
no entanto, não está relacionada à presença de florestas, à diversidade de espécies vegetais e
animais, ou a características associadas à sobrevivência e ao bem-estar do homem, visto que
mesmo em condições inadequadas para alguns organismos o meio pode estar estável em seu
funcionamento. De certa forma, como lembra Pasqual (1995), os ecossistemas e o planeta, por
si, sempre tenderão a reagir com as modificações ocasionadas e a buscar uma nova forma de
equilíbrio ou estabilidade. Contudo, o autor questiona em quanto tempo esta nova fase pode
ser alcançada e se poderá ser adequada à sobrevivência e manutenção do homem na terra.
Realizar a recuperação reduziria o nível de degradação, evitaria a formação de áreas estéreis33
e proporcionaria a criação de alternativas produtivas ao homem, quando associada a
estratégias econômicas.
31Sucessão ecológica ou sucessão natural é como se denomina freqüentemente o processo de desenvolvimento
dos ecossistemas (sistemas ecológicos). A sucessão natural está relacionada aos grupos de organismos que se
substituem ao longo do tempo, até um posterior momento de “equilíbrio” denominado estágio clímax. Os grupos
são diferentes quanto às adaptações e funções em cada momento. O estudo da sucessão natural auxilia os
processos de recuperação ambiental pois é ela que vai esclarecer o momento em que se apresenta o local e que
mecanismos poderão ser utilizados para dar continuidade às etapas até o estado de equilíbrio (clímax). Ver
Odum E. P. (1988).
32 É necessário lembrar que o meio ambiente tende sempre a se recuperar das alterações negativas a que lhe
foram impostas, mais cedo ou mais tarde. A recuperação reduziria este período (de centenas a dezenas de anos),
contudo, o posterior estado de equilíbrio dificilmente é igual ao anterior.
33 Esta conceituação aqui se refere tão somente às áreas impactadas e abandonadas que ainda precisarão de muito
tempo para se restabelecer novamente, e que deixam falhas notórias na paisagem.
43
Conforme Junk (1995), esta capacidade de resistir aos impactos humanos de
depredação e degradação, e suportar sustentadamente um número máximo de população sob
um sistema de produção é denominada de capacidade de suporte, e pode ser influenciada por
diferentes fatores: fatores políticos, sócio-econômicos, culturais e tecnológicos; e fatores
relacionados ao clima, solos, geomorfologia, e ao conjunto de espécies animais e vegetais.
Os responsáveis pela elaboração de um projeto de recuperação de áreas degradadas
precisam estar atentos aos fatores que influenciam a capacidade de suporte do ambiente e
designar que tipo de recuperação será realizado. Almeida, D. (2000) considera o termo
‘recuperação’ muito genérico, por ser utilizado de diferentes maneiras dependendo do
contexto, e o subdivide em reabilitação, restauração e criação. A reabilitação é o conjunto de
tratamentos que buscam a recuperação de uma ou mais funções do ecossistema e que pode ser
basicamente econômico e/ou ambiental. A restauração é o conjunto de tratamentos que visam
recuperar a forma original, a dinâmica e as interações biológicas. A criação é a formação de
um novo ecossistema, visando exclusivamente a recuperação de funções da floresta.
Almeida, D. (2000) ainda divide o tema por forma e função: A restauração da forma
inclui operações que objetivam recuperar características originais do ecossistema, como a
composição florística e a diversidade de espécies; e a recuperação da função inclui operações
que objetivam recuperar os serviços prestados pelo ecossistema, como a água, a fauna e a
conservação dos solos. Estas definições têm importância dentro dos planos de recuperação de
áreas degradadas como forma de norteamento às atividades.
Barreto (2001), ao falar sobre a recuperação das áreas degradadas pela exploração
mineral, lembra um ponto considerado polêmico na visão ambiental, o de que a recuperação
seria impossível partindo do princípio da reconstituição, pois uma vez que o minério foi
retirado não poderá ser reposto. A autora argumenta que atualmente a grande parte dos
empreendimentos dedicados à extração mineral tem se preocupado de alguma forma com a
44
recuperação das áreas degradadas, sendo estas recuperações consideradas com êxito também
em sua maioria. O desafio seria conter a posterior ocupação desordenada destas áreas.
Almeida, D. (2000) chama atenção para um tipo de ‘recuperação’ frequentemente
realizado e que objetiva a rápida cobertura vegetal do local alterado, por meio do plantio de
gramíneas (espécies rasteiras) e árvores que são consideradas resistentes e que têm origem em
ecossistemas diferentes. Este procedimento faz com que sejam criados ecossistemas distintos
no local degradado e que as espécies nativas tenham de reagir e se adaptar às novas
características34. Algumas empresas, como a ICOMI S/A que explorou manganês no Amapá,
executaram este tipo de estratégia, plantando espécies resistentes como a Acácia (Acacia
mangium Willd.) para que o local adquirisse rapidamente a aparência de “floresta” sem,
contudo, se preocupar com fatores como a toxicidade do solo, a fauna e flora local e a
contaminação das espécies e do homem.
A recuperação de áreas degradadas pode se direcionar ao estabelecimento sistemas
agroflorestais. Almeida, D. (2000) conceitua os sistemas agroflorestais como aqueles onde a
produção agrícola é associada à preservação da floresta, intercalando-se a esta. Para o autor,
criar vastos campos agrícolas também pode prejudicar o ambiente, além de conferir maior
sensibilidade do cultivo às pragas, que possuem facilidade para se estabelecer em culturas
homogêneas.
De acordo com Silva (2002) os sistemas agroflorestais são uma forma de uso da terra
em que estão associados os cultivos de árvores/arbustos nativos a plantas de uso comercial
e/ou animais, de tal modo que se obtêm duplamente benefícios ecológicos e econômicos desta
interação. A autora enfatiza que, apesar dos diversos tipos de sistemas agroflorestais, a
diversidade dos elementos biológicos envolvidos é sempre maior do que nas monoculturas.
34 A degradação ambiental pode destruir populações de diferentes espécies e selecionar aqueles indivíduos mais
resistentes. Com a implantação de ecossistemas totalmente distintos do original pode haver uma pressão ainda
maior para a sobrevivência das espécies locais.
45
Estes sistemas são alternativas à monocultura agrícola “por serem capazes de manter a
fertilidade dos solos e a sustentabilidade” (SILVA, 2002, p. 26).
Para Yana & Weinert (2002) esta manutenção de estrutura e dinâmica das florestas
naturais pode combinar espécies aproveitáveis ao homem, como árvores frutíferas (banana,
cacau, caju, palmeiras) e de potencial madeireiro, com as de essências nativas. O sucesso dos
sistemas agroflorestais depende da capacidade de replicar os processos naturais de
regeneração, e de sua associação ao conhecimento em profundidade das espécies a serem
utilizadas nas culturas e de suas adaptações e exigências quanto às características do solo e
luminosidade, de forma a serem plantadas no local mais adequado para o seu crescimento
(MILZ, 1998).
Os sistemas agroflorestais possuem uma significativa vantagem ao se observar as
características de outros sistemas de produção, como a agricultura e a pecuária. Os duplos
benefícios gerados pelo sistema (vantagens ao homem e à natureza) podem representar uma
das escolhas entre as estratégias de recuperação atualmente existentes, bem como um
mecanismo para o prosseguimento do desenvolvimento local após o término das atividades de
exploração mineral, ou o fechamento de uma mina.
A silvicultura representa outra alternativa para a recuperação produtiva e, segundo
Taylor (1969), se ocupa dos métodos naturais e artificiais de regeneração da floresta, inclusive
seus melhoramentos. Esta prática envolve conhecimentos sobre as exigências das espécies
florestais e sua manipulação com o intuito de incrementar o rendimento econômico das
árvores aliado ao desenvolvimento sustentável. Os sistemas silviculturais estão relacionados
às espécies comerciais, com todas as operações culturais aplicadas à floresta no decorrer de
sua vida.
Almeida, D. (2000) enfatiza também o desenho de “Sistemas Florestais de Uso
Múltiplo” como modelos eficazes de recuperação ambiental de áreas degradadas, onde se
46
contemplam, além dos aspectos ambientais, as funções sociais e econômicas (coleta de
produtos florestais madeireiros e não-madeireiros) da futura floresta a ser formada. Estes
sistemas não possuem o componente agrícola ou animal (restrito a floresta e animais
silvestres), são menos intensivos que os sistemas agroflorestais e ainda incorporam variáveis
sócio-econômicas e ecológicas.
Existem atualmente variadas estratégias de recuperação ambiental, e sua escolha pode
representar um grande passo para as decisões sobre o futuro da área. A compreensão da
estrutura sócio-econômica local, das necessidades produtivas e da viabilidade de
implementação dos projetos de recuperação permitirão o desenho de planos de recuperação
mais eficazes.
1.6 ESTRATÉGIAS DE RECUPERAÇÃO
De acordo com Ferraz (1992), a recuperação de uma área degradada depende dos tipos
de alteração sofrida. O autor enfatiza que na Amazônia brasileira as alterações têm relação
com a exposição do solo (devido à retirada da vegetação) e a diminuição dos estoques de
matéria orgânica e nutrientes minerais nos mesmos. A retirada da floresta com o auxilio de
máquinas, como é o caso da mineração, ocasiona a compactação do solo e numerosos
impactos negativos.
O conhecimento do histórico das perturbações da área estudada é importante antes de
desenvolver estratégias de recuperação, pois auxilia no delineamento das mesmas
(ALMEIDA, D. 2000). As estratégias de recuperação e os reflorestamentos de áreas
degradadas por atividades de exploração mineral, conforme Salomão et al., (2002), norteiamse
pelo paradigma da restauração da paisagem florestal no menor período de tempo possível,
ao menor custo e de modo a propiciar o máximo de acumulação de biomassa aliado à alta
47
biodiversidade35. Os resultados dos projetos de recuperação, para o autor, consequentemente
devem estar associados a benefícios sociais e ecológicos, seja pela instalação de sistemas
agroflorestais ou pela conservação ambiental (SALOMÃO et al., 2002). Este paradigma da
realização da recuperação em um menor tempo e com custos reduzidos, no entanto, precisa
ser gerenciado para que estes fatores não prejudiquem as metas de aumento na qualidade do
meio ambiente36.
As técnicas e procedimentos utilizados na recuperação de áreas degradadas já foram
descritos por autores como Almeida, D. (2000), Almeida, R. (2002), Martins (2001) e Griffith
(1994). As atividades executadas para a recuperação ambiental envolvem procedimentos
geotécnicos, de recuperação dos recursos hídricos, edáficos e de revegetação.
1.6.1 Procedimentos Geotécnicos
De acordo com Almeida, R. (2002), a recuperação do meio físico antecede os demais
procedimentos, tem papel fundamental para a estabilização e não deve ser negligenciada, pois
é esta que vai dar sustentação às atividades de revegetação no local. As práticas estariam
relacionadas ao controle da erosão, à estabilização de taludes e à alteração da topografia.
A erosão é o processo no qual as partículas de rocha e solo são deslocadas de sua área
original, transportadas e depositadas em outro local. Os principais agentes deste processo são
a água, o vento, a temperatura e os agentes biológicos. A erosão natural é extremamente lenta,
mas aquela produzida pelas atividades do homem torna-se bastante acelerada (GILPIN, 1992).
Quando o agente da erosão é a água esta é denominada erosão hídrica, e quando o agente é o
vento denomina-se erosão eólica. Cada processo erosivo envolve diferentes mecanismos para
seu controle (SALOMÃO, 1999; VIEIRA et al., 2000).
35 A biomassa está relacionada aos indivíduos (árvores) de grande porte, e a biodiversidade à variedade de
espécies presente.
36 Muitas vezes o meio ambiente alterado precisa de mais tempo para se recuperar do que aquele que lhe é
imposto, e os custos alocados para as tarefas não são suficientes para realizá-las totalmente.
48
O controle da erosão hídrica pode ser feito pela construção de canaletas, caixas de
drenagem e redutores de velocidade37, visando desviar a concentração do fluxo d’água. A rede
de drenagem deve ser construída contornando vias de acesso e áreas periféricas de
empreendimentos que possam existir no local (ALMEIDA, D. 2000; ALMEIDA, R. 2002).
A erosão eólica ocorre normalmente em regiões planas, de pouca chuva e com
vegetação escassa, o que facilita o rolamento das partículas pela ação do vento e o
empobrecimento do solo. A vegetação ao ser removida ou significativamente reduzida por
esta erosão pode representar um sério problema para a qualidade ambiental ou a manutenção
de atividades de reflorestamento. O controle desta erosão não pode ser feito somente com a
cobertura do terreno, é necessário fazer a construção de cortinas de vegetação ou quebraventos
(barreiras para o vento feitas com árvores) (VIEIRA et al., 2000).
Os taludes são locais de elevada declividade e por vezes com riscos de
desmoronamento. A estabilização de taludes, conforme Almeida, D. (2000) e Almeida, R.
(2002), deve trabalhar o grau de declividade (que deve ser de no máximo 1:1,5) para manter o
terreno estável e facilitar a posterior revegetação. As espécies arbóreas não são recomendáveis
para a recuperação destes terrenos e sim a utilização de herbáceas (plantas arbustivas) e
gramíneas que conferirão maior estabilidade; a hidrossemeadura e a utilização de telas
naturais para conter a declividade também têm se mostrado bastante eficazes.
A alteração na topografia diz respeito à modificação na estrutura do terreno. As
atividades de extração mineral a céu aberto modificam sensivelmente a topografia original, e
para recuperar posteriormente o local serão necessárias novas modificações na topografia para
aumentar a estabilidade. Almeida, R. (2002) enfatiza que entre os objetivos da reconstrução
topográfica devem estar a criação de plataformas estáveis no terreno, o manejo da água, o
controle da erosão etc., sendo considerados elementos da paisagem como declividades,
37 Para reduzir a velocidade da água podem ser utilizados sacos de aniagem, paliçadas ou outros obstáculos.
49
planícies e bacias de drenagem. “O relevo final previsto, também, deverá inserir a área dentro
dos objetivos de uso pretendidos, assim como prover uma base adequada para o crescimento
da vegetação” (ALMEIDA, R., 2002, p. 32).
A síntese dos procedimentos geotécnicos para recuperação de áreas degradadas pode
ser observada no Quadro 01.
Quadro 01 – Procedimentos geotécnicos
Fonte: Elaborado a partir dos dados de Almeida D. (2000), Vieira et al. (2000) e Almeida R. (2002).
1.6.2 Procedimentos para Recuperação dos Recursos Hídricos
As atividades de exploração mineral podem comprometer os recursos hídricos com o
despejo dos rejeitos da exploração. Estes rejeitos são normalmente ricos em substâncias
tóxicas usadas pela empresa no beneficiamento do minério. A extração de ouro, como
exemplo, pode lançar ao meio ambiente o cianeto ou o mercúrio (dependendo do
beneficiamento) e substâncias tóxicas que causam graves problemas ao homem e animais e
podem levar à morte. Oliveira & Luz (2001) enfatizam a contribuição das atividades de lavra
50
e processamento mineral para a poluição das águas superficiais e subterrâneas, caso não haja
um controle rigoroso das operações envolvidas.
“As operações de lavra geralmente envolvem grandes volumes de água, que se
torna responsável pelo transporte de contaminantes (ex: óleos, reagentes químicos)
gerados nas etapas de perfuração, desmonte e transporte do minério. Em geral, essa
água proveniente da lavra é descartada na bacia de rejeitos, sendo que, em alguns
casos pode ser utilizada nas operações de processamento mineral. Independente da
sua finalidade, essa água deve ser tratada previamente para remoção dos
contaminantes”. (Oliveira & Luz, 2001, p. 11).
O gerenciamento dos recursos hídricos envolve componentes multidisciplinares, pois
precisa atender diferentes objetivos, sejam econômicos, ambientais ou sociais. Os
componentes legais e econômicos objetivam a manutenção da qualidade da água, os
componentes sociais e ambientais envolvem a necessidade destes a ser atendida (OLIVEIRA
& LUZ, 2001).
Mota (1995) fala a respeito das medidas de controle da poluição dos recursos hídricos
e divide-as em medidas de caráter corretivo e de caráter preventivo. As medidas de caráter
corretivo visam corrigir uma situação já existente por meio da melhora da qualidade dos
recursos. As medidas de caráter preventivo são utilizadas para evitar ou minimizar o
lançamento de poluentes nos recursos hídricos, e têm tido maior ênfase nos programas de
gestão mais recentes por serem menos onerosas e eficientes.
Os exemplos de medidas corretivas, conforme Mota (1995), são:
- Implantação de sistemas de tratamento de esgoto nas fontes poluidoras;
- Medidas aplicadas ao controle do meio ambiente:
- Eliminação de microorganismos patogênicos (aplicação de desinfetantes, como
o cloro);
- Remoção de algas (aplicação de algicidas, como o sulfato de cobre, cloro,
rosinaminas etc.);
- Combate a insetos, crustáceos e moluscos (aplicação de cloro, moluscocidas e
inseticidas);
51
- Remoção do lodo do fundo de corpos d’água por sistemas de dragagem;
- Aeração da água para aumentar o oxigênio dissolvido e reduzir sua demanda;
- Instalação de estações de tratamento de água.
Os exemplos de medidas preventivas, conforme Mota (1995), são:
- Implantação de sistemas de coleta e tratamento de esgotos;
- Planejamento do uso e ocupação do solo visando a preservação dos recursos
hídricos;
- Controle da erosão, do escoamento superficial e da vegetação;
- Controle da qualidade de águas;
- Avaliação prévia de impactos ambientais.
A síntese dos procedimentos para a recuperação dos recursos hídricos pode ser
observada no Quadro 02.
Quadro 02 – Procedimentos para a recuperação dos recursos hídricos
PROCEDIMENTOS PARA RECUPERAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS
TIPOS DE ATIVIDADES MEDIDAS ADOTADAS PARA O CONTROLE DOS IMPACTOS NEGATIVOS
Corretivas
- Criação de sistema de tratamento de esgoto
- Controle do meio ambiente
- Criação de estações de tratamento de água
- Eliminação de microorganismos patogênicos
- Remoção de algas
- Combate a insetos, crustáceos e moluscos
- Remoção de lodo do fundo de corpos d’água
- Aeração da água
Preventivas
- Criação de sistema de coleta e tratamento de esgotos
- Planejamento do uso e ocupação do solo
- Controle da erosão, do escoamento superficial e da vegetação
- Controle da qualidade das águas
- Avaliação prévia de impactos ambientais
Fonte: Elaborado a partir dos dados de Mota (1995).
52
O tratamento dos recursos hídricos em locais de extração mineral, no entanto, envolve
basicamente duas etapas: a remoção dos contaminantes e a separação sólido-água
(OLIVEIRA & LUZ, 2001). Ademais, o gerenciamento dos recursos hídricos deve levar em
conta a atividade que foi ou que está sendo exercida no local, quais as atividades impactantes
e quais os atingidos pelos impactos negativos. Conforme a atividade e o local serão adotadas
medidas específicas. A extração mineral possui muitas particularidades a respeito de seus
efeitos e, portanto, são necessários estudos minuciosos das características do solo, dos
recursos hídricos, da vegetação, da fauna e da população local para conhecer o espectro de
uma possível contaminação e das medidas mitigadoras a serem escolhidas e implementadas.
1.6.3 Procedimentos Edáficos
Os procedimentos edáficos têm por objetivo a realização de medidas de recuperação
da qualidade dos solos. As atividades de extração mineral podem retirar as camadas
superficiais do solo (decapeamento) e compactá-lo com a locomoção de tratores e máquinas.
O solo se torna pobre em nutrientes, outros elementos se acumulam e alguns tóxicos também
são disponibilizados, dependendo da atividade de exploração. O estabelecimento de variadas
espécies de plantas neste solo exige que este seja tratado antes, para que se propiciem as
condições necessárias para a sobrevivência daquelas.
Primeiramente é necessário conhecer o real estado do solo que se deseja recuperar,
para isso poderão ser feitas amostragens com o intuito de avaliar as propriedades químicas,
físicas e biológicas que nortearão as estratégias a serem tomadas. Os fatores químicos estão
relacionados aos elementos químicos presentes (Cálcio, Potássio, Nitrogênio, Fósforo,
Magnésio etc.) e que podem ser eventualmente reduzidos ou concentrados pelas atividades
humanas desenvolvidas sobre os solos (SALOMÃO, 1999). Os fatores físicos estão
53
relacionados a características como textura38, estrutura39, permeabilidade40 e densidade41
(SALOMÃO, 1999). Os fatores biológicos, de acordo com Almeida, R. (2002) estão
relacionados à presença dos animais e microorganismos no solo, que são responsáveis pela
decomposição de matéria orgânica e a formação de húmus42, pela aeração e pela melhora da
estrutura do mesmo (devido à escavação e revolvimento do solo), e pela contribuição na
disponibilização dos nutrientes para as plantas (oriundos das fezes de animais e da atuação de
microorganismos).
Almeida, R. (2002) enumera uma seqüência de procedimentos que devem ser
efetuados quando se pensa na recuperação do solo de áreas degradadas por atividades de
extração mineral de areia, mas que naturalmente podem ser expandidos a várias atividades de
extração mineral:
- Planejamento: Levantamento das características dos solos do entorno e do local
para determinar as capacidades primitivas, a capacidade de uso e o tipo de
vegetação. Esta etapa serve de referência para as etapas seguintes da recuperação.
É importante estabelecer o destino futuro dos solos a serem recuperados para que
também sejam estabelecidas as técnicas de manejo correto.
- Retirada do solo orgânico e decapeamento: Antes do início das atividades de
exploração é recomendável que seja retirada a vegetação e aproveitado todo aquele
material que possa funcionar posteriormente como agente de propagação das
plantas e dos animais, assim como abrigo para estes últimos. É retirada também a
38 A textura do solo diz respeito ao tamanho das partículas e determina sua porosidade, influencia na capacidade
de infiltração e de absorção da água da chuva ou contaminantes (SALOMÃO 1999).
39 A estrutura é modo como as partículas do solo se arranjam, influencia de igual modo na capacidade de
infiltração e absorção das águas, bem como na capacidade das partículas do solo serem arrastadas por enxurradas
(SALOMÃO, 1999).
40 A permeabilidade está relacionada à porosidade. Solos de maior porosidade são mais permeáveis às águas
(SALOMÃO, 1999).
41 A densidade é a relação entre a massa total e o volume do solo. É inversamente proporcional à porosidade e à
permeabilidade, pois quanto mais compacto maior a densidade e menor a porosidade, e mais erodível se torna o
solo (SALOMÃO, 1999).
42 Componente orgânico complexo do solo, resultante da decomposição de tecidos vegetais e animais, e de
grande importância para o crescimento das plantas (GILPIN, 1992, p.84).
54
camada superficial do solo, que possui elevados índices de matéria orgânica e
nutrientes, e a camada argilosa do solo, que poderá ser posteriormente aproveitada
em diferentes fins.
- Estocagem do solo: A estocagem do solo é feita logo após a sua remoção, podendo
ser armazenado em cordões ou leiras com 1,5m de altura no máximo, ou em pilhas
individuais de 5 a 8m³. O material não pode receber a luz direta do sol, ou haverá a
morte dos microorganismos presentes. O período de armazenagem também não
deve exceder dois anos.
- Tratos na superfície final: Diz respeito às práticas geotécnicas necessárias a serem
realizadas.
- Aplicação de fertilizantes ou corretivos: Após a realização de amostragens para a
verificação da qualidade física e química do solo, procede-se a adubação
específica de acordo com a área a ser recuperada.
Os principais métodos de adubação e manejo de solos utilizados foram descritos por
Salomão (1999) e Vieira et al. (2000), entre eles a adubação mineral, a adubação orgânica, a
adubação verde, a calagem, a cobertura do solo, o controle do fogo e o controle das ervas
daninhas.
- Adubação mineral: Constitui-se na aplicação dos elementos essenciais ao
desenvolvimento das plantas, sob a forma de fertilizantes. Os principais são o
nitrogênio, o fósforo e o potássio, e os secundários são o cálcio, o magnésio, o
enxofre, o boro, o cobre, o zinco e o ferro. Estes elementos proporcionam a
manutenção e restauração da fertilidade do solo, e o aumento da produtividade e
da cobertura vegetal, com a posterior proteção do solo.
55
- Adubação orgânica: é uma estratégia de contorno aos custos elevados da adubação
mineral. Consiste na incorporação de matéria orgânica no solo pela aplicação de
produtos como o esterco e compostos orgânicos.
- Adubação verde: É um método no qual se evitam as perdas com estocagem de
matéria orgânica e a falta de esterco suficiente em lavouras. Consiste em se plantar
periodicamente leguminosas43 no terreno, e quando estas chegam na fase de
florescimento são cortadas com arado e incorporadas ao solo44. O húmus
produzido destes vegetais enterrados melhora as condições físicas do solo pela
estruturação e aumento da porosidade.
- Calagem: Consiste em um processo de correção da acidez do solo pela aplicação
de cálcio. Os solos ácidos dificultam o aproveitamento de nutrientes pelas plantas
e o desenvolvimento de alguns microorganismos essenciais para as condições do
solo.
- Cobertura do solo: A característica mais importante da cobertura do solo é a
capacidade de retenção da água e sua proteção, principalmente da ação das chuvas
e da erosão. Para realizar esta atividade pode ser utilizada uma cobertura “viva” ou
uma cobertura “morta”. A primeira diz respeito ao plantio de vegetais para a
proteção do solo, tais como leguminosas e gramíneas, e apresentam grande
vantagem na contribuição para a matéria orgânica e estimulação de processos
químicos e biológicos. A segunda diz respeito à utilização de capins, palhas,
cascas, plásticos etc. para a cobertura do solo, e contribui para a diminuição da
erosão, o aumento da infiltração da água no solo, a proteção da ação das chuvas,
43 As plantas da família das leguminosas são as mais indicadas porque além de incorporarem matéria orgânica ao
solo, possuem bactérias fixadoras de nutrientes (VIERA et al., 2000).
44 Podem ser utilizados outros vegetais para a adubação verde, desde que produzam em pouco tempo grande
quantidade de “massa verde”. Ver Vieira et al. (2000).
56
do escoamento superficial e do vento, evita o superaquecimento do solo e inibe o
desenvolvimento de ervas daninhas.
- Controle do fogo: O fogo é uma prática fácil e barata para limpar uma área recémderrubada,
mas degrada os solos com o tempo. O fogo destrói a matéria orgânica,
o nitrogênio presente e a organização das partículas existentes no solo, além de
diminuir a capacidade de absorção e retenção da água. O controle do fogo é
necessário para aumentar a capacidade dos solos.
- Controle das ervas daninhas: As ervas daninhas exercem competição por
nutrientes ou pela água com as demais culturas existentes, prejudicando-as. Para
este controle podem ser necessárias até seis capinas, porém deve-se ter o cuidado
para não prejudicar as raízes das outras plantas, o que pode atrasar seu crescimento
e época de colheita. Podem ser utilizados alguns herbicidas, ou uma cobertura
morta durante a época seca e uma cobertura viva durante a época chuvosa.
A síntese dos procedimentos edáficos para a recuperação de áreas degradadas pode ser
observada no Quadro 03.
57
Quadro 03 – Procedimentos edáficos
1.6.4 Procedimentos de Revegetação
O último procedimento de recuperação de áreas degradadas diz respeito às praticas de
revegetação do local. Para que a atividade de recuperação tenha êxito é preciso estar atento a
alguns detalhes, não basta reflorestar, é necessário avaliar as espécies a serem usadas, o tipo
de revegetação a ser utilizado, e as técnicas de recuperação e de plantio a serem escolhidas.
Vários métodos de revegetação já foram estudados e analisados quanto às
possibilidades de implementação em áreas degradadas, entre eles é possível mencionar a
regeneração natural, o reflorestamento homogêneo, os reflorestamentos mistos, os
reflorestamentos ao acaso, os reflorestamentos sucessionais e as ilhas vegetativas
(ALMEIDA, R. 2002; SEITZ, 1994; MARTINS, 2001; ALMEIDA, D. 2000).
58
- Regeneração Natural.
O ambiente pode se recuperar por meio de uma regeneração natural, sem o auxilio
do homem. Este método pode ser utilizado somente em ecossistemas que foram pouco
alterados e ainda possuem elevada capacidade de se recuperar por si dos efeitos
negativos de uma atividade (ALMEIDA, R. 2002). Segundo Seitz (1994), o tempo
necessário para esta regeneração dependerá do grau de degradação.
Em áreas degradadas por atividades de extração mineral a regeneração natural
poderia levar de dezenas a centenas de anos dependendo do local e do tamanho da área
degradada, e ao se deixar uma área degradada por tão extenso período pode-se perder
pela não-utilização de seu potencial de recursos naturais e, por vezes, mantê-la como
fonte de contaminação do homem, animais e vegetais. Valer-se de estratégias de
recuperação, neste caso, representa uma ferramenta para melhorar a qualidade do
ambiente e desenvolver futuramente uma atividade economicamente produtiva.
- Reflorestamento homogêneo.
Este modelo deve ser usado em situações específicas, como na presença de erosão
ou em terreno acidentado, com a finalidade de conter ou reduzir estes processos,
proporcionar a rápida cobertura do solo e diminuir sua degradação (MARTINS, 2001).
A princípio seria mais interessante escolher espécies agressivas que possam cobrir e
dar proteção rapidamente ao solo, como algumas espécies de leguminosas
(MARTINS, 2001).
Almeida, R. (2002) enfatiza que tem sido comum a escolha por modelos
homogêneos de recuperação em áreas de mineração. Os modelos são recomendados
no caso da área ser usada futuramente para fins comerciais e desde que antes do
empreendimento já não houvesse mata nativa no local. As práticas podem envolver
59
tanto pastagens, exploração madeireira, ou práticas agriculturais, contanto que as
espécies plantadas cumpram a função de proteção do solo e dos recursos hídricos.
- Reflorestamentos mistos.
Os reflorestamentos mistos envolvem o plantio de um grande número de espécies
vegetais, no objetivo de recuperar a estrutura e a dinâmica florestal. A efetivação desta
prática requer conhecimentos teóricos básicos, informação sobre a área e tecnologia
disponível (ALMEIDA, R. 2002).
“As ações que visam a recomposição vegetal devem atingir dois objetivos distintos
mas não excludentes, ou seja, o que procura “recriar” a vegetação existente no
passado, mantendo a composição original em espécies, e a que procura recuperar o
papel da vegetação para obter as vantagens ambientais relacionadas ao regime
hídrico, ao fluxo de nutrientes, e à estabilidade do solo”. (ALMEIDA, R. 2002, p.
52).
- Modelo de plantio ao acaso.
Segundo Almeida, R. (2002) é um plantio de espécies que não obedece a critério
algum, sem ordem ou arranjo, e que parte do pressuposto de que as plantas também
não obedecem a uma ordem de distribuição na natureza, e que germinam e crescem ao
acaso.
O plantio ao acaso não é considerado eficaz, pois não leva em consideração que ao
se analisar o padrão de distribuição das árvores em uma floresta é possível perceber
que algumas são aleatórias, mas várias têm distribuição agregada. Este modelo não dá
importância a diferenças entre os grupos de espécies como competição, predação e
necessidades por luminosidade ou sombra, considerando todas as espécies como iguais
neste aspecto (ALMEIDA, R. 2002; MARTINS, 2001).
- Reflorestamentos sucessionais.
Estes reflorestamentos separam as espécies em diferentes grupos ecológicos, cada
qual com espécies que apresentam características comuns, mas funções diferentes
dentro da dinâmica da floresta (ALMEIDA, R. 2002). O modelo considera que as
60
espécies pioneiras45, ou aquelas que pertencem ao início do processo de sucessão, são
intolerantes à sombra e possuem crescimento rápido, e conseqüentemente poderão
fornecer as condições ecológicas necessárias (principalmente o sombreamento) ao
crescimento e desenvolvimento das espécies que pertencem aos estágios mais
adiantados da sucessão (MARTINS, 2001). É um modelo que considera um maior
número de características, bem como particularidades sobre as espécies vegetais e suas
adaptações, portanto, suas chances de obter êxito também são maiores. 46
- Ilhas Vegetativas.
Segundo Martins (2001), quando não se dispõe de muitos recursos e a área a ser
recuperada é muito extensa o reflorestamento em ilhas vegetativas pode ser escolhido
como método de recuperação, no entanto, apesar do baixo custo é um processo lento.
“O modelo de recuperação em ilhas baseia-se em estudos que mostram que a
vegetação remanescente em uma área degradada, representada por pequenos
fragmentos ou até mesmo por árvores isoladas, atua como núcleo de expansão da
vegetação, por atrair animais que participam da dispersão de sementes. Assim, a
partir das ilhas vegetativas, a vegetação secundária vai se expandindo e acelerando
o processo de sucessão na área degradada”. (MARTINS, 2001, p. 89).
Posteriormente deverão ser escolhidas quais as técnicas de recuperação a serem
usadas. Almeida, D. (2000) e Martins (2001) enumeram algumas técnicas, como a seleção de
espécies, a produção de sementes, a produção de mudas, a utilização de matéria orgânica, o
uso de manta florestal (serrapilheira), a utilização de telas naturais, a aplicação de
microorganismos e a colocação de poleiros artificiais. Várias delas podem e devem ser
utilizadas em associação para a obtenção de melhores resultados.
45 As espécies pioneiras são aquelas mais resistentes, e por vezes agressivas, que em um processo de sucessão
natural irão primeiramente se estabelecer em uma área. Compreendem as gramíneas, herbáceas e variadas
leguminosas. São as espécies sombreadoras. As espécies não-pioneiras, por sua vez, são mais sensíveis às
condições do meio ambiente e só irão desenvolver-se mais tardiamente no processo de sucessão natural, muitas
necessitam de sombra para germinarem e nas primeiras fases de crescimento, são denominadas espécies
sombreadas.
46 Para maiores detalhes sobre os procedimentos de plantio em modelos sucessionais ver Almeida, R. (2002) e
Martins (2001).
61
- Seleção de espécies.
A seleção adequada das espécies está fundamentada no conhecimento sobre as
espécies locais que estão mais adaptadas às áreas de pleno sol e que fazem parte dos
estágios iniciais da sucessão, e aquelas que precisam de condições específicas para
sobreviver. A posse deste conhecimento norteará a escolha das espécies que comporão
o total das que serão usadas na recuperação, e em qual momento poderão ser
utilizadas.
Segundo Almeida, D. (2000), o grupo de espécies que mais se destaca para na
recuperação das áreas de elevada degradação é o das pioneiras, não se devendo
restringir o plantio às espécies arbóreas mas utilizar também grupos como o de
gramíneas e arbustivas (herbáceas), que conferirão uma rápida proteção aos solos
degradados, principalmente onde não há nenhuma cobertura vegetal.
- Produção de sementes.
A coleta das sementes deve ser feita de árvores matrizes remanescentes no local,
pois estas já estarão adaptadas às condições ecológicas locais e transmitirão
geneticamente esta adaptação às sementes. No caso da ausência destes remanescentes
deve-se escolher sementes oriundas de regiões com condições ecológicas semelhantes
(clima, solo, tipo de vegetação e altitude) (MARTINS, 2001).
Segundo Martins (2001), o número de árvores que serão utilizadas como matrizes
também é importante, pois é este fator que irá conferir a diversidade genética do local.
A escolha de poucas árvores como matrizes pode resultar em problemas futuros de
sustentabilidade florestal. São necessárias de 12 a 15 árvores por espécie para a coleta
de sementes.
62
- Produção de mudas.
A produção de mudas diz respeito às etapas necessárias desde a escolha do
recipiente e o seu preenchimento até as características do viveiro para a sobrevivência
destas. A escolha do recipiente está relacionada aos custos, facilidade de transporte e
manuseio, sua ocupação de espaço e facilidades ou dificuldades na utilização. As
características do viveiro determinarão a capacidade de sobrevivência das mudas.47
- Utilização de matéria orgânica.
A utilização de matéria orgânica tem sido freqüente na recuperação de áreas
degradadas, sempre como auxiliar no processo de recuperação e associado a outras
técnicas. A matéria orgânica aplicada visa melhorar a qualidade dos solos e criar
melhores condições para a futura germinação e estabelecimento das espécies arbóreas.
Esta técnica tem bastante eficácia, pois “proporciona uma redução da amplitude da
temperatura do solo e aumenta a capacidade de absorção de água, proporcionando
recolonização de macro e microorganismos e aumentando a comunidade de
microorganismos do solo, além de possibilitar o fornecimento de propágulos de
plantas, garantindo o sucesso do processo de recuperação”. (ALMEIDA, D. 2000,
p.79).
- Uso de manta orgânica florestal (serrapilheira).
A manta florestal ou serrapilheira é a camada superficial do solo onde estão
presentes materiais de origem vegetal (folhas, flores, ramos, cascas, frutos e sementes)
e animal (restos animais e material fecal), muitos em algum estado de decomposição
(MARTINS, 2001). A serrapilheira funciona como um banco genético do que
acontece na floresta, e o seu uso, assim como o da matéria orgânica (visto que faz
47 Para detalhes técnicos a respeito da produção de mudas e características de viveiros ver Martins (2001).
63
parte dela), conferirá maior estabilidade ao sistema e proteção ao solo dos agentes
erosivos (ALMEIDA, D. 2000).
- Utilização de telas naturais.
São técnicas que devem ser utilizadas em associação com outros métodos. Estas
telas são confeccionadas com material de fibra natural e utilizadas para a contenção de
solos e redução da erosão em áreas de declive, e derivam do uso primário de sacos de
aniagem para o mesmo fim (ALMEIDA, D. 2000).
De acordo com Almeida, D. (2000), as telas naturais são fáceis de aplicar por já
virem em forma de rolo e poderem ser lançadas como um tapete, representam uma
excelente contenção aos taludes e ainda são biodegradáveis. Uma desvantagem, no
entanto, seria o elevado custo por unidade de área.
- Aplicação de organismos e microorganismos.
Os aspectos biológicos também são importantes, e esta técnica permite uma
aceleração significativa do processo de recuperação da floresta. Alguns dos benefícios
deste método, conforme Almeida (2000), são a melhora na absorção de nutrientes, o
aumento da taxa de absorção de água, o aumento da resistência ao ataque de patógenos
e a melhora nas propriedades do solo (aumento da fertilidade, solubilidade e
reciclagem de nutrientes) 48.
- Colocação de poleiros artificiais.
Segundo Almeida, D. (2000), os poleiros oferecem um ponto de pouso às aves,
que, ao permanecer nas áreas degradadas, defecarão e liberarão sementes de espécies
provenientes de outras áreas. Para o autor esta técnica é eficaz quando as áreas
florestais são próximas ao local, mas é necessário analisar a possibilidade de as
próprias árvores do local degradado funcionarem como poleiros “naturais”.
48 Esta técnica deve vir sempre associada a outros métodos. Para maiores detalhes ver Almeida, D. (2000).
64
As estratégias de plantio também podem diferir de acordo com o local a ser
recuperado, e a sua escolha poderá determinar o maior ou o menor êxito dos procedimentos.
As estratégias podem ser o plantio de mudas, o plantio de estacas diretamente no campo, o
semeio direto, a semeadura aérea e a hidrossemeadura.
- Plantio de mudas.
Segundo Almeida, D. (2000) é um dos métodos mais utilizados e de grande
eficácia no objetivo de proteger o solo da erosão e tornar a recuperação um êxito. A
densidade de plantio deve ser próxima da original na floresta. Este método pode ser
utilizado tanto no início da recuperação ao se recobrir a área aberta com espécies
pioneiras ou leguminosas, como em um período posterior para realizar o
enriquecimento da floresta com demais espécies (após o controle inicial feito com as
pioneiras).
O plantio deve ser efetuado quando o solo estiver úmido, de preferência no início
da estação chuvosa, caso contrário a mortalidade das plantas poderá aumentar
consideravelmente. As mudas de leguminosas são escolhidas preferencialmente
quando o local a ser recuperado apresenta forte degradação ambiental e as camadas
superficiais do solo foram removidas, pois fixam o nitrogênio atmosférico e conferem
maior estabilidade aos solos (ALMEIDA, D. 2000).
- Plantio de estacas diretamente no campo.
Segundo Almeida, D. (2000), este método só pode ser usado com algumas
espécies florestais e arbustivas, pois poucas delas aceitam este tipo de propagação. A
chuva constante (ou irrigação) é fundamental no inicio do processo e até que as
estacas peguem e se estabeleçam as mudas. O autor cita dois procedimentos que
facilitam este ‘pegamento’ das estacas: a utilização de hormônios aceleradores do
65
enraizamento; e a utilização de gel ou de uma solução hidratante junto à cova de
plantio.
- Semeio direto.
Esta técnica não tem sido mais utilizada com freqüência, mas pode ter êxito
quando combinada com outros métodos que confiram eficácia ao procedimento, como
é o caso do semeio de espécies não-pioneiras em um período posterior ao plantio das
pioneiras, quando o solo já se encontra mais estabilizado pela ação destas
(ALMEIDA, D. 2000).
- Semeadura aérea.
Segundo Almeida, D. (2000) este método somente deve ser utilizado em áreas de
difícil acesso, nas quais os outros procedimentos são inviáveis. São utilizadas em sua
maioria espécies pioneiras, e o local deverá ser enriquecido posteriormente com o
plantio manual de espécies de outros estágios da sucessão.
- Hidrossemeadura.
A hidrossemeadura deve vir associada a outros métodos para garantir sua eficácia,
como o uso de telas naturais e o plantio de mudas, sendo eficiente na contenção de
taludes em áreas de mineração (ALMEIDA, D. 2000).
“Trata-se de uma técnica mecanizada, onde as sementes são lançadas na área a ser
recuperada através de jateamento (utilizando uma bomba), em mistura de água,
sementes, fertilizantes e outros produtos como agentes cimentantes (com a função
de fazer aderir a semente à superfície onde foi aplicada)”. (Almeida, D., 2000,
p.78).
A síntese dos procedimentos de revegetação para a recuperação de áreas degradadas
pode ser observada no Quadro 04.
66
Quadro 04 – Procedimentos de revegetação
Cada condição de degradação encontrada requererá tratamento específico e espécies
mais adequadas à região. Jesus (1994) enfatiza que não existem áreas irrecuperáveis e sim
áreas com maior ou menor custo de recuperação. Seria necessário estabelecer uma espécie de
consenso entre as estratégias de recuperação e seu custo sem negligenciar o meio ambiente
com “falsas alternativas” que só resultariam em perda de tempo.
O conhecimento dos métodos de reestruturação ambiental utilizados com êxito auxilia
na escolha das decisões sobre as estratégias de recuperação para as áreas degradadas pela
mineração. As estratégias de recuperação podem associar benefícios em métodos que
abordem o desenvolvimento em bases sustentáveis. A preocupação dada a uma região durante
o processo de recuperação deve envolver o meio ambiente e a criação de alternativas ao
desenvolvimento regional. Pensar o homem dentro do contexto de recuperação (como parte
integrante do processo) permite visualizar os caminhos do desenvolvimento que são possíveis
de ser percorridos, evitando com isso generalizações utópicas que só tenderiam a prejudicar a
busca deste desenvolvimento ‘equilibrado’.
67
1.7 A RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS PELA MINERAÇÃO NO BRASIL
O arcabouço regulamentar que se formou ao longo dos anos permite um maior
controle sobre as atividades potencialmente degradadoras no país. Segundo o Ministério do
Meio Ambiente, nas Diretrizes Ambientais para o Setor Mineiro, um problema observado nos
Planos de Recuperação de Áreas Degradadas é a tendência destes se transformarem em
documentos de cunho tão somente administrativo e apresentados para cumprir normas
processuais (MMA,1997). O problema é relacionado pelo órgão à falta de integração das
instituições envolvidas, à complexidade do processo de licenciamento e à estrutura deficiente
dos órgãos, que sem recursos financeiros e pessoal capacitado não conseguem acompanhar a
demanda pelo licenciamento ou fiscalizar o cumprimento das medidas (MMA, 1997).
Instrumentos como o PRAD podem contribuir para o controle da degradação e
minimizar os efeitos negativos da exploração, como os observados no fechamento de uma
mina, no entanto, o próprio MMA os considera ainda com significativas lacunas. O
fechamento de minas tem sido um aspecto debatido na temática sobre recuperação ambiental
devido o abandono de muitas destas áreas sem recuperação após a saída das mineradoras49.
No período de exploração de uma mineradora a população local, por vezes, passa a
desenvolver atividades que giram em torno da extração mineral, e a saída da empresa sem
considerar estes aspectos termina por desestruturar toda a cidade. As conseqüências do
término das atividades precisariam ser internalizadas pela empresa como forma de redução de
impactos negativos. O PRAD seria uma forma do poder público aumentar o controle sobre as
atividades de exploração e a retirada de uma empresa.
O fechamento de uma mina, no âmbito da reabilitação, para Lott et al. (2004),
compreende estabilizar as condições geoquímicas e geotécnicas de áreas mineradas, de modo
49 A preocupação que as empresas de mineração podem ter ao proceder o término de suas atividades envolvem
não só aquelas de caráter ambiental, mas as econômicas e sociais relacionadas ao fechamento de minas.
68
a proteger a saúde e segurança pública, e minimizar e prevenir quaisquer processos de
degradação em curso. O MMSD (2002) considera que o fechamento da mina precisa ser
pensado antes mesmo do início das atividades exploratórias, como forma de minimizar
problemas e contribuir para o desenvolvimento regional sustentado.
Roberts et al. (2000) enfatizam alguns impactos econômicos que implica o processo
de fechamento de minas. Os impactos econômicos, ou conseqüências econômicas resultantes,
são o crescimento do desemprego (passado à comunidade local), o crescimento da demanda
por serviços sociais (arcada pelo governo para suprir as perdas de emprego), as mudanças
inesperadas nas atividades econômicas (que devem ser suprimidas pelo planejamento do
governo - mais antecipado ao fechamento quanto mais abrupto for este), e a redução na renda
(menos renda de royalties da produção mineral e de imposto de renda dos trabalhadores).
O requerimento para o fechamento de uma mina ocorre quando o empreendimento de
exploração deixa de ser viável economicamente, quando a relação custo-benefício deixa de
ser vantajosa para o empreendimento (LOTT et al., 2004). A Norma Reguladora de
Mineração nº 20 do DNPM, regulamentada em 18 de outubro de 2001 pela Portaria nº 237,
define os procedimentos administrativos e operacionais em caso de fechamento de mina, a
suspensão e a retomada de operações minerais. Para Taveira (2003) apesar desta norma ser
um avanço na legislação brasileira
“não faz referência à questão da responsabilidade e das garantias de que o plano de
fechamento será efetivamente executado; não apresenta as diretrizes para a
elaboração do plano de fechamento; não estabelece vínculo e articulação com o
licenciamento ambiental do empreendimento que ocorre no foro estadual ou
municipal, não contempla a participação da sociedade e não deixa claro quando este
documento deve ser elaborado, aprovado, atualizado e fiscalizado”. (Taveira, 2003,
p. 68).
Taveira (2003), ao estudar o Grupo de Mineração Rio Tinto, ressalta as estratégias
adotadas pelo grupo que foram consideradas exemplo de integração entre a operação e o
fechamento da mina. A Rio Tinto elaborou seu plano de fechamento em três etapas: o estudo
– onde se fez a coleta e análise das informações; a definição da estratégia(as) – elaborada
69
junto à comunidade, ao governo e demais atores, e que continha o esboço de como a operação
seria concluída, as alternativas viáveis e a estimativa de custo; e a preparação do relatório, que
é o documento formal que detalha os procedimentos e estratégias adotadas no plano de
fechamento. Segundo a autora este plano de fechamento, ou plano de descomissionamento,
deve ser elaborado aproximadamente dois anos antes do término das atividades da empresa de
mineração.
Para Barreto (2001), o processo de fechamento de uma mina deve ser encarado como
uma nova etapa em um projeto de mineração, com atividades e custos previstos desde o início
do empreendimento. O planejamento e a avaliação do empreendimento para o seu fechamento
pode contar com a participação da sociedade civil organizada e da comunidade local a ser
afetada, como forma de alcançar melhores resultados.
Segundo Roberts et al. (2000), a forma que o Brasil e alguns países da América do Sul
desenvolveram para gerenciar os riscos ambientais de empreendimentos de mineração foi a
criação de instrumentos como a exigência de garantia financeira que obriga as empresas a
internalizar o custo decorrente de suas atividades (seguros, fianças, letras de créditos, cauções,
penalidades). A garantia financeira representa uma forma de diminuir o índice de
inadimplência das empresas, pois as atividades desenvolvidas nesta etapa apresentam custos
elevados e se alongam por um extenso período (TAVEIRA, 2003). Na ausência de exigências
específicas da legislação, de acordo com Roberts et al. (2000), há a preferência pela utilização
de provisões contábeis para cobrir os custos da responsabilidade da empresa no fechamento
da mina.
A análise da temática, de acordo com Vale (2000), precisa abordar a interpenetração
dos diferentes fatores envolvidos, em um planejamento integrado e sistêmico da gestão
ambiental. A partir deste planejamento as ações de prevenção, proteção, monitoramento,
fechamento de minas e restauração de áreas degradadas podem se tornar menos anacrônicas.
70
CAPÍTULO 2 – O DISTRITO DE LOURENÇO
2.1 BREVE CARACTERIZAÇÃO CLIMÁTICA, EDÁFICA E DO REGIME HÍDRICO DA
REGIÃO
O regime hídrico, o clima e a vegetação na área são característicos da região
amazônica e há poucos estudos específicos para o local sobre suas particularidades
ecológicas. A região apresenta duas estações anuais, o período de chuva (janeiro a junho) e o
período de estiagem (julho a dezembro). A alta pluviosidade permite que a umidade relativa
da região também seja elevada. O regime hídrico está diretamente associado ao ciclo anual de
chuvas e seca, decorrente das condições climáticas locais e regionais.
A região de Lourenço apresenta boa drenagem, com relativa regularidade no volume
das águas, variando em função das chuvas. Os rios que drenam a região são: Cassiporé,
Calçoene, Araguari, Anatairé, e afluentes. A boa drenagem proporcionada por estes rios e
afluentes permite que a localidade possua alto potencial hídrico (AMARAL, 1980).
Os solos da região apresentam, em sua maioria, textura argilosa e pouca fertilidade,
com pouca diferenciação entre os perfis edáficos. Desta forma, os solos resultam mais
uniformes e com camada superficial reduzida (Horizonte A) (AMARAL,1980). Os solos
possuem grande potencial hidromórfico, o que é característica do latossolo vermelho amarelo
da área, e podem ser utilizados com êxito para a agricultura, desde que utilizados fertilizantes
e adubos para melhorar sua fertilidade (VIEIRA et al., 1988).
Segundo Amaral (1980), a vegetação desta parte do Estado do Amapá se diferencia em
dois tipos característicos: as florestas de várzeas e terra firme e a campestre (com cerrados,
campos limpos e campos de várzea). Em solos de rochas cristalinas e no campestre é
71
freqüente a presença de campos cerrados50. No entanto, a vegetação predominante é a Floresta
tropical de terra firme, encontrada em quase 70% da região amazônica.
2.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO GARIMPO DE LOURENÇO E A PRODUÇÃO
DE OURO
Conforme Amaral (1980), o início da garimpagem de ouro em Calçoene ocorreu em
torno de 1822, com a descoberta de ouro no médio igarapé Flexal. A área que mais se
destacou no Município foi Lourenço, onde o ouro foi descoberto em 1890 por um brasileiro
que residia na Guiana Holandesa. Esta descoberta gerou a invasão de estrangeiros que
residiam nas fronteiras. Eles atingiam a área através do rio Calçoene e seu afluente pela
margem esquerda, o igarapé Cachoeirinha, chegando ao porto do Tigre, a partir daqui ainda
seguiam a pé 13 km até a área do garimpo. O crescente número de imigrantes fez surgir várias
vilas como Lourenço, Regina e Limão (Figura 08). O número de garimpeiros na região
chegou a atingir cerca de 6.000 pessoas.
50 Transição entre a mata e o campo limpo, são sempre inundáveis e ocorrem no Noroeste do Estado do Amapá.
72
Fonte: Mosaico de Cenas do Landsat. Embrapa 2000.
Figura 08 – Mapa do Município de Calçoene.
73
Os métodos de extração de ouro em Lourenço sempre foram simples e manuais, e as
áreas de garimpo eram deixadas como herança ou vendidas a outros garimpeiros. A mudança
veio com o garimpeiro Joel Ferreira de Jesus. Joel trabalhava apenas com o comércio no
período de 1942 a 1950, a partir daqui comprou uma área de um garimpeiro e mecanizou sua
produção, com a utilização de tratores, britadores, moinhos, equipamentos para desmonte
hidráulico etc. O garimpeiro continuou aumentando sua área e depois requereu um alvará
junto ao DNPM (AMARAL, 1980). A área requerida junto ao DNPM em 1978 abrangia,
inclusive, áreas de outros garimpeiros, no total de 2.000 hectares (MATHIS & SILVA, 2003).
A grande insatisfação veio com a venda destas áreas à Mineração Novo Astro S/A, que não
permitiu que os garimpeiros trabalhassem na sua área de concessão51.
As empresas de Mineração Novo Astro S/A – MNA e Mineração Yukio Yoshidome
S/A – MYYSA instalaram-se em Lourenço em 1986 e 1989, respectivamente. A MNA
chegou a possuir, no auge de suas atividades, cerca de 600 pessoas empregadas, sem contar
trabalhadores indiretos. A MYYSA chegou a ter mais de 200 operários cadastrados (MATHIS
et al., 1997). Lourenço teve um crescimento significativo, transformando-se em vila e
posteriormente em Distrito.
A MNA iniciou a criação de infraestrutura no local a partir de 1986 com o
recebimento das portarias de lavra 291/86 e 292/86 da empresa Mutum S/A de Joel Ferreira
de Jesus52. A MNA explorou inicialmente ouro secundário, e a partir de 1991 iniciou a
produção de ouro primário em mina subterrânea, encerrando completamente as atividades de
exploração em 1995 (PORTO, 2003) (Figura 09). De acordo com Mathis et al. (1997) a MNA
51 O garimpeiro Joel Ferreira de Jesus formou pessoa jurídica (empresa Mutum S/A) para conseguir as portarias
de lavra 291/86 e 292/86 e posteriormente as vendeu à MNA. No período de Joel os demais garimpeiros podiam
trabalhar nas áreas ao redor, onde o mesmo não estivesse trabalhando, porém, com a entrada da MNA os
garimpeiros foram impedidos de trabalhar e postos na ilegalidade. (informações obtidas em entrevista com
garimpeiros em Lourenço, em setembro de 2004).
52 A entrada propriamente dita da MNA em Lourenço teve inicio no final de 1983 e início de 1984, quando
começaram a ser feitas as pesquisas de viabilidade da jazida e o início da criação da infraestrutura básica para o
empreendimento (MATHIS & SILVA, 2003).
74
realizou a exploração de minério secundário, primário e o aproveitamento de rejeitos53 se
utilizando da lavra a céu aberto no primeiro momento e em seguida a exploração subterrânea
do Morro do Salamangone para a retirada do minério primário (Figura 10). A MNA chegou a
investir em Lourenço, no período em que explorou, cerca de 53 milhões de dólares, com a
produção total declarada de 20 toneladas de ouro (MATHIS et al., 1997).
Figura 09 – Planta de beneficiamento da Mineração Novo Astro, logo após a entrega da área de concessão.
53 Material que sobra após ter sido realizado o beneficiamento e a recuperação do ouro. Muitas vezes este
material ainda possui grande quantidade de ouro que não foi recuperado devido a uma baixa granulometria.
Foto: Armin Mathis. 1995.
75
Figura 10 – Morro de Salamangone (Lourenço-AP), com destaque da entrada da mina ao lado esquerdo.
A Mineração Yukio Yoshidome S/A (MYYSA) explorou ouro na área do Labourie
(Distrito de Lourenço, Calçoene) no período de 1989 a 1992. A empresa explorou
inicialmente ouro secundário, para posteriormente dar início aos trabalhos em lavra
subterrânea. A MYYSA era de menor porte que a MNA, mas incorporou características de
uma empresa de mineração. A mineradora investiu cerca de 7 milhões de dólares em
infraestrutura, chegou a ter 252 empregados diretos, e teve produção total declarada em
aproximadamente 1,1 tonelada em uma reserva anteriormente calculada em 5 toneladas
(MATHIS et al., 1997).
Em 1992 a empresa encerrou suas atividades declarando que a produção não estava
mais compensando os custos. A MYYSA deixou, inclusive, de efetuar o pagamento dos
salários de muitos trabalhadores por vários meses em decorrência da baixa produção. Com a
saída da mineradora os empregados chegaram a recorrer à justiça para receber seus salários,
mas sem nenhum êxito. Porém, alguns deles afirmam que a área não havia deixado de ser
Foto do autor. 09.2004.
76
produtiva, mas que os técnicos e o geólogo responsável cometeram um erro no
estabelecimento do local exato do veio aurífero54.
Em 1997, após a saída das empresas MNA e MYYSA, as jazidas de ouro
exploradas (Salamangone e Labourie, respectivamente) ainda apresentavam reservas de
minério primário, visto que o relatório do SPRN (Subprograma de Políticas de Recursos
Naturais) do PPG7 (Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil) do
Estado do Amapá as delimitou em 14,4 toneladas para o morro de Salamangone e 1,4 para a
área do Labourie (Relatório PPG7, 1997).
Com a saída das mineradoras de Lourenço houve um intenso êxodo populacional para
outras localidades, muitos prédios da empresa MNA foram abandonados e a mina subterrânea
da mesma foi lacrada para impedir o acesso dos garimpeiros. Os garimpeiros que
permaneceram em Lourenço continuaram as atividades no garimpo e fundaram a Cooperativa
de Garimpeiros do Lourenço (COOGAL), que passou a funcionar nas antigas instalações da
empresa MNA (Figura 11).
Figura 11 – Sede administrativa da Cooperativa dos Garimpeiros do Lourenço (COOGAL).
54 Foi feita uma entrevista com um antigo gerente supervisor da MYYSA, Enildo Silva, em setembro de 2004, e
o mesmo confirma ter havido um erro nos cálculos do geólogo responsável. O entrevistado declarou que os
antigos membros da gerência da empresa passaram a trabalhar no local com a infraestrutura deixada pela
mineradora e ainda permanecem no local, pois, segundo este, agora sim foi de fato encontrada a correta direção
do veio aurífero.
Foto do autor. 09.2004.
Foto do autor
77
A criação da Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço surgiu da tentativa de
organização dos garimpeiros para o estabelecimento de uma melhor negociação com o poder
público e os demais órgãos, de modo a facilitar a conquista de direitos de lavra, dinamizar a
informação entre os setores e tentar regularizar as atividades (Plano de lavra – COOGAL,
2000). A transferência dos direitos minerários para a COOGAL, no entanto, não foi um
processo rápido e simples.
2.2 AS TRANFERÊNCIAS DOS DIREITOS MINERAIS
O primeiro requerimento de direitos minerários em Lourenço data de 1978, o qual
partiu de Joel Ferreira de Jesus em 16 de junho de 1978, por meio dos processos 803.611/78 e
803.612/78. Os alvarás de pesquisa foram posteriormente adquiridos em janeiro de 1979 e a
renovação destes em janeiro de 1982. Em 28 de julho de 1983 foi feito o pedido de lavra
experimental. As guias de utilização foram concedidas e os direitos minerários foram
vendidos à Mineração Novo Astro S/A – MNA. Em 18 de janeiro de 1984 foi feito o relatório
final da pesquisa.
A MNA obteve as portarias de lavra n° 291 e 292 em 18 de março de 1986, no
entanto, já executava os trabalhos de lavra a céu-aberto e beneficiamento do material desde
meados de 1984. A empresa declarou sua retirada da área em 1995 alegando não ser mais
vantajosa a relação estéril-minério. A MNA neste momento firmou um acordo com o
Governo do Estado, no qual prometia não efetuar a baixa da firma em Brasília para que a
titularidade fosse passada diretamente para os garimpeiros55.
55 Informações obtidas por meio de entrevista com o ex Supervisor Administrativo da Mineração Novo Astro
S/A, e seu atual representante em Macapá, Gessé Soares, em entrevista realizada em agosto de 2004.
78
Em 07 de outubro de 1995 foi assinado o “Instrumento Particular de Cessão de
Direitos” entre a Mineração Novo Astro e a COOGAL, tendo como testemunhas o
governador do Estado João Alberto Rodrigues Capiberibe e a secretária da SEPLAN Mary
Helena Allegretti. O instrumento previa a cessão e a transferência de todos os direitos
decorrentes das áreas oneradas pelas Portarias de Lavra n° 291/86 e 292/86 aos garimpeiros.
A COOGAL se responsabilizou em assumir e cumprir todas as obrigações inerentes aos
direitos minerais, em assumir todos os ônus e obrigações junto aos órgãos do meio ambiente,
em isentar a MNA de quaisquer obrigações ou encargos provenientes da referida cessão, e em
averbar o Termo junto ao DNPM e demais órgãos. As obrigações da MNA foram tão somente
firmar os documentos necessários para a cessão e fornecer à COOGAL quaisquer informações
técnicas ou documentos de que dispusesse.
Em 30 de outubro de 1995 o Instrumento de Cessão de Direitos foi protocolado no
DNPM em Brasília e iniciando o processo de averbação. Em 1998 ainda não havia sido
legalizada a cessão dos direitos à COOGAL, e após vários acidentes envolvendo
desmoronamentos na mina subterrânea e a lavra clandestina, em 09 de novembro deste
mesmo ano o DNPM interditou as atividades na mina subterrânea e o uso de GLP e
explosivos, lacrando em seguida a entrada da mina.
Em 29 de janeiro de 2001 foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)
entre a Procuradoria da República do Estado do Amapá, o DNPM, a COOGAL, a empresa JI
Almeida Monteiro – Raio Explosivos e a empresa TNT COM. Mineração e Serviços Ltda,
dando início ao processo de regularização das atividades da COOGAL. Este TAC tinha por
objetivo amparar juridicamente os garimpeiros de Lourenço para que desenvolvessem suas
atividades sob o controle dos órgãos públicos até que uma solução definitiva fosse alcançada
para o problema social local. O Termo tinha vigência por 90 dias, permitia a atividade
garimpeira, mas proibia os trabalhos na mina subterrânea, que de acordo com o mesmo
79
deveria ser implodida. O documento também permitia o uso de explosivos, mas somente por
técnicos credenciados das empresas de comercialização do produto.
A COOGAL, no entanto, menciona em seu Plano de Adaptação de Lavra em 2000 que
não desejava se tornar concessionária de uma Portaria de Concessão de Lavra por não poder
discipliná-la. A Cooperativa propunha a idéia de trabalhar dentro da legalidade em um
sistema de lavra garimpeira. Segundo a COOGAL, a cooperativa e os membros cooperados
não tinham estrutura técnica ou financeira para seguir um plano de aproveitamento econômico
que abarcasse o porte de uma atividade de lavra conforme o estabelecido no Código de
Mineração, e por receber os direitos minerários não poderia gerir a atividade conforme uma
empresa de exploração.
A situação não se modificou e, como os trabalhos no garimpo estavam restritos aos
depósitos secundários e estes já estavam em exaustão, a COOGAL efetuou em 18 de outubro
de 2002 um pedido de adiantamento para exploração de Tantalita e utilização do estéril para
transformação em Brita e um pedido de execução da exploração subterrânea em 26 de
dezembro de 2002.
A permissão para a exploração subterrânea veio com o Termo de Ajustamento de
Conduta assinado em 10 de setembro de 2003. O Termo foi firmado entre o Ministério
Público Federal, a Secretaria de Estado do Meio ambiente do Amapá, o Departamento
Nacional de Produção Mineral e a Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço, e assegurou o
estudo de reaproveitamento econômico da exploração subterrânea pelo prazo de 180 dias. O
Termo foi prorrogado posteriormente em 23 de março de 2004 pelo prazo de mais 180 dias,
com a condição de a COOGAL aplicar 20% dos lucros em prol dos cooperados nas áreas de
educação, saúde, recreação, segurança e equipamentos. A estrutura e atuação da COOGAL
terminaram por inviabilizar esta condição imposta pelo Termo de Ajustamento de Conduta
assinado.
80
2.3 A COOPERATIVA DE GARIMPEIROS DE LOURENÇO - COOGAL
2.3.1 A estrutura e atuação da COOGAL
A Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço teve seu estatuto social aprovado em
assembléia geral extraordinária no dia 10 de janeiro de 1995. O Art. 2° deste estatuto
delimitou quatro objetivos principais para a COOGAL:
- “Adquirir diretamente bens de consumo e produtos necessários à atividade
garimpeira, quer de fontes produtoras, quer de fontes distribuidoras, nacionais ou estrangeiras,
e fornecê-los nas melhores condições de preço possíveis ao seu quadro social”;
- “Realizar a prospecção, pesquisa e lavra de jazidas minerais”;
- “Prestar assistência técnica, educacional e social ao quadro social e seus familiares”;
- “Transportar, classificar, armazenar, beneficiar, industrializar, embalar e
comercializar a produção dos seus cooperados”.
Em 2003 a COOGAL possuía um presidente eleito por maioria de votos (com
mandato de cinco anos), um vice-presidente e uma diretoria a eles subordinada, na qual se
observavam as funções de Diretor Administrativo, Diretor de Patrimônio, Diretor Financeiro,
Diretor Secretário, Diretor Social, Chefe da Seção Técnica, Fiscal de Campo da Lavra a Céu
Aberto, Fiscal de Campo da Lavra Subterrânea e Fiscal de Campo do Beneficiamento. Esta
estrutura surgiu inicialmente como forma de melhor gerenciar a exploração do ouro (Figura
12).
81
Fonte: COOGAL, 2003
Figura 12 - Organograma da COOGAL.
As atitudes da diretoria da COOGAL satisfaziam uma parte dos garimpeiros, os
demais argumentavam que a mesma beneficiava somente uma minoria, que havia um
freqüente abuso de poder por parte dos membros da coordenação, e que a COOGAL havia se
transformado em uma ‘empresa’ com fins de lucro próprio. A cooperativa chegou a ser
comparada à Mineração Novo Astro S/A, que utilizava a força policial para manter os
garimpeiros afastados56.
As insatisfações com a atuação dos diretores da COOGAL culminaram em uma
denúncia sobre abuso de poder, desvio de verba e trabalho escravo feita pela vereadora
Francisca Nilza da Silva57 ao Ministério Público Federal no dia 12 de abril de 2004. O
Ministério Público Federal realizou a investigação da denúncia, em uma Ação Civil Pública
em 17 de julho de 2004, com entrevistas a vários garimpeiros e confirmou trabalho semiescravo,
formação de quadrilha e abuso de poder, com o desvio de um montante de
R$5.700.000,0058.
Os fatos constatados sobre a divisão percentual da produção no garimpo era que 75%
eram destinados ao investidor, 10% à cooperativa, 10% ao moinho, e os 5% restantes ao
garimpeiro. Os ‘investidores’ são os garimpeiros donos de moinhos, maquinários e poços, e
56 Dados obtidos a partir de entrevistas feitas com os garimpeiros de Lourenço em março de 2004.
57 A vereadora reside no distrito de Lourenço e concedeu entrevista no dia 28 de setembro de 2004, durante
viagem de campo.
58 Este valor se refere a todo aquele que não possui confirmação de saída, como notas fiscais ou recibos. O
Ministério Público Federal considera que grande parte deste valor tenha sido decorrente de falhas administrativas
com a falta de emissão de notas fiscais.
Presidente
Diretor
Financeiro
Diretor de
Patrimônio
Diretor
Administrativo
Diretor
Secretário
Diretor Social
Vice-presidente
Sessão Técnica
Engenheiro de Minas
Fiscal de Campo da
Lavra Subterrânea
Fiscal de Campo do
Beneficiamento
Secretário
Fiscal de Campo da
Lavra a Céu-aberto
82
que investem uma parte de sua produção na compra de equipamentos. Inicialmente foram os
garimpeiros que se responsabilizaram por reduzir o nível da água na mina subterrânea, assim
que foi assinado o Termo de Ajustamento de Conduta que permitia a abertura da mina. Os
investidores recebiam uma parcela do ouro produzido em forma de porcentagem, como
pagamento por seus investimentos.
A divisão percentual era diferente conforme a atividade do garimpeiro na mina, se este
trabalha com a quebra do material da rocha ou se trabalha com a coleta do xerém (material
que sobra nos túneis quando é quebrada a rocha). O primeiro grupo recebia de acordo com a
divisão já mencionada. O grupo que trabalha com o xerém ficava com 50% do valor líquido,
porém tinham que pagar pelo transporte, óleo diesel etc. (p.ex. de 100g obtidas, 10g eram da
cooperativa e 10g do moinho, do restante que sobra – 80g – 50% seriam dos garimpeiros, ou
seja, 40g, as outras 40g seriam dos investidores, e destas 40g o garimpeiro teria de arcar com
as despesas com transporte etc.).
A divisão percentual estabelecida, onde restava ao garimpeiro um valor irrisório do
total apurado, fazia com que ele se endividasse para bancar seus custos e equipamentos, como
botas e capacete (que não eram fornecidos pela cooperativa). Os garimpeiros não podiam
reclamar da divisão devido a presença de seguranças armados (capangas) contratados pelo
presidente da cooperativa Lucas Evangelista para coibi-los durante as reuniões e impedi-los
de expressar suas opiniões ou reclamar da divisão percentual. Os seguranças armados também
tinham a função de impedir todo e qualquer desvio de ouro ou material que pudesse ocorrer,
no moinho ou no momento de sua queima59.
A atuação da COOGAL, no que se refere ao cumprimento das obrigações contidas nos
Termos de Ajustamento de Conduta, também não foi eficaz, visto que não foi efetuada a
suposta destinação de 20% dos lucros da produção em prol dos cooperados nas áreas de
59 Informações obtidas por meio de entrevistas com garimpeiros do local e com a vereadora Francisca Nilza da
Silva.
83
educação, saúde, recreação, segurança e equipamentos, o que comprometeu as condições de
trabalho na mina60. O comprometimento da segurança da mina subterrânea levou, inclusive,
ao pedido de afastamento do então Engenheiro de Minas Gildácio Araújo no início de outubro
de 2004.
A série de acontecimentos envolvendo a diretoria da COOGAL levou o Ministério
Público Federal a decidir por afastar a diretoria da cooperativa no dia 17 de julho de 2004
para poder fazer a investigação contábil. Foi então nomeada uma Junta Governativa para
administrar a cooperativa até o dia 17 de novembro do mesmo ano, quando seriam realizadas
eleições para novos integrantes da diretoria da COOGAL61. No período de administração da
Junta Governativa o garimpeiro estava ganhando 30% da produção, 10% eram do moinho e a
cooperativa recebia a porcentagem restantes e pagava inteiramente as despesas com dinamite,
bomba d’água, capacetes, botas, trabalhadores etc., o garimpeiro entrava somente com o seu
trabalho.
A nova chapa eleita para assumir a COOGAL, na qual consta o nome de três
integrantes da antiga diretoria afastada, começou sua administração em dezembro de 2004
com a promessa de exercer um mandato justo com todos os garimpeiros cooperados.
2.3.2 Os métodos de extração utilizados pela COOGAL
A exploração de ouro feita pela COOGAL em Lourenço, antes da reabertura da mina
subterrânea em 2003, se dava de duas formas: a lavra a céu-aberto do minério secundário por
meio de bico-jato e chupadeira e bateia; e a lavra de minério primário com a abertura de
galerias ou “shafts”, com o auxílio de picaretas e pás.
60 Dados presentes no relatório técnico do DNPM/AP sobre a Mina do Salamangone de 2004 e observados
durante as viagens a campo.
61 A Junta Governativa não poderia concorrer à diretoria, e os antigos membros da diretoria poderiam formar
uma chapa para concorrer às eleições.
84
A utilização de bateia para “pegar” o ouro secundário do solo é antiga. O mercúrio
pode ser adicionado diretamente a ela para fazer o amálgama com o metal. Em seguida o
material é queimado, normalmente com o auxílio de maçarico e sem proteção. A utilização de
bico-jato e chupadeira vieram facilitar os trabalhos e aumentar a quantidade de material a ser
processado. O material desmontado com o auxílio da água (desmonte hidráulico) é sugado
pela chupadeira e conduzido até caixas concentradoras, que têm por finalidade diminuir a
velocidade da água e reter o ouro que, por ser mais denso, afunda e fica contido nas
placas62.O mercúrio também pode ser adicionado diretamente às caixas, ou posteriormente em
um segundo selecionamento em contentores específicos63.
Na abertura de galerias para extrair o minério primário, o material é armazenado em
sacos e posteriormente conduzido aos moinhos64 para que o seu tamanho seja reduzido
significativamente. O material, misturado à água ao sair do moinho, passa por caixas
concentradoras de tamanho reduzido, com cerca de 45-50cm de largura por 2,5m de
comprimento. O mercúrio aqui é adicionado às placas da caixa. No momento da despescagem
(apuração do ouro), o que varia entre uma semana a quinze dias, as placas (de quatro a cinco)
são raspadas e o material é prensado em um pano, para em seguida ser feita a queima do
amálgama com maçarico em recipientes de ferro65.
Com a reabertura da mina subterrânea em 2003, grande parte dos trabalhos se
concentraram no bombeamento da água dos túneis para a liberação da mina e no início da
lavra dos veios auríferos a que ela dava acesso. Na exploração da mina são utilizadas
picaretas, pás, dinamite e maçarico para quebrar as rochas. O material é ensacado e conduzido
aos túneis principais da mina, dos quais será transportado até o moinho por camionete (o dono
62 O mecanismo das caixas concentradoras é realizar uma separação gravimétrica do material, onde as partículas
mais densas (pesadas) vão se concentrando na passagem do material pelas caixas, enquanto as mais leves não
são retidas e passam direto pelas placas. O procedimento não possui grande eficiência em reter o ouro mais fino,
por este ser mais leve. Ver maiores detalhes em Mathis et al. (1997).
63 Dados coletados durante viagens de campo em 2003 e 2004.
64 Os moinhos podem ser de “bola” ou “martelo”. Em Lourenço os moinhos de martelo são os mais
freqüentemente utilizados.
65 Dados coletados durante viagens de campo em 2003 e 2004.
85
da camionete realiza o transporte do material até o moinho mediante o pagamento de uma
porcentagem do ouro final apurado no material transportado). A partir do moinho o mesmo
procedimento anteriormente descrito é realizado para o beneficiamento do ouro, com a
raspagem das placas e a queima do material. As placas também são queimadas diretamente
com o maçarico (procedimento que só acontece aos domingos) para a recuperação do ouro
que fica eventualmente retido e nem mesmo a raspagem o remove. Durante esta queima não
há cuidado algum com a inalação dos vapores do mercúrio (Figuras 13 e 14) 66.
Figura 13 – Placa sendo queimada diretamente com maçarico.
66 Dados coletados durante viagens de campo em 2003 e 2004.
Foto: Armin Mathis. 04.2004.
86
Figura 14 – Raspagem de placa após a queima com maçarico.
Além dos trabalhos na mina subterrânea, ainda permanecem outras frentes de serviço
que trabalham com a abertura de poços e galerias. O mecanismo de exploração e
beneficiamento do minério é o mesmo utilizado antes da reabertura da mina. Os garimpeiros
de Lourenço têm maior interesse em trabalhar na mina subterrânea, devido a maior
quantidade de minério, os trabalhos têm sido tão intensos que até mesmos os pilares de
sustentação deixados pela MNA foram lavrados. A falta de segurança aliada aos
desmoronamentos no local tem afastado alguns garimpeiros de Lourenço, mas o otimismo
persiste nos que permanecem com trabalhos no local. Apesar da presença de um Engenheiro
de Minas67 e uma Técnica em Mineração para coordenar a exploração na mina subterrânea,
acidentes com mortos ou feridos têm sido freqüentes68. Os acidentes na mina subterrânea,
juntamente com a contínua degradação ambiental a que o local vem sendo submetido,
67 O Engenheiro de Minas Gildácio Araújo demitiu-se no início de outubro de 2004 alegando que os trabalhos na
mina eram muito arriscados e que os garimpeiros não considerariam a hipótese de deixar de trabalhar nela. Até
dezembro de 2004 ainda não havia sido negociado o envio de um novo Engenheiro de Minas a Lourenço.
68 Somente em agosto de 2004 aconteceram dois acidentes, ambos com mortos, em semanas contíguas do mês.
Foto: Armin Mathis. 04.2004.
87
refletem a dificuldade da COOGAL em gerenciar as atividades e aumentar a organização dos
trabalhos.
2.3.3 A produção de ouro
A preocupação com o meio ambiente e a qualidade de vida da população foi de certa
forma suprimida pela preocupação com a produção de ouro. A partir do Termo de
Ajustamento de Conduta assinado no dia 10 de setembro de 2003 que permitia que a
COOGAL iniciasse o estudo e o reaproveitamento econômico da mina, foi contratado um
Engenheiro de Minas para supervisionar, assessorar e contribuir com o trabalho.
Os túneis da mina subterrânea se encontravam parcialmente submersos, e tiveram que
ser implantados equipamentos para a retirada de água. Os garimpeiros que possuíam maior
poder aquisitivo formaram o grupo de “investidores”, responsabilizado por baixar o nível da
água nos túneis. O grupo bancaria as despesas com a liberação dos túneis e em troca receberia
75% da produção por três meses, porcentagem esta que deveria ser reduzida logo em seguida.
O grupo de investidores foi inicialmente composto por quatro garimpeiros, o grupo
cresceu e em março de 2004 possuía 23 membros. Cada membro recebia uma porcentagem
diferente (da cota de 75%), de acordo com o período em que haviam entrado para o grupo, as
porcentagens eram: 4,5% (quatro membros iniciais), 4,0%, 3,5%, 3%, 2,5%, 2,0%, 1,5% e
1,0% (os mais novos)69. O acordo inicial foi de que cada integrante contribuiria com 100 litros
de óleo diesel por semana + R$ 35,00, e se um não pagasse outro investidor cobria o valor (o
que terminou por gerar as diferenças no recebimento das porcentagens entre os investidores).
O grupo de investidores permaneceu recebendo a cota de 75% da produção até o momento da
intervenção do Ministério Público em 17 de julho de 2004, quando a diretoria foi deposta e
nomeada a Junta Governativa.
69 Apesar de ter entrado tarde no grupo (após o 1° mês de produção), o ex-presidente deposto da cooperativa
Lucas Evangelista recebia 3,0% da cota, que era atribuído às suas conquistas junto ao DNPM como presidente.
88
Os trabalhos na mina subterrânea começaram em abril de 2003, com a montagem de
uma estrutura com bombas e maquinário para a redução do nível d’água na mesma. Embora o
TAC que permitia o estudo e reaproveitamento da mina só tenha sido assinado em 10 de
setembro de 2003, em maio de 2003 já estava sendo retirada a água da mesma, e em 17 de
julho de 2003 a produção se iniciava. Inicialmente o consumo médio de diesel era de 120
l/dia, passando a 200 l/dia e 360 l/dia. Em setembro de 2004 o consumo médio era de cerca de
1.200 l/dia. A primeira apuração feita em 17/07/2003 teve 317g de ouro no moinho e a
segunda apuração 319g70.
No período de pouco mais de um ano a produção cresceu significativamente, ao lado
do aumento da imigração. A população chegou a quase quadruplicar no período, passando de
cerca de 500 pessoas para mais de 2000, na mina subterrânea havia mais de 400 garimpeiros
trabalhando. A produção de ouro também aumentou significativamente, passando de
aproximadamente 5kg/semana para até 28 kg/semana71.
A produção de ouro caiu após a intervenção do Ministério Público Federal e com a
administração da Junta Governativa. Os trabalhos foram encerrados em um determinado nível
na mina onde havia grande quantidade de rejeitos72 e água73, sendo necessário rebaixar ainda
mais os níveis de água para posteriormente continuar a produção. Em setembro de 2004
haviam somente oito frentes de serviço trabalhando, com 280 garimpeiros no total
(trabalhando na mina subterrânea74), e dos 54 moinhos existentes somente 10 estavam
trabalhando. Fora da mina (poços/galerias) existiam aproximadamente 50 pessoas
trabalhando. A maior produção de ouro durante o período de posse da Junta foi de 4kg de
ouro por semana, e a menor de 1 a 1,5 kg por semana. A baixa da produção fez com que o
70 Dados obtidos na Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço, em entrevistas realizadas em 2002, 2003 e 2004.
71 Idem.
72 Os trabalhos feitos nos níveis superiores da mina jogaram os rejeitos (melechete) para os níveis mais
inferiores, e o trabalho com os motores para a retirada de água tornou-se ainda mais demorado.
73 O período de chuvas proporcionou o considerável aumento no nível da água dentro da mina.
74 De acordo com o Engenheiro de Minas responsável pela área, Gildácio Araújo, o máximo de pessoas possível
de trabalhar na mina sem comprometer a segurança é de 380. A antiga diretoria da COOGAL ao permitir que
muitos garimpeiros trabalhassem na mina, debilitava sensivelmente a segurança.
89
número de garimpeiros e do restante da população diminuísse novamente (cerca de 1000
pessoas).
A nova diretoria da COOGAL eleita em 07 de novembro de 2004 entra com os
objetivos de criar condições para melhorar a situação financeira da cooperativa e aumentar a
produção, visto que apesar de o patrimônio da cooperativa, em setembro de 2004 ser pouco
mais de R$300.000,00 (tratores, bombas...), esta apresentava uma dívida de R$ 40.000,00 de
hipoteca75. A nova diretoria também terá de arcar com as metas anteriormente estabelecidas
nos Termos de Ajustamento de Conduta e não cumpridas pela antiga diretoria: investir uma
parte de seu excedente para o melhoramento da educação, da saúde, da recreação e da
segurança dos cooperados, além de proceder à realização de medidas de exploração menos
impactantes ao meio ambiente.
2.4 A PREOCUPAÇÃO COM O MEIO AMBIENTE EM LOURENÇO
A preocupação com o meio ambiente surgiu inicialmente com a Mineração Novo
Astro S/A - MNA. A empresa ao passo do término de suas atividades, contratou a empresa
Ampla Engenharia para realizar a recuperação das áreas degradadas e, conseqüentemente,
com a entrega da titularidade, poder se retirar da área o mais breve possível.
A MNA foi a única empresa de mineração em Lourenço que se preocupou em
desenvolver algum tipo de medida de recuperação das áreas por elas degradadas. A
Mineração Yukio Yoshidome S/A (MYYSA) chegou a ser multada pelo IBAMA (Instituto
Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) em 28 de outubro de 1989 por
estar em desacordo com as exigências da Licença emitida pelo mesmo. A MYYSA, após a
multa, procurou desenvolver algumas medidas de controle dos efluentes das barragens e o
monitoramento químico das águas de sua área de concessão, mas todas superficiais e sem a
75 Informações obtidas por meio de entrevista com o ex. Diretor de Patrimônio e atual secretário da COOGAL
Admilson Alves Camelo Junior, em setembro de 2004.
90
implementação de medidas que visassem de fato a recuperação das áreas degradadas (Parecer
técnico do IBAMA, 1990).
A MNA deu encaminhamento a dois Planos de Recuperação de Áreas Degradadas
(PRAD), o primeiro em 1995, e o segundo em 2003. O primeiro PRAD, finalizado em 1995,
foi elaborado em 1989 e teve início em 1990 pela Ampla Engenharia, a partir da
recomendação de elaboração e execução de um PRAD feita pela SEMA/DF em 1988. A
Ampla Engenharia executou trabalhos de controle da erosão, adubação e plantio de gramíneas
e de algumas árvores frutíferas. Os trabalhos se estenderam até 1995, quando a área foi
entregue. O PRAD foi fiscalizado e aprovado pelos órgãos ambientais encarregados de tal
procedimento na época76. A MNA cumpriu com todas as obrigações que lhe eram de respeito
no período de sua saída em 1995.
Em 2002, contudo, a partir de uma denúncia feita sobre poluição e degradação
ambiental, a região Lourenço teve de ser novamente analisada. Foi estabelecido um novo
Termo de Ajustamento de Conduta em 17 de dezembro de 2002, assinado pelo Ministério
Público Federal, a Cooperativa de Garimpeiros do Lourenço – COOGAL (já legalizada), a
Mineração Novo Astro S/A, o DNPM e a Secretaria de Estado do Meio Ambiente – SEMA. O
Termo previa o comprometimento da MNA em recuperar novamente as áreas degradadas pela
extração e beneficiamento do ouro, e em tomar medidas cabíveis para dar destinação
adequada a tambores contendo contaminantes e que haviam sido abandonados pela empresa
no local. Nas áreas em que não fosse possível realizar a recuperação (devido a COOGAL
estar trabalhando no local) deveriam ser depositados valores proporcionais àqueles
necessários para efetuar as medidas de controle e recuperação (de acordo com o tamanho da
área e as medidas a serem efetuadas), em uma conta corrente a ser aberta em nome da
COOGAL.
76 Os órgãos responsáveis por estas medidas foram a CEMA/AP e, por vezes, o IBAMA – Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis.
91
A MNA havia permanecido comprometida com a recuperação do local porque o
passivo ambiental que a mesma havia transferido ao governo do Estado (que teria se
responsabilizado na época) é intransferível, visto que a titularidade da área ainda permanecia
da empresa. Deste modo, a MNA teria de recuperar novamente as áreas por ela trabalhadas e
aquelas lavradas pelos garimpeiros, que até então não possuíam a titularidade e, portanto, nem
a responsabilidade (Figura 15).
Figura 15 – Foto aérea do garimpo de Lourenço em 2003.
A empresa contratada para realizar a segunda recuperação das áreas degradadas foi
novamente a Ampla Engenharia. Os trabalhos foram iniciados em 2003, com seu término
esperado para o final de 2004. As atividades previstas foram medidas de controle de encostas,
a drenagem dos rios e igarapés, e a criação de “sistemas agroflorestais”. O PRAD foi dividido
em três etapas, em áreas distintas: recuperação imediata, a médio prazo e a longo prazo. A
recuperação imediata foi prescrita para ser realizada nos anos de 2003 e 2004. A recuperação
a médio e longo prazo deverão ser efetuadas somente quando os garimpeiros forem deixando
de trabalhar nas áreas determinadas e por conta dos valores previstos pelo TAC a serem
Foto: Christoph Jasper - IBAMA/AP - 08.2003
92
depositados pela MNA em conta corrente da COOGAL. A cooperativa, no entanto, até agosto
de 2004 ainda não havia feito a abertura de uma conta corrente, e a MNA terminou por
efetuar o referido depósito em juízo, para o Ministério Público Federal77.
A COOGAL, por sua vez, conforme as exigências da Resolução CONAMA n° 10/90,
deveria apresentar o Plano de Controle Ambiental da área explorada e efetuar o devido
licenciamento das atividades junto ao órgão ambiental responsável, mas até novembro de
2004 ainda não havia procedido tal realização.
77 Informações do representante da Mineração Novo Astro S/A em Macapá, Gessé Soares.
93
CAPÍTULO 3 - A RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS EM LOURENÇO
3.1 ANÁLISE DA IMPLEMENTAÇÃO DOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS
DEGRADADAS EM LOURENÇO
A Mineração Novo Astro S/A – MNA, a partir do recebimento das portarias de lavra
291 e 292 de 1986, buscou seguir as exigências regulamentares ambientais para a
continuidade de seu plano de exploração do minério de ouro em Lourenço. A empresa
manteve inicialmente a troca de informações sobre as exigências legais dos assuntos
ambientais com a Secretaria Especial de Meio Ambiente de Brasília (SEMA/DF). A
Coordenadoria Estadual de Meio Ambiente do Amapá - CEMA foi instituída somente em
1989 pelo Decreto Estadual n° 0011/89 e regulamentada em 1991 pelo Decreto n° 0304/91,
daí as relações da MNA com o órgão ambiental responsável terem sido realizadas em grande
parte com a SEMA/DF e com o IBAMA.
Em 28 de julho de 1987 a MNA apresentou seu projeto de exploração mineral junto à
SEMA/DF e solicitou orientação para a sua regularização ambiental. A empresa requereu
junto ao órgão, posteriormente, em 11 de julho de 1988, a licença de operação (L.O.). A
SEMA/DF expediu a licença em 26 de setembro de 1988 pelo período de 365 dias, e com a
condição de que a empresa apresentasse os projetos de recuperação de áreas degradadas, de
contenção dos efluentes líquidos e gasosos, e de monitoramento das barragens de rejeito em
120 dias. A MNA apresentou seu plano de recuperação para as áreas no dia 16 de janeiro de
1989, e em 25 de janeiro do mesmo ano apresentou o primeiro relatório sobre o controle e
tratamento dos efluentes.
O período em que a primeira Licença de Operação havia terminado coincidiu com o
momento em que o IBAMA, por meio da Lei n° 7.804 (Art. n°10), de 18 de julho de 1989,
94
havia sido instituído como o responsável pela fiscalização e licenciamento de atividades
potencialmente poluidoras ou capazes de causar degradação ambiental. Desta forma, o
posicionamento da MNA foi a solicitação da Licença diretamente a este órgão. O Instituto
concedeu a renovação no dia 13 de março de 1990, pelo prazo de 700 dias (até 10/02/92),
estabelecendo as condições de que a mineradora realizasse o controle dos efluentes, o
monitoramento das barragens de rejeitos, o acompanhamento de um viveiro de mudas e a
apresentação de um relatório mensal sobre a execução do PRAD. O IBAMA realizou uma
vistoria de todos os empreendimentos minerais do Estado do Amapá em 1990, o relatório
desta vistoria, de 28 de dezembro de 1990, sobre a MNA constatou um atraso nos
procedimentos de revegetação e recomendou que o licenciamento fosse executado e
fiscalizado a partir de 1991 pela CEMA/AP.
As exigências feitas pelo IBAMA são coerentes à essência de um projeto de
exploração mineral como o da MNA e facilitam o suposto direcionamento do agente poluidor
a tomadas de decisão visando diminuir os impactos ao ambiente. As medidas recomendadas
também facilitam as atividades de fiscalização do órgão responsável. A distância da
localidade e a falta de pessoal, no entanto, eram fatores que dificultavam a verificação do
cumprimento destas exigências pelo IBAMA, bem como a observação da reação da população
local às medidas e a eficiência de implementação das mesmas.
O terceiro pedido de renovação de Licença de Operação (L.O.) da MNA foi feito,
desta vez, diretamente à CEMA/AP, porém com um mês de atraso, quando o órgão já havia
expedido uma intimação à empresa no dia 16 de março de 1992 no sentido de regularizar a
situação do licenciamento. O pedido de licenciamento pela MNA foi feito em 20 de março de
1992. A CEMA/AP efetuou a vistoria do local no dia 26 de março deste ano e não constatou
irregularidades. A renovação da Licença foi concedida no dia 15 de abril de 1992 pelo prazo
de 700 dias (a vencer dia 16/03/1994). As recomendações da CEMA/AP foram a apresentação
95
de relatórios mensais sobre a execução do PRAD, sobre a situação dos viveiros, sobre o
monitoramento das barragens de rejeitos e das condições geológicas, e que fossem definidas
as espécies vegetais a serem utilizadas, com preferência às espécies nativas.
O último pedido de renovação de L.O. feito pela MNA foi no dia 14 de março de
1994. A Licença foi expedida pela CEMA/AP em 25 de março de 1994, pelo prazo de 730
dias (a vencer em 24/03/1996)78. Em 30 de abril de 1995 a Mineração Novo Astro S/A
comunicou a CEMA/AP o encerramento de suas atividades em julho de 1995.
3.1.1 O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas de 1995
A primeira tentativa de tornar novamente produtivas as áreas exploradas pela
Mineração Novo Astro S/A teve início em 1990 com o primeiro Plano de Recuperação de
Áreas Degradadas elaborado pela Ampla Engenharia. Os trabalhos de recuperação feitos em
Lourenço contavam apenas com a presença de um engenheiro agrônomo e um engenheiro
florestal para supervisionar o serviço dos trabalhadores contratados para executar as
atividades. Esta estrutura com somente dois engenheiros impede que haja o enfoque de
diferentes ciências na implementação dos planos de recuperação e, conseqüentemente, se
obtenham respostas enviesadas. A opção por práticas transdisciplinares, enfatizada por Freitas
et al. (2004), permite uma análise mais completa das diferentes temáticas, visto que a
proliferação das disciplinas acadêmicas e o crescimento exponencial do saber torna
praticamente impossível o olhar global de somente uma ciência sobre a vasta quantidade de
conflitos e temáticas.
A Ampla Engenharia, no relatório final do PRAD enviado à CEMA em 1995,
considerou que a MNA havia degradado 69,75 hectares de sua área de concessão de lavra, e
que somente 9 hectares não teriam sido recuperados por se tratarem de estradas e vias de
78 Convém lembrar que a MNA, assim que realizava um pedido de licença ou de sua renovação, publicava no
Jornal do Dia (Amapá) e no Diário Oficial o seu procedimento, como forma de se isentar de responsabilidades
sobre o fato de estar lavrando sem licença.
96
acesso. Para executar a recuperação a Ampla dividiu as áreas degradadas em seis,
aparentemente sem o estabelecimento de critérios específicos a não ser por sua localização
(Figura 16). A primeira área eram as estradas e vias que não foram recuperadas.
Figura 16 – Croqui das áreas de recuperação do primeiro PRAD da Ampla Engenharia.
As cinco áreas destinadas à recuperação foram determinadas pela Ampla:
a) Área 01 – Totalizava 10 hectares e dizia respeito às áreas do Lataia:
alojamentos, clube, praça de esportes, hospital, lavanderia, restaurante, área
Fonte: Elaboração do autor a partir dos dados da Ampla Engenharia.
97
adjacente à estação de tratamento de água, área ao lado da lagoa do Lataia e
encosta atrás do alojamento.
b) Área 02 – Totalizava 04 hectares e circunscrevia as proximidades da guarita
do Lataia e da estrada que dá acesso ao Rio Araguari, a barragem piloto, o
pátio de minérios, as proximidades do parque principal de sucatas, em frente
à antiga Central de Geração, a área da caixa d’água e a área da mina (flanco
leste do morro Salamangone).
c) Área 03 – Totalizava 02,7 hectares e abrangia a área do aterro do estéril, as
proximidades da via de acesso às instalações da empresa, a área ao lado do
escritório central (área que liberava material para o aterro do estéril) e a área
próxima à planta de finos, onde parte do material da exploração também era
liberado.
d) Área 04 – Totalizava 24 hectares e dizia respeito a área adjacente à
barragem do igarapé Limão, a área de pesquisa do Mutum, as bacias de
tratamento do minério, uma complementação da área da caixa d’água, áreas
de liberação do estéril (barragens do “cabeleira”, da BL-3 e da planta sul), a
área do estéril sul, do morro Salamangone, as proximidades da guarita do
Lataia e os taludes da barragem do Igarapé Limão, atrás do escritório, da
planta sul e de acesso a área residencial.
e) Área 05 – Totalizava 20,051 hectares e compreendia os taludes da estrada da
mina, da estrada da portaria, da estrada do paiol e paralelo à pista de pouso,
a área do estéril próxima ao escritório, a face norte do Salamangone, as
áreas de acesso à carpintaria e à sucata, a área da bacia de tratamento n° 3 e
sua área de empréstimo de material, a área próxima ao estéril do escritório e
a área adjacente à barragem piloto.
98
- Os procedimentos geotécnicos da Ampla Engenharia
Os procedimentos geotécnicos realizados pela Ampla Engenharia foram em sua
grande parte atividades de estabilização dos taludes. Para o controle da erosão hídrica foi feita
a retificação de uma vala de drenagem que dava acesso à área residencial (área do Lataia) em
1990, por meio da plantação de capim em suas laterais e a cobertura do fundo com pedras ou
calha de cimento. Foram abertas outras valetas de drenagem, no entanto restritas à área
residencial.
A estabilização de taludes e encostas foi feita por meio do plantio do capim quicuio da
Amazônia (Brachiaria humidicola (Rendle) Schweick). Em 1993 a Ampla introduziu o capim
elefante (Pennisetum clandestinum Hochst. ex Chiov.) em associação às demais gramíneas
para verificar sua adaptação e eficácia na contenção dos processos erosivos79. Nos anos de
1994 e 1995 houve a utilização expressiva do capim elefante e do capim gordura (Melinis
minutiflora P. Beauv.).
A única medida de alteração topográfica que consta no Relatório do PRAD da Ampla
de 1995 é o aterramento da área em frente ao escritório, onde havia sido feita uma cava pela
lavra de minério a céu-aberto. No local se formou uma “lagoa” devido o acúmulo das águas
da chuva na cava. A Ampla fez o aterramento desta área com o material dos rejeitos da MNA,
para posteriormente fazer a plantação de espécies arbóreas. A idéia da empresa de
recuperação era dar tratamento paisagístico à área. Este procedimento pode ser considerado de
certa forma ingênuo, pois os rejeitos da mineradora, além de representarem um solo composto
essencialmente por rochas trituradas durante o processo de beneficiamento do minério e
conseqüentemente não possuírem material orgânico necessário para o estabelecimento das
mudas, possui um teor elevado de contaminantes. O mercúrio usado no garimpo e
79 Apesar dos fins experimentais da utilização do capim elefante, a espécie foi plantada em duas áreas que
totalizavam cerca de 600 m².
99
inicialmente pela MNA, juntamente com o cianeto também usado por esta última no
beneficiamento, podem estar presentes nos solos e este deveria ser um ponto considerado pela
Ampla antes de efetuar este procedimento. Além do mais o material oriundo dos rejeitos se
torna posteriormente excessivamente compacto e dificulta o enraizamento das plantas.
Os procedimentos geotécnicos utilizados pela Ampla para conter os processos erosivos
foram basicamente a alteração topográfica (por meio do aterro e criação de plataformas
estáveis no terreno) e o plantio de gramíneas na contenção dos taludes. Ambos procedimentos
são eficazes na redução destes problemas, mas a sua utilização de maneira isolada pode
negligenciar características importantes, e conseqüentemente levar as práticas ao fracasso.
Um fator que contribuiu para a diminuição da qualidade ambiental na área foi a erosão
laminar. A remoção uniforme e significativa das camadas superficiais do solo pela água das
chuvas empobreceu ainda mais os solos e dificultou o estabelecimento de diversas espécies
vegetais. Os métodos geotécnicos utilizados pela Ampla poderiam ter contemplado, inclusive,
estes problemas com a construção de canaletas e redutores da velocidade do fluxo de água
(ALMEIDA, D. 2000; ALMEIDA, R. 2002) na totalidade das áreas sensíveis e não somente
na área residencial. Desta forma poderiam ser reduzidas as perdas de material fértil que se
procederam.
A escolha das gramíneas para a contenção dos taludes e encostas pode ser considerada
de pouca coerência, pois, de acordo com o Instituto Hórus de Desenvolvimento (2003),
espécies como o capim quicuio e o capim-gordura são consideradas invasoras e podem
debilitar uma área. O capim quicuio da Amazônia (Brachiaria humidicola (Rendle)
Schweick) é natural da África e tem por característica invadir áreas abertas de floresta úmidas,
obstruindo e prejudicando a qualidade dos cursos d’água, bem como dificultando o
restabelecimento da vegetação florestal. O capim-gordura (Melinis minutiflora P. Beauv.) é
natural da África e cresce comumente por cima da vegetação herbácea nativa, causa o
100
sombreamento e morte destas, e gera, inclusive, um aumento na temperatura de incêndios.
(INSTITUTO HÓRUS DE DESENVOLVIMENTO, 2003).
- Procedimentos para recuperação dos recursos hídricos da Ampla Engenharia
No relatório de recuperação da Ampla é mencionada a realização da implantação de
drenagens na base e no topo dos taludes em 1990, mas não são mencionados os
procedimentos e técnicas adotados, e tampouco os locais em que foram feitos. O consultor da
Ampla Nelson de Moura Filho, em entrevista no dia 12 de agosto de 2004, esclareceu que os
procedimentos hídricos utilizados compreenderam somente a drenagem dos cursos d’água
para o restabelecimento de seus antigos cursos, não tendo sido contempladas medidas de
descontaminação ou de controle da poluição.
O redirecionamento dos cursos d’água é interessante como forma de restabelecer o
regime hídrico local, mas também pode funcionar como forma de disseminar os
contaminantes na área. Uma contaminação pontual com mercúrio ou cianeto pode adquirir
maiores proporções caso não sejam efetuadas amostragens sobre os teores dos poluentes no
local por onde serão redirecionados os cursos d’água assim como na área total. A utilização
de procedimentos para descontaminação e de controle da qualidade das águas também são
importantes, visto que os recursos hídricos são um dos componentes ambientais
sensivelmente comprometidos pela contaminação por metais pesados e pelos rejeitos da
mineração (OLIVEIRA & LUZ, 2001).
- Procedimentos edáficos da Ampla Engenharia
A Mineração Novo Astro S/A, antes das atividades de exploração, não efetuou
procedimentos que enfocassem a recuperação dos solos ao término dos trabalhos. O
levantamento das características dos solos e do entorno antes da exploração, para possuir
101
referência para a recuperação, não consta que tenha sido feito, e tampouco a retirada e
estocagem do solo orgânico para sua aplicação posteriormente.
A Ampla realizou a cobertura do solo com uma nova camada orgânica fértil em alguns
locais em 1992, como às proximidades da torre telefônica, mas não mencionou qual a
procedência deste material. As práticas de cobertura do local com uma nova camada de solo
fértil têm sido descritas como de grande eficácia no estabelecimento de diversas espécies
vegetais (ALMEIDA, D. 2000; ALMEIDA, R. 2002). Esta prática, contudo, foi realizada em
pequenas áreas, e a atividade das chuvas terminou por remover grande parte deste material (e
com elas grande parte dos nutrientes).
Os procedimentos edáficos utilizados pela Ampla que dizem respeito à aplicação de
fertilizantes e corretivos nos solos foram a adubação direta nas covas de plantio utilizando
uma mistura de NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio) e adubo em uma proporção de 2:1, e
uma posterior readubação ao final dos trabalhos em 1995. Em áreas de mineração, onde os
solos são significativamente fragilizados, talvez seja questionável a realização de somente
uma adubação na cova de plantio. Estudos que analisassem o crescimento e reprodução das
plantas nestes solos, em Lourenço, poderiam conferir respostas mais concisas sobre este
questionamento.
As práticas de manejo dos solos após seu tratamento não foram enfatizadas no
relatório, a única prática mencionada foi o coroamento das mudas, mas não foram citados o
período nem os procedimentos utilizados.
- Procedimentos de revegetação da Ampla Engenharia
A Ampla não cita no Plano de Recuperação de Áreas Degradadas qual método de
revegetação foi adotado, e se estabeleceu algum critério para as atividades. As técnicas para
recuperação, no que se refere à seleção das espécies consistiu na cobertura de grande parte do
102
local com grama São Carlos (Axonopus compressus Beauv.) e a posterior utilização de
algumas espécies arbóreas para melhorar o aspecto paisagístico da área: jambeiro (Syzygium
malaccensis Merr. & Perry), coqueiro (Cocos nucifera L.), cajueiro (anacardium ocidentale
L.) e ipê (Tecoma sp. e Tabebuia sp.)80. A espécie escolhida para a contenção das encostas foi
o capim quicuio da Amazônia.
Apesar de terem sido utilizadas algumas espécies frutíferas e de essências florestais, o
destaque foi o início da utilização de acácias (Acácia mangium Willd.) em 1991. O plantio
desta espécie, de acordo com o relatório da Ampla, foi uma solicitação da CEMA/AP, uma
experiência para verificar a adaptação da espécie. O primeiro resultado do “experimento” foi
o aproveitamento de somente 30% das mudas.
Esta solicitação da própria CEMA/AP para a utilização de acácias, mencionada no
relatório, não parece estar de acordo com o observado, pois além desta não ser uma espécie
regional e, portanto, não recomendada para a recuperação do local (ainda mais por um órgão
ambiental), as negociações com este órgão somente tiveram início em 1992, dada a recente
criação da Coordenadoria em meados de 1991. A fiscalização e controle das atividades ainda
permaneciam sob responsabilidade do IBAMA, a quem havia sido solicitado o segundo
pedido de renovação de Licença de Operação em 1990.
A recuperação da área do pátio de minérios foi feita pelo plantio de mudas de paliteiro
(Triplaris americana L.), jaqueira (Artocarpus heterophyllus Lamk) e fruta-pão (Artocarpus
altilis (Parkinson) Fosberg). A embaúba (Cecropia peltata L.) foi considerada uma espécie de
“boa adaptação”, e passou a ser utilizada com maior freqüência em variados pontos para a
recuperação.
Na face norte do Salamangone, a partir da boca mina (cerca de 4,2 hectares) foram
plantadas 238 mudas de acácia e 215 de paliteiro, que representaram 33% da área total. Os
80 Segundo o relatório da Ampla foi dada preferência à espécies de valor florestal, como: pau d’arco (Tabebuia
impetiginosa (Mart. Ex DC.) Standl.), sucupira (Bowdichia virgilioides Kunth) e acapu (Vouacapoua americana
Aublet).
103
plantios foram realizados em janeiro e fevereiro. As espécies arbóreas foram mais restritas
neste local, com o destaque para algumas mudas de açaí (Euterpe oleracea Mart.), de acácia,
de paliteiro, de eucalipto (Eucalyptus globulus Labill) e de abacaxi (Ananas comosus (L.)
Merril). A Ampla resolveu que, nas áreas em que não fosse bom o aproveitamento das mudas
de acácia, estas seriam substituídas por mudas de paliteiro.
Ao longo das vias de acesso e na área residencial foram plantadas espécies frutíferas
como a laranja (Citrus sinensis L. Osbeck), a acerola (Malpighia glabra Linn.) e a goiaba
(Psidium guajava L.), e espécies de mogno (Swietenia macrophylla King Vell.), embaúba,
breu (Protyum heptaphyllum Marshal) e tachi-branco (Tachigalia Alba Ducke). Contudo, as
mudas de maior número continuavam sendo o paliteiro e a acácia. As espécies arbóreas
utilizadas foram de número restrito e plantadas somente na proximidade destas vias, com o
fim de atribuir alguma qualidade paisagística a uma área significativamente degradada, e que
conseqüentemente acabou funcionando com este mesmo fim, de diminuir de forma pequena o
impacto visual de quem atravessa a área por estas vias.
A escolha das espécies de eucalipto e acácia para o reflorestamento representa um
problema. Ambas as espécies são consideradas pelo Instituto Hórus de Desenvolvimento
(2003) como invasoras. O eucalipto (Eucalyptus globulus Labill.) é natural da Austrália e
Pacífico Sul, tem dominância sobre a vegetação nativa e impede a sucessão de outras
espécies. A acácia (Acácia mangium Willd.) é natural da Austrália e Leste Asiático, ocupa o
espaço de espécies nativas, pode impedir a germinação destas e gera impactos também sobre
o equilíbrio hídrico quando invade ambientes ciliares (INSTITUTO HÓRUS DE
DESENVOLVIMENTO, 2003).
As atividades de plantio da Ampla foram realizadas algumas vezes no período de
estiagem, como foi o caso do ano de 1992. Os plantios feitos durante o período de estiagem
104
(ou de poucas chuvas) não são recomendados para a maioria das espécies arbóreas pela
dificuldade de sobrevivência das mudas durante esta época.
A Ampla procedeu a recuperação e ampliação dos viveiros e a instalação de
sementeiras, como parte de suas técnicas para recuperação. Os trabalhos nos viveiros
consistiram na criação de uma estrutura de acomodação para as mudas, na ampliação das
sementeiras e no melhoramento da via de acesso ao local das mudas.
A tentativa inicial da Ampla em criar um ambiente de maior diversidade de espécies
vegetais, caso houvesse um melhor planejamento, poderia ser associada à criação de
condições para uma suposta fruticultura. O projeto de recuperação, no entanto, terminou por
se constituir basicamente da plantação de gramíneas e acácias, e a utilização de algumas
espécies arbóreas (em sua maioria frutíferas) para diminuir o impacto visual nas áreas,
medidas paliativas em sua maioria. A falta de iniciativas locais em dar continuidade à suposta
tentativa da Ampla em desenvolver uma “fruticultura” na área resultou no descaso e morte de
mais de 50% das espécies frutíferas plantadas.
- Resultados observados do PRAD de 1995
As atividades da Ampla Engenharia, conforme o PRAD da mesma, representaram
medidas de recuperação da paisagem pela alteração da topografia e a utilização de espécies
florestais “paisagísticas” sem o conhecimento da distribuição geográfica e da adaptação das
mesmas. A ausência de um enfoque que abordasse o uso (ou o “não-uso”) da terra pela
população local e suas atividades produtivas comprometeu os resultados esperados do plano
pela Ampla.
A tentativa de recuperação capitaneada pela MNA pode ser resumida em gastos de
pouco retorno, no que tange à eficácia destas medidas. Ao se considerar a intensidade dos
impactos proporcionados pelas atividades de extração mineral e a complexidade das medidas
105
de recuperação para áreas por elas degradadas (SALOMÃO et al., 2002), é possível observar
diversas lacunas.
Em dezembro de 2002 (sete anos após o término das medidas de recuperação), foi
realizada uma viagem de campo com a finalidade de reconhecimento do local e observação do
progresso das medidas de recuperação concluídas em 1995. A observação do local permitiu
constatar que, ao invés da área estar em um estágio avançado de recuperação, encontrava-se
sensivelmente fragilizada.
O fato da entrada dos garimpeiros e da realização de seus trabalhos na antiga área da
mineradora após a saída desta contribuiu para a nova fragilização do local. O trabalho dos
garimpeiros, no entanto, limitou-se a algumas áreas, e ainda existiam “remanescentes” de
áreas onde a recuperação pela Ampla foi efetuada e não houve a exploração mineral por parte
dos garimpeiros. Nestas áreas remanescentes o que se pôde observar foi a parca evolução das
medidas de recuperação.
A presença marcante nas áreas consideradas “remanescentes” foram as gramíneas. Na
área do Lataia as espécies arbóreas utilizadas estavam em estado adiantado de crescimento.
Os eucaliptos e a acácias também possuíam relativa freqüência. A presença arbórea ao longo
das vias de acesso no Lataia foi clara, no que diz respeito às metas paisagísticas, o que não
ficou evidente foi a presença das espécies além desta linha. O viveiro de mudas deixado ao
final dos trabalhos da Ampla estava abandonado e significativamente destruído81.
O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas apresentou, desta forma, vários pontos
em que as medidas utilizadas foram insuficientes para alcançar as metas pré-estabelecidas. A
CEMA e os demais órgãos ambientais que estiveram presentes no decorrer do processo, no
entanto, fiscalizaram e aprovaram todas as medidas. A falta de experiência da CEMA na
81 Conforme o relatório da ampla, o viveiro foi sempre adequadamente cuidado e comumente inseridas novas
espécies, contudo, grande parte delas não eram utilizadas, visto que a quase totalidade dos procedimentos
envolvia a plantação de gramíneas e acácias. O que nos resta é fazer a pergunta: se as mudas não seriam
utilizadas, qual era a finalidade de manter o viveiro com uma maior diversidade de espécies pela Ampla? Devido
à fiscalização?
106
época pode ter influenciado nas decisões. Alguns dos fatores que certamente marcaram a
ineficácia do PRAD foram a inexistência de metas claras de atuação para o plano e o
desconhecimento sobre a realidade local de Lourenço.
A falta de experiência da CEMA/AP diz respeito ao curto período de atuação do órgão
na época, considerando sua instituição como coordenadoria somente em 1991, quando a
Mineração Novo Astro S/A já vinha desenvolvendo oficialmente suas atividades de
exploração desde 1986. A maior prática dentro do processo de licenciamento e fiscalização de
empreendimentos potencialmente degradadores do meio ambiente confere decisões mais
acertadas ao órgão ao tratar das exigências regulamentares básicas de um plano de
recuperação. O caráter recente do órgão, no entanto, não é um indicador eficaz para a resposta
aos problemas envolvendo a aprovação e fiscalização do PRAD, visto que a eficiência não
está somente ligada ao tempo de atuação de um órgão, mas à capacidade do pessoal alocado
no interior do órgão e detentores de poder de decisão.
Ademais, o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, no que se refere
aos seus integrantes capacitados, ainda que não corresponda à sua alçada, considera as
medidas de recuperação concluídas em 1995 de grade êxito. O antigo chefe do DNPM de
Macapá, José Guimarães, em entrevista realizada no dia 09 de agosto de 2004, ressaltou a
execução plena do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas. O problema, de acordo com o
entrevistado, teria sido a exploração do local novamente pelos garimpeiros após a saída da
MNA, com a conseqüente degradação do meio ambiente.
Os garimpeiros que trabalhavam em 1995 em Lourenço ou que ainda permanecem
com suas atividades no local acreditam que o problema não tenha sido somente culpa deles.
Eles aceitam a responsabilidade da degradação de algumas áreas por sua lavra, mas
consideram que as medidas de recuperação utilizadas pela Ampla foram isoladas e sem
107
importância. O ex-garimpeiro Enildo Silva82, que trabalhava para a Mineração Yukio
Yoshidome na área de Lourenço, ressalta que as únicas plantas que observava serem
plantadas eram acácias e eucaliptos. O entrevistado lembrou que a Ampla pouco mantinha
contato com os garimpeiros, realizando seus trabalhos paralelamente às atividades no
garimpo.
A Ampla Engenharia realizou a recuperação das áreas degradadas pela MNA com
vista à rápida cobertura do local com vegetação, para minimizar o impacto visual do local. A
recuperação foi para cumprir as exigências legais. Este procedimento, sem observar as
características sociais e econômicas locais, evoluiu para o retorno da degradação em pouco
tempo.
A falta de informações sobre o uso da terra no local e o relacionamento destas com as
atividades garimpeiras terminou por impedir que a Ampla tivesse uma visão completa sobre a
realidade local e a possibilidade de eficácia das medidas por ela escolhidas para realizar a
recuperação das áreas degradadas. O estreitamento das relações entre a empresa de
recuperação, os garimpeiros e a população locais poderia contribuir para a diminuição destas
divergências, no que se refere à escolha de medidas baseadas nos interesses dos garimpeiros e
da população.
3.1.2 O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas de 2003
O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas elaborado em 2003 a partir do Termo
de Ajustamento de Conduta assinado pela MNA, COOGAL, DNPM, SEMA e Ministério
Público Federal foi realizado novamente pela Ampla Engenharia. O PRAD foi elaborado a
partir do Termo de Referência (TR) fornecido pela SEMA/AP em dezembro de 2002 (Anexo
02). No TR constam cinco atividades fundamentais a serem realizadas para a elaboração do
82 Entrevista realizada no dia 29 de setembro de 2004 em Calçoene, durante viagem de campo.
108
PRAD: a descrição do empreendimento; o diagnóstico ambiental; a legislação pertinente; os
impactos ambientais e o plano de recuperação. A descrição do empreendimento compreende
as informações gerais da empresa de exploração e a caracterização do empreendimento, como
a área da jazida, o tipo de minério e o volume extraído. As recomendações para o diagnóstico
ambiental são as definições das áreas de influência direta e indireta, com as descrições dos
meios físico (climatologia, geologia, geomorfologia, edafologia e hidrologia), biótico
(caracterização da fauna e flora) e antrópico (dinâmica populacional, uso e ocupação do solo,
atividade econômica e caracterização da população residente). A legislação pertinente
compreende a descrição da legislação ambiental Federal, Estadual e Municipal envolvida na
atividade. Os impactos ambientais e o Plano de Recuperação compreendem a descrição e
localização das áreas de exploração em mapa, o sistema de disposição final dos resíduos, o
PRAD (com as metodologias e atividades a serem desenvolvidas), e o cronograma físicofinanceiro
de implementação do projeto.
O diagnóstico ambiental realizado pela Ampla elegeu como áreas de influência direta
a área onde está sendo executada a lavra e as demais áreas das portarias de lavra 291 e 292/86,
e as áreas de influência indireta como o Município de Calçoene e áreas circunvizinhas. A
empresa realizou uma descrição do meio físico (a climatologia, a geologia, a geomorfologia e
a hidrologia local) baseada em estudos anteriores efetuados na região amazônica e na capital
do Município, Calçoene. A descrição da fauna e flora local, feita pela Ampla, resumiu-se a
uma descrição sucinta de algumas espécies dominantes já descritas na literatura (PRADMNA,
2003). A descrição do meio antrópico foi a partir da elaboração de um histórico dos
acontecimentos no Município, e um levantamento do uso e ocupação do solo, dos aspectos
econômicos locais, e das condições de saúde e educação atuais.
O diagnóstico ambiental foi feito por meio de descrições sucintas e generalistas, e
como não há o registro de estudos específicos sobre a composição faunística e florística em
109
Lourenço, os dados coletados pela Ampla foram oriundos de pesquisas no território do
Amapá e extrapolados para o local. Desta forma, este diagnóstico se compôs basicamente da
repetição de dados de outras pesquisas já realizadas, só que não especificamente na área de
Lourenço, mas na região amazônica e no Município de Calçoene. Este procedimento,
dependendo da heterogeneidade da região, pode apresentar uma elevada margem de erro e
tornar a elaboração do plano de recuperação com maiores chances de não contemplar as
necessidades do meio ambiente.
A legislação ambiental pertinente foi tratada pela Ampla ao final do PRAD, onde foi
citado um rol de Leis e Decretos e descritas suas disposições. A legislação foi somente
descrita e não debatida sobre as implicações à atividade e que medidas deveriam ser tomadas,
exceto a Resolução CONAMA n°237 de 1997 que trata sobre o licenciamento das atividades
potencialmente degradadoras do meio ambiente.
Os impactos ambientais das atividades foram descritos pela empresa como alterações
da qualidade do ar e geração de ruídos, alterações da morfologia do relevo e da paisagem. Os
impactos ambientais atuais foram relacionados à atividade garimpeira. Os impactos
socioeconômicos foram pontuados em positivos e negativos, os positivos foram a geração de
emprego e renda, melhorias no setor de saúde e educação, na capacitação e qualificação da
mão-de-obra, na oferta e demanda de bens e serviços, nas relações sociais internas e externas,
nas formas de lazer e de trabalho, e na formação cultural da população.
A definição de impactos positivos feita pela Ampla não levou em consideração que a
situação não era a implantação de um empreendimento de extração mineral e sim o seu
fechamento, que já havia ocorrido em 1995. A geração de emprego e renda não pode ser aqui
considerada. As melhorias no setor de saúde e educação e nas formas de lazer e trabalho
perdem significado se forem recordados o desmonte e abandono da infraestrurura outrora
realizada pela MNA. Quanto à melhora na formação cultural da população mencionada pela
110
Ampla, convém lembrar que não se pode “melhorar” a cultura da população, e sim interferir
nesta por meio de ações nos setores educacionais, econômicos e na organização social, e que
este não foi o observado em 2002 após sete anos do término das atividades da Mineração
Novo Astro S/A.
Os únicos pontos negativos mencionados pela Ampla Engenharia foram a alteração da
paisagem e o comprometimento da qualidade das águas. A identificação de somente dois
pontos negativos é negligenciar completamente o caráter modificador e gerador de inúmeros
impactos negativos da mineração, além de esquecer a situação de fragilidade por que passava
a área (recuperada insuficientemente e explorada novamente).
A descrição do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas solicitado no TR pela
Ampla foi feita em um Tomo separado, onde foram identificadas as áreas degradadas e as
medidas de recuperação a serem efetuadas. De acordo com a Ampla, as propostas tiveram sua
fundamentação e sustentação técnica no diagnóstico ambiental efetuado pela mesma. A
metodologia para a elaboração do PRAD se fundamentou em uma análise de contextos
relacionados ao passado, presente e futuro do local, e contemplou aspectos econômicos e
sociais para esta elaboração. Desta forma, a Ampla concluiu que a recuperação do local
contemplaria a criação de um projeto de recuperação ambiental associado a uma atividade
produtiva, que pudesse oferecer uma alternativa econômica após a exaustão da jazida.
A Ampla considerou como degradadas sete áreas: a área da cava, onde foi realizada a
lavra a céu-aberto; as pilhas de estéril; a barragem de rejeito; as estradas e caminhos de
serviço; as áreas erodidas, consideradas oriundas da supressão da vegetação para exploração
de minério; as áreas de beneficiamento; e a estrutura de apoio, onde se localiza a sede da
COOGAL.
As atividades de recuperação, no entanto, não podiam ser realizadas em todas as áreas
devido a execução dos trabalhos de exploração da COOGAL. A partir do conhecimento sobre
111
as áreas utilizadas pelos garimpeiros, a Ampla dividiu suas atividades em ações de curto,
médio e longo prazo, conforme os garimpeiros fossem terminando suas atividades.
A área total definitivamente designada à recuperação foi agrupada em oito blocos,
onde quatro deles foram realizadas recuperações imediatas (contemplados com as ações de
curto prazo), e os restantes serão recuperados posteriormente com a saída dos garimpeiros
(ações de médio e longo prazo) (Figura 17).
112
Fonte: Plano de Recuperação de Áreas Degradadas da Ampla Engenharia. 03.2003.
Figura 17 – Croqui das áreas de recuperação do segundo PRAD da Ampla Engenharia.
113
Os hectares não recuperados de cada uma das oito áreas, segundo o relatório da
Ampla, tratam-se de estradas e vias de acesso. As oito áreas recuperadas foram assim
definidas:
- Área 01 – área do viveiro, totalizando 16,55 hectares, dos quais 13,93 foram
efetivamente plantados.
- Área 02 – área do antigo matadouro da MNA, totalizando 8,38 hectares, dos quais
7,63 foram efetivamente plantados.
- Área 03 – área do Labourie, totalizando 57,80 hectares, dos quais 52,80 foram
efetivamente plantados.
- Área 04 – área do Igarapé Lourenço, totalizando 10,91 hectares, dos quais 10
foram efetivamente plantados.
- Área 05 – área do Mutum, totalizando 1,38 hectares, todos definidos a serem
plantados.
- Área 06 – área do Igarapé Limão, totalizando 8,29 hectares, dos quais 5,79 foram
efetivamente plantados.
- Área 07 – área industrial, totalizando 40,27 hectares, dos quais 35,77 foram
efetivamente plantados.
- Área 08 – área da planta sul, totalizando 28,41 hectares, dos quais 25,41 foram
efetivamente plantados.
- Procedimentos geotécnicos da Ampla engenharia
O Plano de Recuperação das Áreas Degradadas de 2003 menciona a presença de áreas
erodidas e instáveis, mas não apresenta em nenhum momento medidas para o controle destas.
A alteração topográfica, a estabilização de taludes e encostas e o controle da erosão não foram
114
citados no PRAD. A partir daqui podemos esperar a continuidade, o aumento das áreas
fragilizadas pela erosão e o empobrecimento cada vez maior do solo.
- Procedimentos para recuperação dos recursos hídricos da Ampla Engenharia
As atividades de reabilitação dos recursos hídricos executada pela Ampla objetivaram
o redimensionamento e o redirecionamento dos cursos d’água das áreas envolvidas. Os
recursos haviam sido assoreados, soterrados e seu percurso alterado, e as medidas foram a
definição de um novo traçado, a criação de barragens de acumulação e o dimensionamento de
calhas. O PRAD previa também a montagem sobre os cursos d’água reabilitados de uma rede
de monitoramento.
As quatro áreas em que foi realizada a recuperação a curto prazo foram contempladas
as ações de definição de um novo traçado aos cursos d’água, a criação de barragens de
acumulação e o dimensionamento de calhas. A rede de monitoramento dos cursos d’água foi
feita por meio de pontos de coleta periódicos alocados junto à montante (barragens de
acumulação) e à jusante (limite de influência direta).
A contaminação dos recursos hídricos com mercúrio e cianeto foi um ponto
novamente negligenciado no PRAD de 2003. O redimensionamento e o redirecionamento dos
cursos d’água pode gerar a dispersão de poluentes em uma área. Para tanto, são necessários
estudos aprofundados sobre a quantidade das substâncias poluentes presentes não só na água,
mas também no solo, para que o procedimento adotado pela empresa não gere mais
contaminação.
A Ampla Engenharia deveria realizar uma análise sobre a dispersão do mercúrio em
um variado número de amostras, e em locais mais afastados do garimpo para conhecer a
dispersão do poluente. A empresa chegou a realizar amostragens no local, no entanto, foram
somente três (Labourie, Igarapé Limão e Igarapé Lourenço) para análise da contaminação das
115
águas, o que inviabiliza conhecer a dispersão de um poluente na área. As atividades de
redirecionamento dos cursos d’água realizados pela Ampla pode, desta forma, aumentar a
disseminação de substâncias tóxicas presentes no solo para outros locais83.
- Procedimentos edáficos da Ampla Engenharia
Os procedimentos edáficos resumiram-se na aplicação de fertilizantes ou corretivos e
na utilização de algumas medidas de manejo dos solos. Foram utilizados dois tipos de
substratos para a produção de mudas, um para as sementeiras e outro para os sacos plásticos.
O primeiro foi composto de areia lavada e pó de serragem na proporção de 1:1, e o segundo
de 60% de solo, 20% de esterco e 20% de pó de serragem. A adubação foi feita, assim como
no PRAD de 1995, diretamente nas covas com a mistura da camada superficial do solo da
cova. A adubação foi definida de acordo com a técnica de reflorestamento a ser utilizada. As
áreas em que fossem efetuados reflorestamentos com objetivos agroflorestais seriam
utilizados esterco de boi e de galinha em associação a superfosfato triplo, nas áreas em que
fossem efetuados reflorestamentos de essências nativas seria utilizado o esterco de boi e de
galinha em associação ao NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio).
A Ampla não executou amostragens dos solos para análise das características físicas e
químicas, e portanto não tem como saber se a metodologia escolhida e utilizada será eficaz
para a área.
As práticas de manejo dos solos foram feitas a partir do combate às formigas, o
coroamento das mudas e a roçada para áreas onde a vegetação rasteira e/ou arbustiva for
densa. Porém, a empresa não determinou o período de tempo em que serão feitos os
coroamentos e roçadas.
83 O estudo de Veiga & Baker (2003) mostra pontos significantes sobre o ciclo do mercúrio, a contaminação do
meio ambiente e do homem, as complicações orgânicas decorrentes de sua absorção, e as alternativas para a
diminuição da poluição no garimpo.
116
- Procedimentos de revegetação da Ampla Engenharia
A área total degradada foi dividida pela empresa em três grandes áreas, cada qual com
procedimentos diferentes a serem realizados. O primeiro grupo seria recuperado pelo método
denominado “indução, condução e manejo da regeneração e sucessão natural”, que consistia
no plantio de espécies arbóreas nativas. No segundo grupo seria utilizado o método de
“aproveitamento econômico e sistemas agroflorestais comerciais e de subsistência de
produção”, com o plantio de espécies de “valor econômico” e pertencentes à área. O terceiro
grupo não seria contemplado pela recuperação por se tratar da cava a céu-aberto.
As atividades de “indução, condução e manejo da regeneração e sucessão natural”
abrangeram somente 8,37% (12,79 hectares) da área total a ser recuperada (152,71 hectares),
e foram incluídas nas “ações de longo prazo”, sendo prescritas a serem realizadas na área do
Mutum (área 05) e em 11,41 hectares da área da planta sul (área 08).
A Ampla escolheu seis espécies para realizar as atividades de “indução, condução e
manejo da regeneração e sucessão natural”: acapú (Vouacapoua americana Aublet), angelim
(Hymenolobium excelsum Ducke e H. petraeum Ducke), cedro (Cedrela odorata L.), faveira
(Vatairea spp.), freijó (Cordia goeldiana Huber) e morototó (Didymopanax morototoni
(Aubl.) Decne. & Planch). Para as atividades de “aproveitamento econômico e sistemas
agroflorestais comerciais e de subsistência de produção” foram escolhidas tão somente quatro
espécies: açaí (Euterpe oleracea Mart.), cupuaçu (Theobroma grandiflorum (Willd. Ex
Spreng.) Schum), andiroba (Carapa guianensis Aubl.) e mogno (Swietenia macrophylla King
Vell.).
As espécies escolhidas pela Ampla para a primeira atividade, como se pode observar,
são todas de potencial madeireiro. O acapú atinge a altura de 15 a 30 metros e pode ser
empregado como marcenaria de luxo e em construções civil ou naval, como vigas e ripas. O
angelim é uma árvore de grande altura e que atinge o teto das florestas, tem diversos usos
117
como na construção civil e naval, marcenaria, estacas, esteios etc. O cedro tem altura
aproximada de 20 a 35 metros e é utilizado na fabricação de compensados, esculturas,
molduras, instrumentos musicais e carpintaria em geral. As faveiras atingem de 20 a 30
metros e são utilizadas na construção civil, de chapas, assoalhos e na marcenaria. O freijó é
uma madeira de retrabilidade baixa, e por isso indicada para móveis finos, lambris, painéis,
caixilhos, persianas, acabamento interno, estrutura de hélices de avião etc. O morototó possui
de 20 a 30 metros de altura e é freqüentemente usado na fabricação de caixas, compensados,
faqueados, palitos de fósforos, instrumentos musicais, cabos de vassoura, carpintaria,
marcenaria etc. Estas espécies também são utilizadas na recuperação de áreas e paisagismo,
mas normalmente em associação a um maior número de espécies (MADEIREIRA
GUMARÃES, 2004).
As espécies utilizadas pela Ampla para a recuperação agroflorestal são frutíferas e de
potencial madeireiro. O açaí é uma palmeira que ocorre mais particularmente em áreas de
várzea ou com solos de elevada umidade e com regime de inundações (OLIVEIRA, 2000). O
cupuaçu atinge de 4 a 8 metros de altura, ocorre na região amazônica e deve ser plantado em
consórcio com outras plantas como a palmeira, pois necessita de sombra para sobreviver,
principalmente nas primeiras fases do crescimento (SILVA & TASSARA, 1996). A andiroba
é uma árvore de grande porte e crescimento rápido, chegando a atingir até 30 metros, ocorre
preferencialmente em regiões alagadiças e áreas de várzea, é usada na construção civil e
fabricação de móveis, caixas de embalagem, acabamentos internos de barcos e navios etc.
(MADEIREIRA GUIMARÃES, 2004). O mogno possui altura entre 25 a 30 metros, é
bastante resistente, sendo utilizado em mobiliário de luxo; pode ser utilizado também no
paisagismo e na arborização de parques e centros urbanos (MADEIREIRA GUIMARÃES,
2004).
118
- Resultados observados do PRAD de 2003
O andamento dos trabalhos de recuperação observado durante viagem de campo em
março de 2004 foi o de que os procedimentos de revegetação e de redirecionamento dos
cursos d’água estavam sendo realizados. As áreas do matadouro, do viveiro e do igarapé
Lourenço já estavam revegetadas, e a área do Labourie estava em fase de conclusão. A
revegetação contava com a adubação exclusivamente na cova de plantio.
Durante o ano de 2003 e no primeiro semestre de 2004 a Ampla recuperou as quatro
primeiras áreas pré-determinadas e, como eram áreas que haviam sido escolhidas para a
recuperação “agroflorestal”, foram utilizados o açaí, o cupuaçu, o mogno e a andiroba (Figura
18). O sistema de trabalho nas quatro áreas destinadas à recuperação abordou uma área por
vez, que foi inicialmente preparada, capinada, abertas vias de acesso e posteriormente
plantada e adubada. A primeira área a ser trabalhada foi a do matadouro (área 02), a segunda a
do Lataia (área 01 – área do viveiro), a terceira a do Igarapé Lourenço (área 04) e por fim a do
Labourie (área 03) (Figura 19).
Figura 18 – mudas de açaí e de cupuaçu (ao centro) a serem utilizadas pela Ampla.
Foto: Bernard Peregovich. 04.2004
119
Figura 19 – Área do Labourie a ser recuperada.
A área do Labourie é onde estão localizadas as antigas bacias de tratamento de minério
da Mineração Novo Astro S/A, e foi a última a ser recuperada. A área se encontra
sensivelmente fragilizada (Figura 19) e seriam necessárias medidas mais consistentes como o
recapeamento do solo e a realização de procedimentos para o controle da erosão, e não
somente a adubação e plantio que foram executados. A área foi considerada pelo consultor da
Ampla Marcos Morasche84 como de difícil recuperação com poucos recursos, devido a
extrema compactação do solo e elevada quantidade de contaminantes. O entrevistado foi
responsável pela recuperação das três outras áreas85.
Na área do Labourie foram utilizadas mudas de açaí em sua grande maioria, em
associação à adubação com esterco e superfosfato triplo. A sobrevivência e a adaptação das
mudas serão difíceis dadas as condições do local e a falta de medidas de recuperação mais
consistentes (Figuras 20 e 21).
84 Entrevista concedida no dia 01 de outubro de 2004.
85 A MNA não teria repassado recursos suficientes para a recuperação da área do Labourie e a adequação local
ficaria comprometida. Desta forma, o entrevistado não pretendeu responsabilizar-se por esta recuperação.
Foto: Bernard Peregovich. 04.2004
120
Figura 20 – Preparação de estacas para a plantação de mudas de açaí na área do Labourie.
Figura 21 – atividades de reflorestamento na área do Labourie
Os plantios da Ampla foram iniciados no período de chuvas, no entanto, a área do
Labourie, que apresentava maiores problemas, começou a ser reflorestada no final da estação
Foto: Bernard Peregovich. 04.2004.
Foto: Bernard Peregovich. 04.2004.
121
chuvosa. A conseqüência destas medidas foi a elevada taxa de mortalidade das mudas,
ultrapassando 70% (Figura 22).
Figura 22 – Área do Labourie em setembro de 2004, após a recuperação.
As demais áreas recuperadas também apresentaram níveis elevados de mortalidade das
mudas, porém menores que da área anterior (Figura 23). As áreas do viveiro e do matadouro
(áreas 01 e 02) são mais afastadas das áreas de lavra e não recebiam material dos rejeitos e
consequentemente apresentaram maior aceitação das mudas utilizadas.
Foto do autor. 09.2004.
122
Figura 23 – Área do matadouro em setembro de 2004.
As espécies utilizadas nas áreas do matadouro e do viveiro, no entanto, apresentaram
crescimento reduzido e uma significativa secagem das folhas (Figuras 24 e 25). Estes
problemas podem estar relacionados à baixa quantidade de nutrientes presentes no solo, e à
sua excessiva compactação em variados locais. A baixa sobrevivência das mudas de cupuaçu
também pode ser associada às características particulares da espécie, por necessitar de sombra
para o crescimento e desenvolvimento.
Foto do autor. 09.2004.
123
Figura 24 – Muda de cupuaçu presente no local.
Figura 25 – Muda de açaí presente na área do matadouro.
Foto do autor. 09.2004.
Foto do autor. 09.2004.
124
As novas tentativas de recuperação em Lourenço alcançaram resultados pouco
animadores. Apesar do objetivo de criar sistemas agroflorestais de produção, o êxito das
medidas vai além da simples tentativa. As características do meio ambiente degradado não
permitiram o estabelecimento das mudas, e entre as remanescentes resta a pergunta de se
serão capazes de chegar à idade adulta e se poderão gerar frutos comercializáveis e em grande
quantidade.
O segundo Plano de Recuperação de Áreas Degradadas da Mineração Novo Astro S/A
– MNA elaborado pela Ampla Engenharia foi submetido à aprovação da SEMA/AP em março
de 2003. Contudo, o plano foi aprovado e não foi referida nenhuma medida por parte da
SEMA que objetivasse algum tipo de mudança no escopo do PRAD. O órgão efetuou o
acompanhamento e a fiscalização das atividades de recuperação durante todo o processo,
realizando visitas ao local de quatro em quatro meses aproximadamente. A SEMA/AP
conhecia os problemas apresentados pelas atividades de recuperação em Lourenço, mas
demonstrava aceitação e compreensão dos resultados86. O elevado número de problemas da
localidade e a situação dos trabalhos no garimpo contribuíam para a compreensão destes
resultados.
86 Entrevista realizada com o chefe do departamento de licenciamento Rildo Amanajás em novembro de 2004.
125
3.2 AVALIAÇÃO DO CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO NA IMPLEMENTAÇÃO DOS
PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS EM LOURENÇO
Em Lourenço, os atores que influenciam no processo decisório e que estão
relacionados às atividades de mineração e garimpagem, bem como à fiscalização ambiental e
à execução das exigências ambientais legais são o Ministério Público Federal, o Ministério
Público Estadual, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a Secretaria de
Estado do Meio Ambiente (SEMA), o Governo Estadual do Amapá (GEA), a prefeitura
Municipal de Calçoene, a Mineração Novo Astro S/A – MNA, a Cooperativa de Garimpeiros
de Lourenço (COOGAL), a Ampla Engenharia (responsável pelo PRAD) e a população local.
Estes atores atuam e interferem na determinação e implementação das políticas no
local por meio de seus interesses, seja favorecendo ou dificultando situações ou determinando
diretamente a escolha de políticas que favoreçam ou beneficiem o local.
O Ministério Público Federal atua em causas em que estejam em discussão bens,
serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas e empresas públicas federais. O
Ministério Público Estadual atua em questões em que estejam envolvidos os interesses do
Estado e suas autarquias. (MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, 2005; MINISTÉRIO
PÚBLICO ESTADUAL DO AMAPÁ, 2005). O Departamento Nacional de Produção
Mineral (DNPM) está vinculado ao Ministério de Minas e Energia – MME e tem por
finalidade promover o planejamento e o fomento da exploração mineral e do aproveitamento
dos recursos minerais (REGULAMENTO DO DNPM, 2003).
A Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amapá (SEMA/AP) atua na formulação,
coordenação e execução da política ambiental do Estado, sendo responsável pelo
fornecimento do Termo de Referência para a empresa que elaborará e efetuará o Plano de
126
Recuperação de Áreas Degradadas, pela análise e aprovação do PRAD elaborado, e pela
fiscalização do cumprimento das medidas prescritas neste.
O Governo do Estado é o representante dos direitos da sociedade, e interfere
diretamente na escolha de medidas que privilegiem a população e o meio ambiente ou os
demais agentes, como empresas de exploração. A Prefeitura Municipal de Calçoene é a
instância representativa a nível Municipal, e que está mais intimamente envolvida com os
problemas de Lourenço. A prefeitura de Calçoene, assim como os vereadores locais,
representam os interesses da população local e são os responsáveis por sugerir e implementar
medidas que beneficiem tanto a população quanto a região. Estes órgãos são responsáveis
pela formulação e implementação de políticas que visem o desenvolvimento local, o
atendimento de necessidades da população e a manutenção da qualidade do meio ambiente.
Para tanto, têm função de fazer valer a reabilitação local e medidas de recuperação de áreas
ambientais degradadas ou contaminadas, de modo a melhorar a qualidade de vida e gerar
benefícios locais.
A lógica de atuação do poder público, ou do papel do Estado nesta temática, parte da
idéia da criação de mecanismos vantajosos para o surgimento e/ou reprodução e continuidade
de certos sistemas dentro de seu contexto de atuação (FIORI, 1992). O beneficiário nesta
criação de vantagens dependerá do alvo que se quer atingir com as medidas, e da elaboração e
implementação destas. No entanto, nem sempre haverão somente beneficiários com tais
medidas, podem ser gerados prejuízos a alguns atores, inclusive àqueles a quem deveriam ser
beneficiados. As políticas implementadas também podem simplesmente ser ineficazes em sua
atuação, seja pelo desconhecimento destas características particulares ou pela inexperiência na
elaboração ou na implementação destas políticas.
As políticas envolvem, aqui, como em Silva & Pedone (1987), a linha de ação
escolhida e orientada a um determinado fim, onde a formulação das políticas prescreveria os
127
objetivos ou metas a se atingir. Um dos fatores determinantes neste processo, inclusive, é a
“ação” ou a “não-ação” dos formuladores de políticas, considerando que assim como estes
podem ter atitudes de agir e protelar medidas, também podem se abster de atuar. O
conhecimento desta totalidade de componentes proporciona decisões mais acertadas acerca do
futuro de uma região e as medidas que serão implementadas.
A compreensão a respeito das políticas, de seus mecanismos e dos acontecimentos que
envolveram as tomadas de decisões, desta forma, representa o passo inicial para o
entendimento do processo político-decisório que se estabeleceu em Lourenço. Silva & Pedone
(1987) conceituam políticas públicas como um processo com diferentes fases. Os autores
descrevem cinco fases associadas à questão da política: a formação de assuntos públicos e de
políticas públicas; a formulação de políticas públicas; o processo decisório; a implementação
das políticas; e sua avaliação.
Em Lourenço foram poucas as políticas realizadas com o fim de criar melhores
condições aos recursos naturais ou à população local. Dentro do Município de Calçoene as
práticas são esparsas e dizem respeito a poucos programas, em sua maioria de
complementação educacional.
O papel do poder público, das instituições e da população local simbolizam fatores
capazes de modificar totalmente o direcionamento das políticas. O poder público é aqui
relacionado às instâncias estaduais e municipais possuidoras de poder de decisão na
determinação das políticas e na alocação de recursos à região. A significância do Estado,
como o complexo destas unidades regionais, é referida por Sachs (1999) como ainda
insuficientemente reconhecida e debatida sobre sua margem de atuação. A necessidade de
debates reside no esclarecimento do próprio Estado e dos atores necessariamente a ele
relacionados sobre suas capacidades de ação, atuação e associação dentro do contexto
regional.
128
Este complexo de organizações, conforme Rouchy (2002), deve ser o reflexo de
representações dos intercâmbios e permitir a interiorização de valores por parte dos
indivíduos a que eles pertencem. A interiorização destes valores viria com a aumento da
relação entre a instituição e o indivíduo e a introjeção ou incorporação deste último ao
processo, aliado à construção de uma identidade profissional evolutiva para pensar em
associação com o órgão a abertura a mudanças87. A abertura das instituições a mudanças
determinadas pela ação do indivíduo confere maior resiliência às estratégias estabelecidas de
controle de atividades de degradação do ambiente.
A mudança de abordagem das instituições ainda parece estar longe de acontecer em
Lourenço. O fato observado freqüentemente é a dissociação entre as políticas locais, os Planos
de Recuperação de Áreas Degradadas tiveram seus objetivos delimitados de forma totalmente
paralela a outras políticas e programas do local, e o resultado deste direcionamento foi a baixa
viabilidade dos mesmos e a descrença por parte da população com a atuação do poder público
e a presença de algum tipo de preocupação com Lourenço.
A existência de relações clientelistas e patrimonialistas em Lourenço é outro fator que
contribui para a dissociação entre as políticas e a escolha de alternativas vantajosas somente a
uma minoria.
“Na ausência de estruturas sociais igualitárias e de elites diversificadas, a
autonomia pode conduzir a um progresso econômico agregado, porém não
necessariamente a uma distribuição dos lucros [...], uma estrutura social igualitária
e uma elite coligada podem produzir um desenvolvimento em termos de qualidade
de vida mas, ao mesmo tempo, um crescimento econômico limitado, na medida em
que a autonomia é sacrificada aos interesses da metrópole [...], as estruturas sociais
restritivas, ligações de dependência e elites de compreensão limitada, conflitivas,
resulta em um continuado subdesenvolvimento”. (WALTON, J. apud BOISIER,
1989, p. 60-61).
O patrimonialismo, para Sorj (2000), se caracteriza pela apropriação privada dos
recursos do Estado. A reprodução destas práticas acontece na medida em que esta é
87 Rouchy (2002) considera uma forma de ilusão o fato de conceber as estruturas institucionais e/ou
organizacionais como exteriores aos indivíduos, pois “cada um é o portador, em parte, das estruturas, das normas
e dos valores dos órgãos de onde se vive”.
129
interessante para grupos sociais específicos. O clientelismo, em Carvalho (1997) é
caracterizado como uma relação entre atores políticos que envolve a concessão de benefícios
públicos (como empregos, benefícios fiscais e isenções em troca de apoio político, como o
voto), variando de intensidade conforme o sistema político e a região.
Em Lourenço as relações entre os garimpeiros, o poder público e o DNPM se
estabeleceram freqüentemente de acordo com os interesses de uma minoria privilegiada. Os
acontecimentos que marcaram o processo histórico local tiveram uma forte influência de
práticas clientelistas. A tomada de decisões da própria cooperativa foi na maioria das vezes
com o fim de beneficiar a classe dos “investidores”, da qual faziam parte o presidente, vicepresidente
e secretários. As relações dentro do próprio garimpo se baseavam no privilégio
quase exclusivo de uma classe e de alguns indivíduos que adquiriram influência no local, seja
por suas posses ou por uma história de práticas de violência.
A prática de clientelismo não se restringe ao garimpo. A relação entre o governo do
Estado e a Mineração Novo Astro, ao considerarmos a saída da empresa e a tentativa de
liberação de suas obrigações com o passivo ambiental por parte do governo, não deixa de
representar uma concessão de privilégios. O descomprometimento do governo com a
legalização da cooperativa (que só foi oficializada em 2002), e a tolerância adotada pelo
DNPM frente às atividades ainda irregularidades da mesma nos remete a idéia de um certo
protecionismo à antiga diretoria da COOGAL (que foi deposta em 2004 por desvio de
dinheiro e substituída com novas eleições – devido a intervenção do Ministério Público
Federal). A SEMA por sua vez, no que diz respeito à fiscalização dos PRADs, agiu de
maneira omissa às falhas presentes nos planos de recuperação e na implementação destes.
Resta saber as probabilidades de mudanças desta estrutura já estabelecida e do maior
comprometimento da população, do poder público, das instituições e órgãos ambientais com a
situação de Lourenço.
130
3.3 TENDÊNCIAS FUTURAS PARA O LOCAL
A criação de políticas e a tomada de decisões pode ter a meta do desenvolvimento
regional, no que se refere ao desenvolvimento para Boisier88, mas a grande parte delas podem
ser questionadas ao se observar a situação do Distrito de Lourenço no Amapá. A eficácia de
medidas que buscam o desenvolvimento não deve estar associada à percepção de
características isoladas do local, mas à totalidade de componentes que podem interagir e
modificar os processos outrora observados, pois mesmo que as primeiras apresentem êxito,
este será somente parcial89 (HALL, 1997). Boisier (1996) considera que o desenvolvimento
de um território organizado depende da existência, articulação e manejo de seis elementos:
atores, instituições, cultura, procedimentos, recursos e entorno. O desenvolvimento, de acordo
com o autor, vem de uma interação inteligentemente articulada entre estes componentes.
O conhecimento dos atores e das categorias que regem suas condutas permite
compreender a estrutura do poder local e a demanda dos diferentes setores, de modo a poder
articular mecanismos que envolvam os interesses coletivos. O conhecimento sobre as
instituições e sua institucionalidade permite avaliar a capacidade destas em aprender e
estabelecer articulações com outras instituições, e sua capacidade de se reajustar à realidade
instável do ambiente. O conhecimento dos padrões culturais diz respeito à identificação da
sociedade com seu próprio território. Os procedimentos se referem à natureza da gestão do
governo territorial. Os recursos dizem respeito aos recursos materiais (equipamento de infraestrutura,
recursos naturais e de capital), aos recursos humanos (relacionados à sua qualidade,
vinculação regional e contemporaneidade), aos recursos psicossociais (autoconfiança e
vontade coletiva, perseverança, consenso), e aos recursos do conhecimento (em termos de
88 Ver Boisier (1989).
89 Hall (1997) considera, como exemplo, que as políticas de conservação biológica implementadas nas décadas
de 1970 e 1980 na forma de parques ambientais têm variado em sua eficácia, e quando exitosas, representam
somente uma solução parcial para o problema da degradação ambiental.
131
conteúdo e significado). O entorno seriam os demais fatores a que não se tem controle e com
quem a região se articula necessariamente (BOISIER, 1996).
Segundo Haddad (1996), as atitudes a serem executadas que visem a real modificação
e desenvolvimento de uma região devem envolver mudanças estruturais que não sejam
passageiras, a partir de uma visão coerente tanto do processo de desenvolvimento
socioeconômico e dos condicionantes e restrições político-institucionais quanto das ações e
medidas a serem adotadas pelos segmentos públicos e privados para melhoria das condições
de vida da população.
Os programas hoje observados para o Estado do Amapá, apesar de excessivamente
pontuais, representam um grande passo inicial, caso seja considerada a possibilidade de nãoação
dos atores, como lembram SILVA & PEDONE (1987). O PRAD, como exigência para a
recuperação das áreas degradadas em Lourenço, é uma medida que busca a melhora da
qualidade de vida e do meio ambiente, e pode funcionar como uma prática com o fim de
auxiliar no aumento do bem-estar humano local. O auxilio no crescimento local pode partir da
premissa da utilização de técnicas de recuperação que conciliem o desenvolvimento
sustentável, na associação de benefícios econômicos e ambientais. O bem-estar humano seria
a conseqüência da utilização eficaz destas medidas sustentadas.
Esta sustentabilidade, para Sachs (1986), não está relacionada a um retorno a antigas
práticas, mas a atitudes que possam repensar os sistemas de produção em termos
ecologicamente viáveis, baseados nas conquistas da ciência e com o auxílio de ‘estratégias de
ecodesenvolvimento’. O pensamento dentro desta linha de raciocínio traz a idéia sobre a
necessidade da existência de reformas institucionais que possam eliminar relações de
produção anacrônicas e valorizem os recursos específicos de cada local, tendo como
alternativas implícitas o uso de técnicas ecologicamente prudentes e socialmente aceitáveis
para a estratégia de harmonização (SACHS, 1986).
132
O êxito das políticas precisa estar mais além de medidas esparsas que não enfocam a
quebra destas relações anacrônicas dentro do local objeto de estudo. As políticas devem ser
planejadas de forma minuciosa e com atenção aos detalhes locais, como lembra Boisier
(1989), ou a região não terá capacidade de internalizar as mudanças positivas em favor do seu
desenvolvimento. Para o autor o desenvolvimento de uma região necessita, além da
internalização do crescimento90 econômico por parte desta, o crescimento da inclusão social
(na forma de participação política e repartição do produto social) e a preservação do meioambiente.
O aumento desta capacidade social organizativa está vinculado a três fatores: a
internalização regional do crescimento; o aumento da capacidade regional de decisão; e a
participação social.
A internalização do crescimento depende das próprias oportunidades do crescimento
na região, associado ao modo como o excedente é apropriado e usado. As políticas do Estado
determinarão o uso do excedente que foi apropriado pelo setor público. A capacidade da
região em influenciar as políticas também determina a aplicação dos excedentes (BOISIER,
1989).
O Estado em seu papel de busca do desenvolvimento regional, de acordo com Boisier
(1989), interfere e se relaciona necessariamente com três fatores que são a participação local
no uso dos recursos nacionais, o impacto que as políticas econômicas têm sobre a região, e a
capacidade de organização social na mesma. O autor considera que as práticas de
desenvolvimento utilizadas pelo poder público não incluem normalmente um planejamento
direcionado às regiões e sim um contínuo de medidas aplicadas à maioria dos locais, o que
permanece determinante até os momentos atuais como mediação de políticas. Este
90 Boisier lembra que crescimento e desenvolvimento são acontecimentos distintos, visto que pode ocorrer o
crescimento econômico de uma região sem necessariamente se proceder o seu desenvolvimento. A chave desta
transformação estaria na internalização do excedente gerado pelo crescimento, com o aumento paulatino da
capacidade da região em controlar e intervir nas principais causas e agentes geradores do mesmo.
133
direcionamento de medidas é um paradigma a ser ultrapassado na busca da eficácia de
medidas de desenvolvimento (BOISIER, 1989)91.
As políticas e programas observados em Lourenço parecem não buscar condicionantes
para mudanças duradouras que beneficiem o local. Os PRADs dizem respeito a medidas
isoladas e que precisam ser associadas aos resultados de outros programas para que os erros
possam ser compreendidos e se possam tecer direcionamentos viáveis ao Distrito.
Os programas e políticas direcionados ao local precisam considerar que o comércio e
as demais atividades em Lourenço giram em torno da produção de ouro no garimpo. O ouro
impulsiona as atividades, e são poucos os garimpeiros que desenvolvem outros trabalhos
como os de agricultura e uso da terra, exceto o comércio. A maior parte dos produtos
consumidos no local vêem de outros Municípios como Calçoene e Macapá92. Desta forma,
seria interessante associar os planos de recuperação de áreas degradadas a medidas que
criassem alternativas produtivas para o local conjuntamente ao aumento da qualidade do meio
ambiente, como os sistemas agroflorestais, a fruticultura, os Sistemas Florestais de Uso
Múltiplo citados por Almeida, D. (2000), ou até mesmo a piscicultura. Criar medidas que
propiciem este uso da terra, no entanto, não são suficientes por si só, é necessário saber
realmente quais os programas que a população quer desenvolver e quais aqueles de que
necessita e a possibilidade de serem implementados.
Em Lourenço é forte o direcionamento à implantação de modelos exógenos de
políticas sem perceber o complexo de fatores que norteiam as particularidades locais e que
necessitam de tratamentos específicos. O PRAD é um exemplo de modelo exógeno que foi
aplicado na tentativa de conferir melhor qualidade ao meio ambiente. A falta de êxito nas
medidas de recuperação foram ocasionadas não só por seu conteúdo relacionado ao meio
91 Não pretendo aqui discorrer sobre o extenso papel do Estado e instâncias regionais no contexto de suas
atuações e no desenvolvimento local, mas considerar sua importância nas determinações e decisões que podem
modificar consideravelmente estruturas locais. Para um debate mais extensivo sobre esta importância e atuações
do Estado ver: Sola (1999), Sachs (1999), Boisier (1989), O’Donnell (1993), Boisier (1996) e Moraes (2003).
92 Dados obtidos a partir de entrevistas com integrantes da população de Lourenço em março e outubro de 2004.
134
ambiente (a pouca atenção à biodiversidade local, clima, tipo de vegetação, qualidade dos
solos impactados...), mas à ausência de uma aceitação e incorporação das medidas pela
população local.
Em Lourenço é evidente a atividade de extração do ouro, e poderia até ser considerado
natural que os garimpeiros retomassem seus trabalhos na área já recuperada e a degradassem
novamente. O problema seria diminuído se houvessem parcerias mobilizadas no sentido de
oferecer maiores informações aos garimpeiros do local sobre os mecanismos de exploração
menos impactantes ao meio ambiente e técnicas que permitam maior eficácia no processo de
beneficiamento do minério e evitem a disseminação de contaminantes.
A sondagem e cubagem são técnicas que poderiam vir a ser implementadas para gerar
maior direcionamento na exploração. A sondagem e a cubagem são procedimentos realizados
por meio de amostragens de determinadas frações e profundidades do solo, e que propiciam o
conhecimento da quantidade e teor do minério no local93. Em Lourenço ambos procedimentos
ainda não são executados, e a exploração é encaminhada comumente pela “percepção” do
garimpeiro da presença do minério94. Além do mais, são fortes as relações de poder como o
clientelismo e práticas patrimonialistas que interferem na tomada de decisões e na alocação
dos excedentes em favor do desenvolvimento da região.
O desafio imposto, desta forma, é a construção de relações mais igualitárias entre os
atores que formam este processo, de modo a direcionar o cumprimento de políticas que
beneficiem a maioria da população. As políticas efetuadas simplesmente de forma a lançar um
93 Maiores detalhes sobre a importância de procedimentos de prospecção, detecção e delimitação de jazidas ver
Lestra e Nardi, (1984).
94 No período de março de 2004 foi realizado um programa com a Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço e a
colaboração da UNESCO, no sentido de levar conhecimento sobre meio ambiente, procedimentos menos
degradadores da qualidade do meio, técnicas de sondagem e cubagem e procedimentos administrativos e de
contabilidade para a gestão da COOGAL. O programa teve a participação dos profissionais Armin Mathis, Eva
Grelo da Silva e Bernard Peregovich. Embora estas sejam medidas interessantes, é necessário ter um maior
engajamento por parte da população, da COOGAL, das instituições e do poder público para que estas deixem de
ser pontuais e atinjam um maior numero de alvos, e as mudanças possam ser de fato incorporadas à realidade de
Lourenço.
135
véu sobre a realidade de vida em Lourenço e as reais condições do meio ambiente, como tem
sido o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas, evoluirão notadamente ao insucesso.
A construção de relações mais igualitárias entre os atores em Lourenço, além da
necessidade de revisão dos supostos econômico-sociais debilitantes do desenvolvimento
regional, como a distribuição de renda, alocação de recursos, a influência do mercado e as
funções do Estado, debatidos em diversos trabalhos como o de Sorj (2000), Brasil Lima
(1997), Boisier (1989), Guimarães (1995) e Sachs (1999), implica que haja o crescimento da
inclusão social por meio da estimulação da participação pública e a criação de parcerias
dentro da sociedade, para que estes setores possam ter um maior controle sobre as atitudes
governamentais e institucionais.
A participação social é considerada por Boisier (1989) como um fator abrangente e
dependente de diferentes fatores como a distribuição de renda, a participação da população
em processos políticos e no processo de planejamento, e a conformação de uma rede de
estruturas formais que permitam o acoplamento ente os grupos sociais regionais não
organizados e os canais formais. A distribuição de renda dentro dos objetivos das políticas
busca a equidade espacial e a maior igualdade pessoal dentro da região, que pode ser
alcançada a partir de medidas orientadas para a eficiência e maximizadoras do produto,
acompanhadas pela concentração de renda pessoal. A participação social propicia a
diminuição da falta de correspondência entre o conteúdo das políticas e o interesse dos
supostos beneficiários. A conformação de uma rede de estruturas para a facilidade de
acoplamento dos grupos sociais parte primordialmente do auxílio do poder público a
instituições que facilitem esta formação (BOISIER, 1989).
A participação da população em Lourenço tem aumentado, o que se observa pela
maior organização na reivindicação de direitos e a quebra de estruturas que exerciam poder
coercitivo sobre os indivíduos, como a antiga diretoria da COOGAL. Resta saber se este
136
aumento da participação desenvolverá para o maior interesse da população pelas atividades
capitaneadas pelo Estado e instituições, e convergirá no benefício social de Lourenço.
Uma alternativa promissora ao local é conciliar os benefícios gerados pelos diferentes
programas para gerar bons resultados. A associação entre os programas, ao invés de continuar
gerando políticas que não interagem, permitiria a conciliação de benefícios, a instauração de
mecanismos mais preocupados com o indivíduo, o conhecimento e o notável avanço no rumo
da maior eficácia de políticas públicas.
As tentativas até o momento do poder público em modificar as condições de abandono
em Lourenço, no entanto, não parecem apresentar efetivo potencial de mudança. As políticas
implementadas continuam sendo pontuais e sem um direcionamento específico ao local.
Mostra-se necessário, caso as intenções sejam gerar mudanças positivas, a inserção de uma
palavra no escopo dos projetos e no papel do poder público, das instituições e da população:
“comprometimento”.
137
CONCLUSÃO
As atividades de mineração são responsáveis por mudanças significativas na realidade
local em que estão inseridas. Estas mudanças ocorrem nos diferentes setores, sejam eles
econômicos, sociais ou ambientais. O contexto econômico se modifica pelo uso de uma parte
do excedente da empresa no local, mesmo que grande parte seja aplicado em outras regiões.
As mudanças sociais observadas em Lourenço, devido às atividades de extração mineral,
compreendem o estabelecimento de uma nova estrutura social, que se adapta de acordo com
atividades desenvolvidas. As mudanças ambientais estão relacionadas à expressiva alteração
do meio durante a exploração mineral. O local se torna cada vez mais degradado pela retirada
da vegetação e de solos e rochas para o beneficiamento. As mudanças também envolvem a
criação de novos ambientes dentro do contexto inicial no qual o local se encontra, por meio da
recuperação com a utilização de medidas com características importadas de outros lugares.
A exigência da recuperação de áreas degradadas na legislação permitiu o aumento do
controle sobre atividades exploradoras e degradadoras, e o compromisso com o
restabelecimento dos antigos níveis de qualidade do meio ambiente. Os Planos de
Recuperação de Áreas Degradadas (PRADs), na exigência das leis, devem contar com uma
equipe multidisciplinar na sua elaboração e implementação, para que sejam analisados e
contemplados, no escopo do projeto e nos procedimentos a serem executados, as diferentes
características do local no qual foi anteriormente inserido o projeto de exploração.
No Distrito de Lourenço, Município de Calçoene (Amapá), foram implementados dois
PRADs, o primeiro concluído em 1995 e o segundo iniciado em 2003. Ambos os planos
foram executados pela Mineração Novo Astro S/A – MNA, empresa que explorou ouro de
1983 a 1995. Os PRADs foram elaborados e implementados pela Ampla Engenharia.
138
O PRAD de 1995 terminou por se constituir, basicamente, de medidas que visavam
uma recuperação “paliativa” do local, ao buscar conferir características paisagísticas a
algumas áreas. A grande parte dos procedimentos adotados, contudo, foi a utilização de
gramíneas e acácias na recuperação. A falta de um maior aprofundamento da análise das
características locais, como o tipo de solo e a vegetação, levou à opção por estes
procedimentos. Os resultados deste PRAD terminaram por não ser de todo positivos visto que
as medidas escolhidas não apresentavam coerência com a situação local e os interesses da
população. O PRAD foi, no entanto, fiscalizado e aprovado pelos órgãos ambientais
responsáveis durante o período, o que mostra certa conivência com as atividades da MNA,
reduzida capacidade destes órgãos para gerenciar a situação, ou descomprometimento com a
localidade e a população de Lourenço, os principais afetados com os resultados.
A permanência da atividade garimpeira após a saída da MNA contribuiu para a nova
degradação das áreas que já haviam sido recuperadas. Porém, como a mineradora não havia
transferido sua titularidade após sua saída, o passivo ambiental e a realização de um novo
Plano de Recuperação Ambiental continuaram sob sua responsabilidade.
No processo de retirada da MNA de Lourenço em 1995, esta não efetuou a baixa da
empresa em Brasília para atender a um pedido do governo do Estado que queria executar a
transferência da titularidade diretamente para os garimpeiros. A legalização das atividades da
Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço só foi realizada em 2002, e os problemas
ambientais gerados por esta foi responsabilizado à Mineração Novo Astro S/A.
Em 2002 foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta entre o Ministério
Público Federal, a MNA, a Secretaria Especial de Meio Ambiente – SEMA, o Departamento
Nacional de Produção Mineral – DNPM, e a Cooperativa dos Garimpeiros de Lourenço –
COOGAL, a partir de uma denúncia sobre degradação e contaminação. O termo previu o
comprometimento da MNA em recuperar novamente as áreas degradadas em Lourenço.
139
A MNA contratou novamente a Ampla Engenharia para realizar a recuperação, e em
2003 foi elaborado um novo Plano de Recuperação de Áreas Degradadas, que previa
trabalhos em oito áreas, das quais quatro seriam recuperadas imediatamente e os restantes no
decorrer do término dos trabalhos dos garimpeiros, visto que as áreas a serem recuperadas
ainda estavam sendo trabalhadas. A alternativa de recuperação, desta vez, foi a tentativa de
criação de sistemas agroflorestais que propiciassem uma atividade produtiva futura ao passo
da exaustão da jazida. As espécies escolhidas foram o açaí, o cupuaçu, o mogno e a andiroba,
no entanto, a falta de medidas que melhorassem a qualidade do solo antes dos plantios levou a
uma mortalidade de mais de 70% das mudas utilizadas na área do Labourie.
O PRAD de 2003 não contemplou procedimentos geotécnicos de controle da erosão,
apesar de a intensidade desta ser mencionada no escopo do plano. O controle da contaminação
dos recursos hídricos também não foi efetuado. Além dos plantios nas quatro áreas
(concluídos no final do primeiro semestre de 2004), a Ampla realizou o redirecionamento dos
cursos d’água para restabelecer a antiga drenagem existente no local. O desconhecimento
sobre os teores de contaminantes presentes no solo e na água fez com que a Ampla não
levasse em consideração a possibilidade de uma disseminação dos poluentes a partir destas
medidas de redirecionamento dos cursos d’água. A empresa responsável pela recuperação
poderia ter analisado os erros cometidos no primeiro PRAD e buscar medidas que de fato
diminuíssem o nível de degradação local, no entanto realizou novamente medidas paliativas e
sem uma preocupação com as características locais. Não é difícil vislumbrar a evolução destas
medidas adotadas pela Ampla.
A Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amapá (SEMA) aprovou novamente as
medidas presentes no PRAD de 2003, realizando, inclusive, a fiscalização da implementação
destas. Convém questionarmos tais posicionamentos e o porquê de suas aprovações, ou as
mudanças dificilmente convergirão para melhorias.
140
Os programas precisam buscar parcerias com órgãos e instituições comprometidas
com a busca de benefícios para as regiões envolvidas, como uma alternativa para a
problemática, associadas à participação da população local nos projetos e políticas criados
para região, e como forma de criar soluções que contemplem as características e desejos da
população.
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157
ANEXOS
158
ANEXO 01
LISTA DAS PESSOAS ENTREVISTADAS PARA A PESQUISA
Nome: Ofício:
01- Sandoval Raimundo Alves Ex. Gerente Administrativo da COOGAL
02- Lucas Evangelista da Silva Costa Ex. presidente da COOGAL
03- Admilson Alves Camelo Jr Secretário da COOGAL
04- Raimundo Nonato Martins Vice-presidente da COOGAL
05- Vicente Freitas Feitosa Diretor administrativo COOGAL
06- José André da Silva Ex. diretor secretario COOGAL
07- João Neto Presidente Junta Governativa
08- Gildácio Araújo Engenheiro de Minas de Lourenço
09- Cynara Teixeira Alves Técnica de Mineração de Lourenço
10- Domingos Viana da Silva Garimpeiro de Lourenço
11- Enildo Silva Garimpeiro e ex. funcionário da MYYSA
12- Antônio Pereira de Souza Garimpeiro de Lourenço
13- Edilton Silva Garimpeiro de Lourenço
14- José Haroldo Farias Garimpeiro de Lourenço
15- Antônio Mendes de Paula Garimpeiro de Lourenço
16- Erisvaldo Silva Garimpeiro de Lourenço
17- Antônio Serra Garimpeiro de Tartarugalzinho
18- Raimundo Carvalho Batista Garimpeiro de Vila Nova
19- Nelson de Moura Filho Ampla Engenharia
21- Marcos Morasche Ampla Engenharia
22- Francisco Araújo Ampla Engenharia
159
23- Mario Sérgio dos Santos Ribeiro Divisão de licenciamento SEMA/AP
24- Rildo Amanajás Chefe da divisão de licenciamento SEMA/AP
25- Ruimar Divisão de licenciamento SEMA/AP
26- José Guimarães Cavalcante Ex. chefe do DNPM/AP
27- Marco Antonio Palheta Chefe do DNPM/AP
28- Gessé Corrêa Soares Representante da MNA em Macapá
29- Paulo Madeira Juiz de Calçoene
30- Antônio Pelaes INCRA/AP – divisão de assentamentos
31- Renivaldo Costa Chefe do setor de comunicação. Palácio do Governo
32- Randolfe Rodrigues Deputado Federal Macapá
33- Cláudio Bahia SEPLAN/AP
* Muitos garimpeiros entrevistados forneceram somente os apelidos, e estes não constam aqui
nesta relação.
160
ANEXO 02
TERMO DE REFERÊNCIA FORNECIDO À AMPLA PELA SEMA/AP EM 2002
161

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